O Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) será formalmente notificado sobre a tragédia socioambiental vivida em Maceió (AL) causada pela extração mineral feita pela Braskem. A ativista alagoana Evelyn Gomes está em Genebra e participa da 53ª Sesão do organismo internacional para denunciar o caso.
Dirigente do LabHacker, um laboratório de inovação que atua nas áreas de política, tecnologia e arte, Gomes está na Suíça na condição de defensora dos direitos humanos. Em manifestação oral, ela vai apresentar as violações de direitos das pessoas atingidas pelo caso e, de maneira mais ampla, ressaltar a invisibilidade das regiões Norte e Nordeste do país.
"Me dava muita agonia perceber quanto os dados eram difusos e de difícil acesso. Então na pandemia eu decidi organizar esses dados, porque é muito absurdo esse caso, e nisso fui tentando pautar a imprensa, né? E eu via que era muito difícil. Saía uma matéria, não repercutia, saía outra matéria, não repercutia", contou a ativista ao Brasil de Fato.
A audiência será realizada entre quarta-feira e sexta desta semana (28 a 30 de junho) e pode ser acompanhada ao vivo no site da ONU. Não há horário definido, já que serão apresentados outros casos durante os dias de sessão.
O afundamento
O problema começou há cinco anos, quando começaram a ser sentidos os efeitos da extração de sal-gema (que pode ser usado em cozinha e para produção de produtos como plástico do tipo PVC e soda cáustica). Cinco bairros da capital alagoana tiveram afundamento de solo devido à extração do mineral, que é formado no subsolo, a cerca de mil metros da superfície.
Apesar de não ter havido mortes diretas, cerca de 60 mil pessoas tiveram de ser removidas de suas casas devido aos riscos de desabamentos. Muitas construções foram demolidas. Estudos apontam que o caso é a maior tragédia socioambiental em zona urbana no mundo.
"Aí eu pensei 'pera aí, essa empresa tem muito problema e tem muito poder, porque nada viraliza, né?' E é um caso que quando você vai comparar em outros lugares do mundo, ele é muito grande. Aí pensei, 'vamos precisar ir para cortes internacionais, não vai dar para esse caso ficar no Brasil, porque senão não vai acontecer nada'", relatou Gomes.
Para chegar ao Conselho de Direitos Humanos da ONU, ela participou de formações do Instituto de Desenvolvimento e Direitos Humanos (IDDH), com sede em Joinville (SC), e recebeu apoio da própria entidade. Junto a dois outros ativistas brasileiros, Lucas Enock e Rafaela da Cunha Pinto (que defenderão outras pautas), foi selecionada em edital para participação na sessão da ONU.
"A Braskem não está em pauta e não aparece em nenhum relatório na ONU até hoje, então o que eu vim fazer aqui foi pedir vistas para o caso, para que a Braskem entre, o caso de Maceió entre nos relatórios", contou, em entrevista concedida em meio às atividades em Genebra.
A escavação para exploração das jazidas de sal-gema pela Braskem na capital alagoana durou cerca de 40 anos. O afundamento aconteceu pois a região tem uma falha tectônica. A consequência foi o afundamento do solo nos bairros de Bebedouro, Bom Parto, Farol, Mutange e Pinheiro, além da localidade de Flexal.
Após firmar acordos com a Justiça com intermediação do Ministério Público, a empresa petroquímica já pagou mais de R$ 3 bilhões em indenizações e auxílios, além de gastos com advogados. A ativista defende que o Estado brasileiro tenha participação ativa no caso para garantir reparações efetivas.
"O estado vai precisar mediar melhor esse caso, porque ficou só o Ministério Público atuando junto a uma empresa extremamente poderosa. É sempre importante lembrar que o Ministério Público estava pressionado, que poderia haver um desabamento de solo e muitas mortes. Foi bom, não aconteceu [o desabamento com mortes], mas quem se beneficiou [dos acordos] foi a empresa, nitidamente. A gente precisa, agora, reabrir o caso e buscar reparações", concluiu.
Edição: Nicolau Soares