O presidente Lula sancionou, na tarde desta terça-feira (31), a lei que cria uma pensão especial de um salário mínimo para órfãos de mulheres vítimas de feminicídio. A medida visa beneficiar filhos e dependentes cuja renda familiar per capita mensal seja de até 25% do salário mínimo, o que corresponde a R$ 330 pelos valores atuais. A política prevê que tenham direito ao auxílio todos os filhos que tivessem menos de 18 anos na data da morte da mãe e o benefício deve ser concedido mediante requerimento sempre que houver "fundados indícios de materialidade do feminicídio".
"É preciso garantir que as pessoas que são vítimas da violência não tenham os seus filhos abandonados pelo Estado. Se o Estado não cuidou da pessoa e permitiu que ela fosse vítima, o Estado precisa pelo menos assumir a responsabilidade de cuidar das crianças", argumentou o petista, ao comentar o assunto durante transmissão virtual ocorrida na manhã desta terça.
A nova lei fixa que, caso depois o processo judicial transitado em julgado aponte que não houve feminicídio, o pagamento do valor deverá ser imediatamente suspenso. Nesse tipo de situação, os beneficiários não ficam obrigados a ressarcirem os valores aos cofres públicos, a não ser em caso de comprovada má-fé. A norma determina ainda que a pensão não poderá ser acumulada junto com benefícios do Regime Geral de Previdência Social (RGPS) nem com regimes próprios de previdência ou do sistema de proteção social dos militares.
As despesas criadas pela lei serão atreladas à área de assistência social do Executivo e por isso deverão ser previstas anualmente na Lei Orçamentária Anual (LOA) enviada ao Congresso Nacional. Pela nova norma, o benefício deverá ser pago pelo Estado até que o filho da vítima complete 18 anos de idade. Aprovado pela Câmara dos Deputados em março e pelo Senado em outubro deste ano, a política resulta de projeto de lei apresentado pela deputada Maria do Rosário (PT-RS).
"Essas crianças já tiveram a maior dor possível, que é a perda de suas mães. E essas mães, talvez no momento mais difícil das suas vidas, tentando livrar-se da violência, tenham tido, entre todas as dores, a preocupação de como ficariam seus filhos diante da morte iminente", reflete a parlamentar, em conversa com o Brasil de Fato.
A escalada dos casos de feminicídio tem chamado a atenção no país a cada ano. Dados do Monitor da Violência, feito através de uma parceria entre o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), o Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (USP) e o portal g1, mostram que o número aumentou 5% entre 2021 e 2022, por exemplo, quando foram notificadas 1,4 mil ocorrências do tipo. A contagem inclui os 26 estados e o Distrito Federal, e indica a maior estatística de casos como esse desde a criação da Lei do Feminicídio (Lei nº 13.104/2015).
"Muitas crianças ficam órfãs de mãe e todas as pesquisas indicam que o feminicídio é praticado em grande parte, em 97,8 % dos casos, pelo companheiro atual ou antigo da vítima, ou seja, pai dessas crianças ou padrasto, de forma que essas crianças que tiveram a mãe assassinada pelo feminicídio também perderam o pai, comenta Maria do Rosário, para quem a lei sancionada por Lula é uma forma de acolher os órfãos.
"Estamos falando de crianças e adolescentes que estão sozinhos no mundo. E quando uma avó, uma tia, família extensa, quer assumir a responsabilidade de cuidar delas, mas é uma família extremamente pobre, muitas vezes não consegue, porque economicamente não tem o apoio necessário", afirma a autora da lei.
"Estamos, então, criando esse apoio, na busca de lançar luz sobre isso para mostrar que o feminicídio faz a vítima mulher, mas ele continua fazendo vítimas todo dia na vida dessas crianças, sobretudo quando elas são institucionalizadas, quando elas acabam em abrigos, quando elas ficam longe de toda a família, porque a família não consegue cuidar delas por motivos vários, inclusive econômicos", finaliza a petista.
Edição: Thalita Pires