Operações da Polícia Rodoviária Federal (PRF) em 30 de outubro de 2022, dia do segundo turno das eleições presidenciais, foram acertadas durante reunião entre a cúpula da corporação, convocada às pressas entre a primeira e a segunda rodada de votação, pelo então diretor-geral, o bolsonarista Silvinei Vasques.
A realização da reunião foi confirmada pela coluna da jornalista Malu Gaspar, do jornal O Globo, após pedido via Lei de Acesso à Informação (LAI). Segundo documento obtido pelo jornal, 44 dos 49 integrantes do Conselho Superior da PRF, composto por diretores e superintendentes, participaram do encontro, realizado em Brasília.
Na reunião, realizada em 19 de outubro, ficou definido que agentes dificultariam o tráfego em regiões com altos índices de votação do candidato que viria a ser eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o que foi percebido e denunciado por líderes políticos e outros cidadãos desde as primeiras horas daquele dia de segundo turno.
Os documentos recebidos pelo jornal, porém, informavam que a reunião teria tratado apenas de temas irrelevantes, como escalas de serviço. Porém, a operação para dificultar a vida de eleitores de Lula foi confirmada pelo jornal em um esforço de apuração que durou cerca de cinco meses.
Segundo informou a coluna, cinco integrantes da PRF que estavam em Brasília confirmaram que a chamada "Operação Eleições 2022" foi o principal tema debatido. De acordo com as fontes ouvidas pelo jornal, Vasques chegou a dizer que a PRF deveria "tomar lado" na disputa que opunha Lula a Jair Bolsonaro (PL).
Em 30 de outubro, dia do segundo turno, o Brasil de Fato mostrou que a agenda de Silvinei Vasques estava em branco havia 25 dias - o que contraria uma Lei federal. Ou seja, a reunião em questão não tinha sido divulgada.
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Reforço no Nordeste
Ainda de acordo com os policiais que concordaram em dar entrevista, o diretor-geral afirmou que um novo mandato de Bolsonaro traria "benefícios" a todos os presentes, e cobrou especial engajamento dos superintendentes que atuavam em estados da região Nordeste.
Segundo as fontes que concordaram em falar com a coluna de Malu Gaspar, não houve concordância total com as orientações dadas por Vasques. Mais que isso, alguns dos presentes teriam demonstrado "perplexidade".
Dois dos cinco integrantes da PRF ouvidos pelo jornal disseram que havia justificativas formais para reforçar a atuação em estados nordestinos: o fornecimento de transporte público gratuito a eleitores (o que elevaria o número de ônibus nas estradas) e denúncias de compras de votos.
Ata sem assinaturas
Em geral, encontros como o que foi relatado pelo O Globo são realizados de maneira virtual, para evitar a necessidade de deslocamento de superintendentes regionais da corporação. Entretanto, naquela ocasião, a reunião foi totalmente presencial, e celulares e relógios foram confiscados na entrada. Com isso, não houve registro gravado.
A ata da reunião, que não registra informações sobre a "Operação Eleições", não tinha qualquer assinatura até o dia 10 de novembro, ou seja, 22 dias após o encontro do colegiado. Foi exatamente nessa data que o jornal O Globo solicitou o documento via Lei de Acesso à Informação.
Outros 24 participantes da reunião assinaram eletronicamente o documento no dia 16 de novembro. Até o dia 29 (portanto, mais de um mês após a reunião), outros participantes assinaram, mas pelo menos sete não tinham registrado presença até o dia em que o documento foi encaminhado ao jornal, em 12 de dezembro.
Silvinei Vasques foi procurado pela coluna do jornal, mas não foi localizado. A PRF disse que as inconsistências sobre as assinaturas da ata devem ser explicadas pelos próprios agentes e que, em caso de férias, a assinatura digital só pode ser confirmada após o retorno.
Edição: Cris Rodrigues