Em janeiro deste ano, a pernambucana Luciana Santos assumiu o comando do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. A ministra é a primeira mulher a chefiar o ministério. Ainda em seu discurso de posse, ela afirmou que a prioridade era dar mais espaço para as mulheres cientistas. “Essa gestão vai honrar as milhares de mulheres que produzem e pesquisam nesse país, sua luta por respeito, inclusão e valorização", declarou.
Após pouco mais de seis meses, o ministério tem atuado na retomada do fomento à pesquisa com medidas que tiveram uma boa aceitação pela comunidade científica, a exemplo do reajuste de 10% em bolsas de pesquisa, a recomposição do Fundo Nacional de Desenvolvimento de Ciência e Tecnologia, o Programa Beatriz Nascimento de Mulheres na Ciência e o investimento de 3,6 bilhões no Programa de Recuperação e Expansão da Infraestrutura de Pesquisa Científica e Tecnológica em Universidades e Instituições de Ciência e Tecnológica – o Pró-Infra.
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Em entrevista exclusiva ao Brasil de Fato, a ministra reafirma a necessidade de alavancar o financiamento da pesquisa no Brasil e fala na repatriação de cérebros brasileiro - que elencou como desafio do Ministério. Confira:
Brasil de Fato Pernambuco: O Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações tem uma forte relação com o estímulo à pesquisa científica e nós viemos de quatro anos de um governo negacionista. Então queria saber como foi que vocês encontraram esse Ministério nesse momento?
Luciana Santos: A exemplo das políticas públicas de uma maneira geral no país e da herança que nós herdamos, seja do ponto de vista econômico, seja das entregas que a população tanto merece, no Ministério da Ciência e Tecnologia não foi diferente.
Para além do debate do negacionismo, que ficou marcado inclusive nesse episódio da covid que é o fenômeno mundial mais recente e que exigiu da ciências muita resposta; foi exatamente o ex-presidente que negou as evidências e todo o conjunto de medidas que era necessário fazer naquele momento e tendo como resultante a segunda pior quantidade de mortes do planeta, e um retrocesso muito grande num grande patrimônio do povo brasileiro, que a cultura da vacina. Nós voltamos ao sarampo, a poliomielite, algo que era a página virada da história.O prejuízo é imenso do ponto de vista da narrativa, da luta ideológica, e ela se retratou na redução drástica dos recursos para a Ciência e Tecnologia e Inovação.
Nós tivemos no Fundo Nacional de Desenvolvimento de Ciência e Tecnologia uma redução absurda, a ponto do fundo que nós herdamos estava contingenciado até 2026. O presidente Lula tomou a decisão de fazer com que a Medida Provisória caísse por decurso de prazo e nós pudemos recompor integralmente o Fundo Nacional do Desenvolvimento da Ciência Tecnologia, que é a principal ferramenta de financiamento dos projetos e ações de pesquisa e desenvolvimento da ciência brasileira. Essa foi a herança que o ex-presidente deixou, de terra arrasada, mas que infelizmente nós estamos muito rapidamente recuperando.
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Uma das primeiras medidas do governo foi o aumento de bolsas de pesquisa e existe também uma expectativa do Fundo Nacional de Ciência e Tecnologia, que tem uma meta de reajustar em quase 200% o valor de 250 mil bolsas de pesquisa. Então, quais são os desafios para aumentar o financiamento da pesquisa no Brasil?
Luciana Santos: Há dez anos não havia reajuste de CNPq e Capes, que são instituições brasileiras da década de 1950 e que são os principais financiadores dos bolsistas responsáveis pela produção de pesquisa. Ao contrário do que o governo dizia nós não achamos as Universidades e Institutos Federais espaços de balbúrdia, muito pelo contrário, nós achamos que são espaços da excelência e não é só porque nós achamos, há comprovações da produção científica através de papers, das produções científicas que são reconhecidas internacionalmente e que 90% ou vem da Academia ou vem dos institutos nacionais de ciência e tecnologia, e de maneira geral públicos, revelando que a força da produção do conhecimento é inconteste no Brasil.
Não reajustar a bolsa em dez anos significa matar por inanição a produção e desenvolvimento de pesquisa. Com reajuste de 10%, isso causou um grande ânimo na na comunidade acadêmica e científica e ainda aumentamos em 10 mil as vagas de bolsas para poder garantir que a diversidade e a dimensão que nós temos na produção científica para que os desafios, que são cada vez mais maiores, pudessem ser respondidos à altura.
É esse o desafio brasileiro. A gente tem uma fortíssima produção científica, mas ela não se realiza em produtos e serviços. É o grande paradoxo que nós temos no desafio da ciência e tecnologia. Com isso nós caminhamos para haver uma maior intercessão entre o que produz a Academia com com o que existe no mercado.
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Então, essas são medidas que nós estamos estabelecendo, mas também estamos focados no fortalecimento do papel da mulher na ciência, por isso que para além das futuras cientistas, das mulheres inovadoras que a Finep editou, nós também vamos fazer um edital do CNPq para meninas e mulheres na ciência, principalmente nas áreas de ciências exatas, porque essa é uma área onde tem muito déficit. Então para engenharia, para ciências exatas, ciência da computação, para exatamente resolver um fosso histórico que não tem motivo de ser a não ser pela subjetividade machista que é incutida por gerações e gerações.
Em 2009, Luciana assumiu a Secretaria de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente de Pernambuco, no governo de Eduardo Campos / Diego Galba
Recentemente a Capes anunciou normas que permitem o acúmulo de bolsas de pesquisa com vínculo empregatício. Essa medida foi celebrada por boa parte da comunidade acadêmica, que viu a possibilidade de um perfil menos elitizado adentrar nas pós-graduações. Então, como o Ministério pode atuar junto a instituições como a Capes para popularizar o acesso à pós-graduação?
Esse é um desafio muito grande que está também associado a esse esforço de repatriação dos cérebros brasileiros. Todas as iniciativas que a gente tem feito, tem feito de maneira conjunta, de modo a estabelecer isonomia na política da Capes e CNPq. Está dentro do nosso escopo e nós enxergamos isso de maneira muito positiva. Nós estamos dando anuência a esse tipo de iniciativa.
A gente tem falado dessa retomada do investimento na pesquisa e existem ações que foram extintas pelo governo Bolsonaro, como o Ciência sem Fronteiras, por exemplo. Quais são os programas e ações prioritários do ministério para o próximo período?
O foco que a gente está tendo agora e que inclusive aprovamos dentro dos dez programas de do Fundo Nacional de Desenvolvimento de Ciência e Tecnologia no conselho diretor do fundo é a repatriação de cérebros brasileiros. Nós tivemos o Ciência sem Fronteiras, mas é preciso haver um freio de arrumação para a gente estudar uma estratégia.
O problema principal é que há uma evasão muito grande de cérebros e nós temos que exatamente equilibrar isso, então nós vamos fazer um freio de arrumação, compreender melhor o fenômeno que aconteceu para poder fazer um ajuste fino. Por outro lado, como compatibilizar esse esforço de repatriação com a necessidade de intercâmbio? Porque eles vão continuar, o que nós vamos fazer é um ajuste também no conceito que foi desenvolvido lá atrás no Ciência Sem Fronteiras.
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Fonte: BdF Pernambuco
Edição: Vanessa Gonzaga