O início do julgamento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que pode tornar Jair Bolsonaro (PL) inelegível ampliou as expectativas de lideranças do campo da esquerda em torno da responsabilização do ex-presidente. Acusado de cometer abuso de poder político por conta da reunião em que tentou descredibilizar o sistema eleitoral brasileiro diante de embaixadores em julho do ano passado, com transmissão por canais oficiais, Bolsonaro recebeu parecer do Ministério Público Eleitoral (MPE) favorável à sua inelegibilidade.
A sessão do TSE foi suspensa logo depois do posicionamento do MPE para ser retomada na próxima (27), com a leitura do voto do relator do caso na Corte, o ministro Benedito Gonçalves, mas a largada do julgamento foi suficiente para atiçar as críticas por parte de parlamentares que cobram penalidades para o ex-presidente. O pedido apresentado à Justiça Eleitoral partiu do PDT, autor da ação que está em discussão na Corte. Em entrevista à GloboNews nesta quinta (22), o líder do partido na Câmara dos Deputados, André Figueiredo (CE), disse esperar que o tribunal "nos livre do risco à democracia que ele sempre representa".
"Cabe aos ministros do TSE trabalharem na perspectiva de que aquele ato veio dentro de um contexto de ataque violento à democracia, inclusive com o 8 de janeiro, que, evidentemente, não vai ser analisado porque ele já não era mais presidente da República. Mas todos esses atos foram uma sequência de ações que infelizmente levaram o nosso Brasil a passar anos muito difíceis e com grave risco à democracia", disse.
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O deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) se manifestou via Twitter. "Que Bolsonaro seja condenado por seus crimes e tornado inelegível, virando essa página triste de nossa história. Bolsonaro inelegível já", cobrou o parlamentar, que também comentou as características do posicionamento do relator. "O voto estritamente técnico do ministro Benedito Gonçalves desmonta completamente qualquer argumento de Bolsonaro quanto à perseguição judicial. Ele narra exaustivamente o passo a passo da investigação e a plena lisura do processo. Não há como se vitimizar."
O voto estritamente técnico do ministro Benedito Gonçalves desmonta completamente qualquer argumento de Bolsonaro quanto à perseguição judicial. Ele narra exaustivamente o passo a passo da investigação e a plena lisura do processo. Não há como se vitimizar. BOLSONARO INELEGÍVEL!
— Orlando Silva (@orlandosilva) June 22, 2023
A presidenta do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR), também se pronunciou pelo Twitter. "Não está fácil a vida do genocida depois do que a gente viu no primeiro dia de julgamento no TSE. Sabendo disso, [a oposição] já começa a narrativa de vitimização, falando em depressão de Bolsonaro. É isso que vão fazer, colocar ele como coitado pra manipular o povo. Mas não vai colar. Todo mundo sabe bem o mal que esse homem fez. [Em] depressão ficou o país na presidência dele”, criticou.
Não tá fácil a vida do genocida depois do que a gente viu no 1o dia de julgamento no TSE. Sabendo disso já começa a narrativa de vitimização, falando em depressão de Bolsonaro. É isso que vão fazer, colocar ele como coitado pra manipular o povo. Mas não vai colar, todo mundo sabe…
— Gleisi Hoffmann (@gleisi) June 22, 2023
O líder do PSOL na Câmara, Guilherme Boulos (SP), disse ao Brasil de Fato que vê o julgamento como o início de um amplo processo de responsabilização para o ex-presidente. "Torná-lo inelegível é apenas o começo de um grande acerto de contas que o país precisa ter com sua história. Ele e seus cúmplices precisam ser responsabilizados por todos os crimes que cometeram, como a tragédia deliberada do negacionismo durante a pandemia e a tentativa de golpe do 8 de janeiro. Não se trata de 'revanchismo', pelo contrário: trata-se, isto sim, de justiça e direito à memória. O Brasil precisa lidar com os erros do passado para que eles jamais voltem a se repetir no futuro".
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Na mesma sintonia, a psolista Fernanda Melchiona (RS) disse à reportagem que espera justiça e rapidez no julgamento. "Foram públicos e notórios o abuso de poder público e o uso de canais estatais durante aquela reunião escandalosa que Bolsonaro fez com os embaixadores de julho de 2022. A inelegibilidade de Bolsonaro é o mínimo. Que seja o passo inicial da luta por responsabilização pelos crimes cometidos por ele."
A parlamentar cita diferentes condutas do ex-presidente que marcaram a sua gestão à frente do Palácio do Planalto nos últimos quatro anos. "São muitos processos criminais, como os crimes contra a humanidade no caso da covid, no caso dos Yanomami, e depois, claro, toda essa narrativa golpista que culminou no ato de 8 de janeiro e que, sem sombra de dúvida, tem a participação dele como mentor no discurso e na própria narrativa", disse Melchiona.
Para Glauber Braga, a penalização do ex-capitão pelo TSE seria um sinal importante para a preservação do sistema democrático no país. "A perda dos direitos políticos é uma resposta para demonstrar que Bolsonaro não tem a possibilidade de tocar um fechamento de regime como ele esperava que fosse fazer", disse ao Brasil de Fato.
Caminhos
Para Braga, é preciso não só batalhar pela responsabilização judicial do ex-presidente, mas também pensar os caminhos a serem seguidos para as forças democráticas e progressistas no atual momento da história. Com o bolsonarismo ainda vivo no meio social e presente nos diferentes setores da luta institucional, especialmente no Congresso Nacional, o deputado vê a necessidade de se travar o que chama de "luta direta com as estruturas que deram sustentação ao governo Bolsonaro ou àquilo que se chama de bolsonarismo".
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"Os fundamentalismos diversos é uma delas, a agenda de aplicação do Estado penal e policial punitivo também, que tem uma relação direta com milícias, os generais que compuseram o primeiro escalão do governo Bolsonaro, a relação que [isso] teve em determinado momento com o lavajatismo e inclusive com o objetivo de extrema direita. Ou seja, é continuar trabalhando com um processo de responsabilização em relação a esses setores", explanou.
Para o deputado, a jornada deve incluir ainda o enfrentamento à agenda de aplicação do ultraliberalismo no país, que viveu seu auge com os governos Temer (2016-2018) e Bolsonaro (2018-2022). "Existe uma enorme expectativa em relação ao governo Lula para a superação do que foi a agenda de exclusão que deixou mais de 100 milhões de pessoas passando por algum tipo de insegurança alimentar no governo Bolsonaro. Então, para que a gente consiga superar essa situação, tem que superar também a aplicação dessa agenda de natureza liberal para [trocar] por uma agenda que seja de fato garantidora dos direitos da maioria do povo."
Por fim, o parlamentar defende que o campo progressista enfrente o legado do bolsonarismo com mobilização e organização popular para além dos espaços institucionais. "Se acharmos que vamos conseguir derrotar essas estruturas só dependendo da articulação com Lira e companhia, estamos fritos. A gente só consegue avançar e derrotar de maneira definitiva essas forças com muita mobilização e organização nas ruas, nos movimentos e comunidades para além do espaço institucional parlamentar."
Edição: Thalita Pires