A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que investiga os atos golpistas de 8 de janeiro no Congresso Nacional escuta, nesta terça-feira (12), Marília Ferreira Alencar, ex-subsecretária de Inteligência da Secretaria de Segurança Pública (SSP) do DF, e Marcela da Silva Morais Pinno, cabo da Polícia Militar do DF que atuava no Batalhão de Choque no dia das manifestações antidemocráticas. Já na quinta-feira (14), será colhido o depoimento do general Gustavo Henrique Dutra de Menezes, ex-chefe do Comando Militar do Planalto.
Marília Ferreira Alencar
À CPI dos Atos Antidemocráticos da Câmara Legislativa do Distrito Federal, Marília Ferreira Alencar afirmou, em 9 de março, que alertou com antecedência sobre a mobilização golpista para o 8 de janeiro. “Não acho que a inteligência fracassou. As informações circularam. O que se tinha foi recebido e repassado. A ideia de invasão [dos prédios públicos] foi informada. A gente informou. Não foi só a subsecretaria. Várias agências. A inteligência da PM, acho que trabalhou muito bem, inclusive”, disse.
“Avisamos sobre ânimos exaltados. Às 12h30 do dia 7, informamos: ‘Ânimos exaltados e dispostos a animosidade com forças de segurança’, ‘falas de incitação', como ocupação de prédios públicos, sem liderança específicas". Em outros momentos, os ânimos estavam pacíficos”, afirmou Alencar.
Em depoimento à Polícia Federal (PF), em 27 de janeiro, Alencar, que também é delegada da PF, disse que as Polícias Militar e Civil, o Corpo de Bombeiros, o STF, o Senado e outros órgãos ligados à segurança tinham conhecimento sobre a movimentação golpista em Brasília nos dias anteriores aos atos criminosos.
"Na noite de sexta-feira (6), por volta de 22h, chegou uma informação no grupo de WhatsApp denominado 'Perímetros Segurança' que havia chegado em Brasília cerca de 43 ônibus fretados com o total de 1.622 passageiros para a manifestação que ocorreria no dia 8 de janeiro", disse Marília no depoimento à PF.
O grupo de WhatsApp em questão é o mesmo em que a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) enviou alertas sobre a gravidade dos atos golpistas do 8 de janeiro. Estavam no grupo representantes de 48 órgãos, como da assessoria de inteligência do Ministério da Defesa, dos centros de inteligência das três Forças Armadas, da Secretaria de Operações Integradas (SEOPI) do Ministério da Justiça e Segurança Pública e da Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal. Jader Silva Santos, que na época era subchefe da Coordenadoria de Avaliação de Riscos do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), também estava no grupo. Gonçalves Dias, então ministro do GSI, não estava presente.
Em entrevista ao Metrópoles em 10 de abril deste ano, o ministro da Justiça, Flávio Dino, alegou que não recebeu os alertas provavelmente porque foram enviados pelo WhatsApp. “Eu creio que [isso ocorreu] em razão da metodologia que era usada anteriormente para esses relatórios serem enviados, via grupos de WhatsApp”, afirmou Dino.
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Na mesma linha, Gonçalves Dias afirmou que o envio por um grupo de WhatsApp não era a forma ideal para o envio do conteúdo. “Pelo sistema da Abin não havia nenhuma informação. A troca pelo WhatsApp não corresponde à forma de comunicação institucional correta para a transmissão de informações sensíveis. Somente após o 8 de janeiro fiquei sabendo de um grupo de WhatsApp, onde eu não estava”, disse G. Dias à CPMI, em 31 de agosto.
Além dos alertas sobre o 8 de janeiro, Marília Ferreira Alencar deve responder sobre o mapeamento de redutos eleitorais onde o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) teve mais votos no primeiro turno das eleições do ano passado, a pedido do ex-ministro da Justiça Anderson Torres. Na época, Alencar era diretora de inteligência do Ministério da Justiça. À PF, Marília afirmou que o levantamento foi feito para analisar supostos indícios de compra de votos.
Marcela da Silva Morais Pinno
Já Marcela da Silva Morais Pinno deve relatar como foi o 8 de janeiro. Na ocasião, a militar chegou a ser jogada de uma altura de três metros da cúpula do Congresso Nacional. Pinno também chegou a ser agredida fisicamente e seus equipamentos de defesa foram alvo de tentativa de roubo.
Em 9 de maio deste ano, o governador Ibaneis Rocha (MDB) promoveu, por ato de bravura, a soldado a cabo da PMDF. “Parecia uma eternidade. Fui atacada duas vezes, fui espancada, batiam em mim com uma barra de ferro. Meu capacete ficou amassado. O que me manteve ali e me fez resistir, apesar de toda a agressividade, foi saber que posso contar com meus colegas de trabalho. Foi o subtenente que me salvou e me tirou daquela selvageria”, disse Pinno durante o ato de promoção.
“Quando vi que a cabo Marcela estava sendo atingida, fui até lá e a ajudei a se levantar. Ela recuperou o seu escudo, e, quando estávamos recuando, eu fui derrubado e espancado de uma forma muito agressiva”, contou o subtenente Beroaldo José de Freitas Júnior, que também foi promovido. “Eles queriam estraçalhar. Queriam matar. Não tinha outro objetivo”, complementa.
Gustavo Henrique Dutra de Menezes
O ex-chefe do Comando Militar do Planalto, o general Gustavo Henrique Dutra de Menezes, por sua vez, era o responsável pela autorização do acampamento golpista em frente ao Quartel-General (QG) do Exército, em Brasília. À CPI do DF sobre os atos criminosos, Dutra afirmou que seguiu todas as recomendações do Ministério Público Federal (MPF) sobre o acampamento bolsonarista. “Não havia, até então, ilegalidade nas manifestações”, disse o general Dutra.
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A recomendação do MPF, no entanto, diz que o Comando Militar do Planalto deveria “coibir manifestações que incitem a prática de violência contra candidatos eleitos, que estimulem a obstrução do exercício regular dos poderes constituídos, ou que incitem a sublevação violenta e estimulem a animosidade das Forças Armadas contra os poderes constituídos”.
No local onde os bolsonaristas estavam acampados, havia diversos cartazes com frases de cunho golpista, como pedidos de intervenção militar e referências explícitas à destituição dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).
O militar também afirmou que nenhuma “instituição que tinha a obrigação ou poder de dizer que aquele acampamento era ilegal” tomou alguma medida. “Nós resolvemos estabelecer uma estratégia indireta para desmobilizar o acampamento. Desde o início, estabelecemos regras, limitamos os acessos e a logísticas”, afirmou.
Edição: Rodrigo Chagas