Saúde pública

Varíola dos Macacos: medidas de prevenção valem para toda a população, sem preconceito

Especialistas apontam riscos de estigmatização da doença e alertam que o combate precisa ser coletivo

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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Campanha de vacinação contra a varíola dos macacos nas ruas de Nova Iorque (EUA); Brasil ainda não tem previsão para aplicação de doses - ©Spencer Platt / AFP

Poucos dias antes de o Brasil confirmar três casos de infeção por varíola dos macacos em crianças, a Organização Mundial da Saúde (OMS) havia reforçado o alerta para os riscos de propagação da doença entre toda a população, reiterando que ela não está restrita a grupos específicos.

Em reunião com a imprensa, membros da OMS relembraram que a infecção é particularmente preocupante e pode causar casos graves entre pessoas que ainda estão nas primeiras fases de desenvolvimento, mulheres grávidas e pacientes com a imunidade comprometida. 

De acordo com a organização, mais de 80 casos em crianças foram reportados em todo o mundo. Existe o receio de que ambientes coletivos como escolas possam se tornar locais de contágio e as infecções relatadas estão em monitoramento. 

Hoje, há mais de 20 mil pessoas contaminadas em 77 países. No Brasil, são mais de mil casos. A doença é considerada uma emergência de saúde pública de interesse internacional.  

Estigma

A preocupação de autoridades da saúde em alertar sobre os riscos para toda a população tenta combater a criação de um estigma de que a doença está relacionada à comunidade LGBTQIA+.

Mais de 90% dos casos relatados até agora atingiram homens que fazem sexo com homens. A própria OMS incluiu na lista de medidas para prevenção da propagação a diminuição de parceiros sexuais, mas deixou explícito que essa não é a única recomendação.

“Nem todas as regiões tem a mesma epidemiologia. Algumas têm cerca de 1/3 de mulheres afetadas, em algumas regiões há crianças afetadas. São diferentes tipos de multitransmissão. Nós temos que ser muito claros sobre quem precisa ter as informações para se proteger e isso inclui pessoas que têm parceiros sexuais."

"Mas há outros tipos de exposição e essa mensagem precisa ser passada. Prevenir estigma e discriminação é importante. Nossa preocupação é que estigma, descriminação e medo façam as pessoas não buscarem diagnóstico e cuidado e isso vai prejudicar a resposta”, afirmou a líder técnica para assuntos relacionados à varíola dos macacos da OMS, Rosamund Lewis.

O infectologista e especialista em atendimento à população LGBTQI+, Vinicius Borges, afirma que é preciso fazer intervenções em grupos que apresentam maior vulnerabilidade, mas é essencial também reforçar que os cuidados servem para todas as pessoas.

“Mesmo que os dados epidemiológicos apontem essa alta incidência em um grupo específico, isso é uma conjuntura temporária. Toda infecção começa em um grupo específico, mas é um problema de todo mundo."

"Não é uma questão de que um grupo está fazendo algo de errado. Isso é uma questão de saúde pública. É importante entender que a saúde do próximo, do vizinho, da vizinha, seja hétero, gay ou bissexual é tão importante quanto a sua. Os cuidados de prevenção são válidos para todo mundo. Não tem como falar de saúde individual sem falar de saúde coletiva.”

Ariadne Riberito Ferreira, oficial para Comunidade, Gênero e Direitos Humanos do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDS (Unaids) lembra que o estigma associado ao HIV causou prejuízos consideráveis e representou violações de direitos humanos. Segundo ela, a sociedade não pode permitir que a resposta à varíola dos macacos siga um caminho semelhante. 

“Sempre que surge uma epidemia nova e começa a se observar um aumento de casos, é muito comum tentar encontrar alguma semelhança nas pessoas atingidas, para que estratégias sejam mais eficazes em determinados grupos. Mas tem que se ter muito cuidado com isso”.

"Não dá para fazer uma associação em função de determinado grupo de pessoas. Toda forma de prevenção e comunicação tem que ter esse cuidado. Não podemos mais permitir que, em um momento de desespero, em que estamos enfrentando um novo desafio, ainda sejam mais marginalizados aqueles que estão sofrendo com a epidemia”.

Prevenção e cuidados

Causada por um vírus pertencente ao gênero ortopoxvírus da família poxviridae, a varíola dos macacos tem semelhanças com a varíola humana - que causou crises sanitárias no mundo todo por séculos, até que foi controlada pela vacinação na década de 1970.

A transmissão se dá a partir do contato próximo com fluidos corporais, gotículas respiratórias e materiais contaminados, como vestimentas, toalhas e roupas de cama. O período de incubação sem sintomas costuma durar de 6 a 13 dias, mas pode chegar até 21 dias.

Entre os sinais da doença são febre, dores no corpo e na cabeça, cansaço, gânglios inchados e lesões com feridas espalhadas pela pele. Os machucados causam dores e coceira e algumas manchas podem deixar cicatrizes.

Pacientes com a confirmação da doença devem se isolar e quem esteve com essas pessoas também precisa de monitoramento. Para prevenir o contágio é preciso evitar contato próximo, como beijos, abraços e relações sexuais e compartilhamento de itens pessoais.

 

 

Edição: Rodrigo Durão Coelho