O presidente Luiz Inácio Lula da Silva classificou como pagamento de uma dívida histórica construída pela “supremacia branca” o anúncio de 13 medidas de seu governo para marcar o Dia da Consciência Negra nesta segunda-feira , (20). O pacote prevê investimentos de cerca de R$ 20 milhões para, entre outras iniciativas, fazer avançar 1.800 processos de titulação de terras quilombolas.
"O que nós fizemos aqui hoje é o pagamento de uma dívida histórica que a supremacia branca construiu neste pais desde que este país foi descoberto. Nós queremos apenas recompor aquilo que é uma realidade de uma sociedade democrática", afirmou o petista.
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Além disso, ele aproveitou o evento no Palácio do Planalto para comparar o desmonte de políticas sociais durante o governo de Jair Bolsonaro à destruição de prédios na Faixa de Gaza, que está atualmente sob ataque de forças militares israelenses.
“Vocês não têm noção como que nós encontramos esse país. Vocês estão vendo furação no Rio Grande do Sul, enchendo d’água, estão vendo Santa Catarina. Mas aqui teve um furacão a destruir tudo que é política de inclusão social, que a gente se matou para fazer em treze anos, se destruiu em um dia. É como a Faixa de Gaza, vocês estão vendo aqueles prédios que estão sendo destruídos, levaram décadas para serem construídos, mas um foguete destrói aquilo em um segundo. E aqui se destruiu politicas públicas que nós estamos tentando reconstruir”, afirmou o petista na cerimônia em comemoração ao Dia da Consciência Negra no Palácio do Planalto.
Com a participação de políticos, ministros, artistas e lideranças de movimentos negros e quilombolas o evento realizado nesta manhã contou com um discurso da ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, para anunciar o pacote de medidas.
Entre as propostas mais importantes, se destacaram o anúncio de R$ 8 milhões para um programa de qualificação de funcionários que fazem atendimento psicossocial de famílias de vítimas de violência na Bahia e no Rio de Janeiro e as entregas de títulos que garantem a posse definitiva para cerca de 300 famílias quilombolas de diferentes regiões do país.
As ações anunciadas nesta segunda foram divididas nos eixos: direito à vida e à dignidade, direito à educação e inclusão, direito à terra e direito à memória e reparação.
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“Quando me perguntam qual é a prioridade do ministério, presidente, eu sempre digo que é vida digna para todas as pessoas. Não aceitaremos nada menos que isso”, afirmou a ministra Anielle Franco. Ela ainda destacou em seu discurso o fato de que, pela primeira vez, o país tem um Ministério da Igualdade Racial para celebrar o Dia da Consciência Negra.
Titulações
Entre os títulos de terra entregues nesta segunda durante o evento no Palácio do Planalto estavam aa titulação para a comunidade da Ilha de São Vicente, que fica em Araguatins (TO) e conta com 55 famílias; e para 89 famílias de Lagoa dos Campinhos, que fica em Amparo de São Francisco e Telha (SE).
Além disso, o Instituto de Terras do Maranhão (Iterma), em parceria com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e com Governo do Maranhão, também entregou três títulos: um para a Associação dos Moradores do Povoado Malhada dos Pretos, do município de Peri Mirim (MA), que conta com 45 famílias; outro para a Associação dos Moradores do Povoado Santa Cruz, também de Peri Mirim (MA), que conta com 50 famílias; e o último para a Associação da Comunidade Negra de Trabalhadores Rurais Quilombolas de Deus bem Sabe, do município de Serrano do Maranhão (MA), que conta com 80 famílias.
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Também foi anunciado pela ministra Anielle Franco, um investimento de R$5 milhões em parceria com o Instituto Federal do Maranhão para promover melhorias para as comunidades quilombolas de Alcântara (MA). A iniciativa prevê a realização de cursos de capacitação com ênfase em tecnologias sociais para garantia de alimentação e geração de renda, ações de transferência de tecnologia e, ainda, instalação de usinas fotovoltaicas para as comunidades que ainda sofrem com a pobreza e as violações de direitos.
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Iniciativas interministeriais
Além dos pacotes de titulações, o programa anunciado nesta segunda conta com uma série de iniciativas envolvendo a articulação do Ministério da Igualdade Racial com outras pastas da Esplanada. Confira abaixo a relação das iniciativas:
Políticas de ações afirmativas: o Programa Federal de Ações Afirmativas conta com investimento de R$ 9 milhões para desenvolver mecanismos que garantam a transparência, a participação, o controle social, a gestão, o acompanhamento, o monitoramento e a avaliação de políticas afirmativas.
Grupos de trabalho: o Grupo de Trabalho Interministerial (GTI) de Comunicação Antirracista será responsável por propor políticas que promovam uma comunicação mais inclusiva e respeitosa dentro da administração pública. Além de elaborar o Plano Nacional de Comunicação Antirracista.
Primeira infância antirracista: foi assinado um memorando de entendimento entre o Ministério da Igualdade Racial e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) para trabalharem juntos para combater o racismo e atenuar seus impactos na infância de crianças negras, quilombolas e indígenas. As estratégias a serem criadas serão voltadas para a capacitação de profissionais da saúde, da assistência social e da educação, para a realização de seminários e eventos, para a produção de pesquisas, assim como para a disseminação de materiais relacionados a práticas antirracistas nos serviços de atendimento às gestantes, crianças negras e indígenas.
Brasil sem fome: o Acordo de Cooperação Técnica (ACT) entre o MIR e o Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS) reafirma o compromisso com a construção de uma agenda de combate à fome, à insegurança alimentar e à pobreza, a partir da qualificação de serviços e equipamentos da assistência social. Ele integra o Plano Brasil Sem Fome, que busca promover a equidade de raça e gênero por meio da inclusão socioeconômica e da promoção da segurança alimentar e nutricional.
Pequena África e Cais do Valongo: o Ministério da Igualdade Racial também firmou uma parceria com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para a implementação de projetos culturais e ações em prol da preservação e valorização da herança africana, como também o fortalecimento das instituições culturais na região da Pequena África e do sítio arqueológico Cais do Valongo, no Rio de Janeiro (RJ). Principal porto de entrada de africanos escravizados no Brasil e nas Américas, o Cais do Valongo é Patrimônio Mundial da Unesco. Estimativas sinalizam que cerca de um milhão de africanos desembarcaram ali.
Hip-Hop como referência cultural: foi assinado um Decreto Presidencial de reconhecimento do Hip-Hop como referência Cultural Brasileira, estabelecendo as diretrizes nacionais de valorização da cultura Hip-Hop.
Caminhos Amefricanos: programa de intercâmbios universitário Sul-Sul que prevê investir R$ 22 milhões em quatro anos para promover o diálogo, a pesquisa, a produção científica, a educação antirracista, as trocas culturais e a cooperação entre Brasil e países da África, América Latina e Caribe. O programa se destina a pessoas pretas, pardas e/ou quilombolas da rede pública de ensino, que estejam regularmente matriculadas em cursos de licenciatura ou sejam docentes da Educação Básica daqui, assim como a estudantes e docentes de grupos sociais historicamente vulnerabilizados nos países parceiros.
O objetivo do programa é alcançar 15 países ao longo dos próximos cinco anos. A cada edição, 50 bolsistas do Brasil e 10 do país parceiro serão beneficiados por intercâmbios de 15 dias. Os primeiros países a receberem o Caminhos Amefricanos serão Moçambique, Colômbia e Cabo Verde. O edital de seleção para a primeira edição, que conectará São Luís (MA) e Maputo, será lançado na terça-feira, (21).
Edição: Geisa Marques