Concordando com o que vinha sendo denunciado por entidades indígenas nos últimos anos, a Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do Ministério Público Federal (MPF) disse, em nota pública, que as medidas adotadas pelo governo Bolsonaro em relação ao povo Yanomami “foram limitadas”.
A manifestação do MPF, feita na noite de segunda-feira (23), alinha-se a uma denúncia feita em agosto de 2022 pelo site The Intercept Brasil a respeito de 21 ofícios que foram enviados da entidade Hutukara Associação Yanomami para o governo para alertar os gestores públicos sobre o risco de “genocídio”, palavra expressamente utilizada pela organização nos comunicados. Tais documentos foram enviados à Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), ao MPF e ao Exército.
Os procuradores da República ligados à Câmara de Populações Indígenas citam que, entre outras coisas, o órgão assinou uma recomendação em parceria com a Procuradoria da República em Roraima para dar orientações sobre a reestruturação da assistência básica de saúde dirigida às comunidades da Terra Indígena Yanomami (TIY).
A iniciativa se deu em novembro de 2021, quando foi pedido à Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) e ao Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami (DSEI Yanomami) que o seu planejamento institucional fosse reformulado. O documento solicitava, entre outros pontos, a contratação de mais profissionais de saúde e planos de ação para os principais desafios que afetam a população local. O MPF pediu, na ocasião, que as iniciativas centrassem especialmente no combate às causas de mortalidade infantil, malária e subnutrição, problemas que são os mais denunciados pela comunidade.
Em novembro do ano passado, outra recomendação foi expedida da Procuradoria da República em Roraima para o então ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, e a Sesai. Na ocasião, os membros do MPF informaram o governo sobre deficiências observadas no atendimento de saúde ao povo Yanomami que estavam sob apuração dos procuradores desde 2020.
“À vista das reiteradas notícias de desabastecimento dos estoques de medicamentos, o MPF promoveu aos 29 de julho de 2022 inspeção in loco da Central de Abastecimento Farmacêutico (CAF) do DSEI Yanomami e constatou, entre outros achados, que a empresa contratada para fornecer o vermífugo albendazol entregou o fármaco em quantitativo bastante inferior ao que constava em nota fiscal”, destacava o documento.
A medida foi seguida por um inquérito civil que buscou investigar em detalhes a reincidência do problema. “Tal apuração identificou graves irregularidades no recebimento, cadastramento e distribuição de fármacos contratados, resultando no desabastecimento farmacêutico generalizado das unidades de saúde da TI Yanomami”, indica a nota do MPF.
Diante da inoperância dos órgãos públicos do Executivo federal durante a gestão Bolsonaro, o MPF ajuizou ação civil pública em 2020 para pedir que União, Funai, Ibama e ICMBio fossem obrigados a apresentar plano emergencial de ações e respectivo cronograma para acompanhamento da situação da comunidade. Na época, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) concedeu liminar favorecendo o pedido do MP.
“No entendimento do Ministério Público Federal, a grave situação de saúde e segurança alimentar sofrida pelo povo Yanomami, entre outros, resulta da omissão do Estado brasileiro em assegurar a proteção de suas terras. Com efeito, nos últimos anos se verificou o crescimento alarmante do número de garimpeiros dentro da TI Yanomami, estimado em mais de 20 mil pela Hutukara Associação Yanomami”, atribuem os procuradores.
Edição: Rodrigo Durão Coelho