Assista ao vídeo

Líder de extrema direita é condenado por invasão do Capitólio, mas analista prevê fortalecimento do radicalismo

Enrique Tarrio, do Proud Boys, recebeu sentença exemplar, mesmo não estando no local na data do incidente

Brasil de Fato | Nova York (EUA) |
Grupos como o de Tarrio se irmanam a figuras da extrema direita como Donald Trump e Ron DeSantis em uma relação de ganho mútuo - AFP

Erique Tarrio, ex-líder do grupo de extrema direita Proud Boys, foi condenado nesta terça-feira (5) a 22 anos de prisão por envolvimento na invasão do Capitólio em 6 de janeiro de 2021. Do lado de fora da corte, em Washington, a poucos passos do Capitólio, seus advogados criticaram a sentença em uma coletiva de imprensa.



“Embora respeitemos a sentença do juiz, discordamos respeitosamente. Mas nós respeitamos”, disse Nayib Hassan, um dos advogados, “e entraremos com recurso no tempo devido”.

No momento da invasão, Tarrio não estava em Washington, mas a acusação conseguiu provar que, à distância, ele foi responsável por planejar e coordenar as ações do grupo. 

Ele foi preso dois dias antes por queimar uma bandeira do Black Lives Matter em uma igreja, o que segundo a investigação foi planejado para se tornar um mártir. O objetivo seria gerar maior indignação nos membros do grupo.

O tribunal onde Tarrio recebeu a sentença recorde é o mesmo onde Donald Trump será julgado em março do ano que vem por tentativas de reverter a eleição de 2020 e que passam, inclusive, pela invasão do Capitólio. A acusação pedia 33 anos de prisão para Tarrio, mas o juíz determinou menos. A juíza do caso de Trump, porém, é conhecida por dar sentenças maiores até do que as solicitadas.

Para preservar a democracia, é preciso ir além

O brasileiro Jean Goldenbaum, analista social, especialista em extrema direita e vereador em Solingen, na Alemanha, pelo Partido Social Democrata falou com o Brasil de Fato sobre o assunto.

“A princípio eu vejo como um dos passos essenciais”, disse Jean, “mas não perdemos de vista que, em termos hierárquicos, esses grupos estão abaixo do líder supremo, que é o Donald Trump. Ele é o idealizador, em termos de conceito, de tudo o que aconteceu”.

O ex-presidente se recusou a condenar os Proud Boys na eleição de 2020. Durante um dos debates, disse que os grupos violentos eram os da esquerda, e não os da direita. Mais recentemente, Trump chegou a afirmar que consideraria perdoar membros do grupo caso fosse eleito presidente.

Para Jean Goldenbaum, o comentário de Trump revela o que pode vir nos próximos meses: “Eu acho que isso mostra que Trump está assumindo o posicionamento dele junto a esses grupos. Eu continuo achando que, no ano de 2024, acredito que nós veremos o pior Donald Trump que vimos até hoje. Porque esse tipo de pessoa sempre precisa se superar”.

O mutualismo da extrema direita

O apoio de grupos de extrema direita a candidatos republicanos não é uma novidade, mas é algo que vem se tornando cada vez mais comum nos Estados Unidos.

Mais de uma vez, neonazistas fizeram manifestações na Flórida com bandeiras de Ron DeSantis, e grupos extremistas como os Proud Boys e os conspiracionistas do QAnon são figuras comuns em comícios de Donald Trump.

“O termo que eu uso para essa relação entre esses grupos e esses líderes, todos dentro da esfera do neofascismo, é se irmanar” explica Goldenbaum, “eles se irmanam. Eles percebem, detectaram rapidamente que as ideologias se abraçam, com suas variações e com seus escopos diferentes”.

Para os candidatos, os grupos de extrema direita se tornam verdadeiros exércitos militantes para suas campanhas. Para os grupos, a publicidade da campanha se torna uma oportunidade para atrair novos membros.

O difícil combate contra os grupos extremistas

Além de Tarrio, outros membros dos Proud Boys foram condenados. Participantes de outros grupos extremistas também foram presos pela invasão do Capitólio, como Stewart Rhodes, do Oath Keepers, que pegou 18 anos de prisão.

O combate a esses grupos, porém, encontra barreiras no país. A primeira é a tática de crescimento em cima de pautas conservadoras, como o ataque aos direitos LGBTQIAPN+. A outra é a própria ideia de liberdade de expressão vigente nos Estados Unidos, que permite que esses grupos destilem ódio impunemente.

Para Jean Goldenbaum, falta um entendimento sobre o limite dessa liberdade de expressão, sobretudo quando ela agride o próximo. E a questão não é apenas legal, mas também de educação da sociedade.

“‘God hates gays’ (Deus odeia gays, em inglês). Isso é um crime, não é liberdade de expressão”, afirma o analista, “você está incitando, em diversos estágios, em diversos andares, crimes. Alguém pode ir agredir um gay, matar um gay, afinal existe alguma justificativa, Deus odeia os gays. Está escrito, está falado isso. Quantas pessoas vão ver isso e vão, talvez, usar isso como justificativa para matar um gay? Então, isso que eu tô explicando, que é uma coisa elementar, na verdade, nunca será elementar em uma sociedade que não é educada”.

Edição: Thales Schmidt