Deputado federal mais votado no estado de São Paulo, Guilherme Boulos (Psol) avalia que antipetistas que antes apostavam em outras candidaturas anteciparam migração de votos para Jair Bolsonaro (PL). Portanto, não haverá margem para que o atual presidente consiga superar os 6 milhões de votos que o separaram do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no último domingo (2). Para Boulos, o sentimento de frustração é um fato, pois havia expectativa de vitória no primeiro turno. Mas isso não pode ser razão para se temer outra frustração. “Quem já suportou quatro anos suportará mais 28 dias.” Além disso, ao contrário, Bolsonaro é que deve ter medo, disse Boulos, em entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, ontem (3). Afinal, se perder e as investigações de corrupção e outras imoralidades hoje jogadas para debaixo do tapete andarem, Bolsonaro ainda pode acabar na cadeia.
O entrevistado foi diversas vezes pressionado a responder sobre uma eventual necessidade de Lula pender para o centro e à direita para encorpar a frente ampla. Em todas elas, reiterou que o ex-presidente tem “programa de governo e visão de país” partilhados entre todos os partidos da coligação Brasil da Esperança. Afirmou que a agenda de Lula prevê reforma tributária, reforma política, revisão da reforma trabalhista e do teto de gastos. E que a presença de Geraldo Alckmin (PSB) como vice não está condicionada a se mexer nesses objetivos. “Em nenhum momento ideais liberais de Alckmin foram incorporados ao programa.”
Correlação de forças
Boulos enfatizou que o fato de outros ex-candidatos a presidente e lideranças políticas mais ao centro ou próximos do mercado financeiro declararem apoio a Lula no primeiro turno não significa futuras concessões. “Lula não vai vencer a eleição com a agenda da Faria Lima”, disse, referindo-se ao reduto geográfico paulista onde se concentram bancos de investimento e operadores do mundo especulativo. “A agenda de Lula é a da mudança.”
Desafiado a explicar como Lula aplicará seu programa – de mais investimentos públicos para criação de empregos e retomada de programas sociais inclusivos –, Guilherme Boulos foi taxativo com a bancada do Roda Viva. “Ideias de mudança não dependem apenas da correlação de forças dentro do Congresso. A mobilização de massas também conta. Foi ela, aliás, que fez do ex-metalúrgico presidente da República”, argumentou.
O líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) afirmou que, apesar da presença de bolsonaristas “raiz” no Congresso – com quem é impossível haver diálogo –, essa bancada não é maior do que a do campo progressista. E que com todos os demais, do centro à direta liberal, se pode dialogar. “Não é preciso voto de bolsonarista para se aprovarem projetos sociais.”
Esperança em São Paulo
Boulos acredita ainda que tenha ocorrido em São Paulo o mesmo fenômeno que resultou numa diferença menor do que a esperada entre Lula e Bolsonaro. Para ele, é possível que boa parte do “voto útil” a Bolsonaro, de eleitores de direita que estavam com Rodrigo Garcia (PSDB), já tenha migrado também para Tarcísio de Freitas (Republicanos). Ou seja, eleitores do centro e da direita, mas não fascistas e avessos aos ataques à democracia, podem devolver a liderança a Fernando Haddad no segundo turno da eleição para o governo de São Paulo.
O futuro deputado federal avalia que a campanha de Bolsonaro “vai tocar o terror” nas próximas semanas. “Não acredito em Bolsonaro paz e amor”, diz. Mas que esse objetivo de promover intimidação para tentar fragilizar a campanha de Lula não irá prosperar. “O Brasil não tem 51 milhões de fascistas”, afirma.