Desde 1989, o Brasil está acostumado a ver debates presidenciais e talvez o desta sexta-feira (28), realizado pela Rede Globo, tenha sido um dos mais tensos, exatamente pelo fato de ter reproduzido fielmente as estratégias de campanha de cada um. Enquanto Lula buscou uma postura de estadista, invocando sua experiência de ex-presidente e líder político importante há décadas, Bolsonaro despejou sua tradicional rajada de fake news (ou, em português direto, mentiras e distorções) com o intuito de confundir e desestabilizar o adversário.
O comportamento do atual ocupante do Palácio do Planalto é semelhante ao que se chama nas redes sociais de troll, uma figura que não quer de fato debater, mas tem como objetivo tirar seu rival do sério. Nesse sentido, o petista conseguiu algo que talvez poucos de nós conseguiriam: se manter calmo e mostrar energia em determinados momentos para refutar os argumentos, xingamentos e ofensas do candidato do PL.
Durante todo o primeiro bloco, por exemplo, Bolsonaro tentou cobrar Lula de uma peça da sua propaganda na qual falava que o atual presidente iria extinguir direitos trabalhistas como férias e 13º salário. O ex-presidente, por seu lado, quis puxar o rival para uma área em que o candidato do PL vai mal pois tem poucos dados para mostrar: a economia.
A estratégia adotada pelo ex-capitão era apenas uma forma usada para acusar o adversário de "mentiroso", ofensa que repetiu em todos os blocos em temas diversos. É um tipo de atitude que ajuda a mobilizar sua base, que gosta de seu comportamento agressivo, mas que estabelece uma linha que impede um eventual eleitor indeciso de aderir à sua candidatura.
Lula, por seu lado, não caiu em nenhuma das cascas de banana do candidato do PL, seja em temas como corrupção ou nas chamadas pautas morais. Também evitou a aproximação física, chegando a dizer a certa altura: "Não quero ficar perto de você". Quando o tema se tornou livre novamente, no terceiro bloco, Lula trouxe o tema da pandemia e o corte de recursos no Farmácia Popular. Também falou da qualidade de empregos gerados atualmente, fazendo uma distinção em relação ao trabalho informal. Foi bem em questões onde tem o que apresentar.
O pós-debate
Um encontro como este, a poucas horas do início da votação, vale por uma tentativa de gerar um fato novo que possa modificar o cenário, algo que Bolsonaro buscou o tempo todo ao perseguir uma desestabilização de Lula. Não conseguiu. Depois disso, resta a edição de cortes do encontro e aí, como na campanha do candidato do PL, tem material para todo gosto, desde aqueles voltados para um segmento mais radicalizado, como o trecho em que alega ter "todo o sistema" contra ele, até momentos nos quais aparece mais sereno.
Lula quis contrastar invocando alguém que respeita o que já se chamou de liturgia do cargo. Ao trazer para o debate, por exemplo, temas que vão desde a violência contra a mulher até a política externa, envia uma mensagem não apenas de inclusão como também de diálogo, o que o diferencia da figura de Bolsonaro e também contesta a acusação de sectarismo do rival.
Em resumo, o candidato do PT tem maiores possibilidade de trazer indecisos ou mesmo brancos, nulos e aqueles que se abstiveram no primeiro turno em função do debate. Mas há mais campanha e o candidato à reeleição aposta na chamada campanha subterrânea para ampliar seu manancial de votos. É pouco tempo e o embate fornece pouco material. O tempo corre contra Bolsonaro e o debate não o favoreceu.
Edição: Thalita Pires