Moradores da Terra Indígena (TI) Amambai, no Mato Grosso do sul, foram vítimas de uma ação violenta da Polícia Militar (PM) no dia 24 de junho, quando retomavam o território ancestral chamado Guapoy, hoje registrado como uma fazenda.
A expulsão resultou na morte do indígena Vitor Fernandes, de 42 anos, e deixou dezenas de feridos. Com o nome de Massacre de Guapoy, o episódio entrou para o histórico de conflitos agrários na região.
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Sob anonimato, uma liderança indígena local expõe a situação do confinamento territorial dos Guarani Kaiowá. "É pouco espaço para muito indígena, afirmou ao Brasil de Fato.
"Então essa é a nossa luta e por conta disso que está tendo esses muitos conflitos e também que os Guarani Kaiowá estão reivindicando para que seja demarcado [os territórios]. São mais de 30 aldeias, as retomadas, que estão sob ameaça", prossegue.
Assista ao vídeo:
"Muita terra para pouco índio"?
Rebatido à exaustão por especialistas, o argumento de que no Brasil há “muita terra para pouco índio” é especialmente mentiroso quando se fala dos Guarani Kaiowá no Mato Grosso do Sul.
Segundo a Agência Estadual de Defesa Animal e Vegetal do estado, uma família de quatro indígenas precisa de 30 hectares para garantir sua subsistência e conduzir atividades econômicas sustentáveis.
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Mas, na terra indígena Amambai, a média é de 0,8 hectare para cada unidade familiar, proporção parecida com a de outros territórios indígenas no Mato Grosso do Sul. Menor do que um campo de futebol, o espaço é insuficiente para a caça, a pesca, o plantio e o extrativismo.
Confinamento começou há mais de 100 anos
O confinamento dos indígenas em pequenas porções de terra no Mato Grosso do Sul remonta ao início do século 20, quando o Estado brasileiro vendeu as terras dos Guarani Kaiowá a latifundiários. O objetivo era delimitar e ocupar as fronteiras internacionais, no território que até então fazia parte do estado do Mato Grosso.
“Hoje nenhuma família Kaiowá e Guarani ocupa a porção territorial correspondente ao que a gente chamaria de Terra Indígena nos modelos preconizados pelo pós-Constituição", explica o antropólogo Diógenes Cariaga, professor da Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul (UEMS).
"Aqui, o que se chama de Terra indígena são basicamente as reservas que foram criadas no início do século 20 pelo SPI [Serviço de Proteção ao Indígena, antecessor da Funai]. Essas áreas não correspondem ao modelo de organização social e territorial Kaiowá e Guarani, que eles reivindicam e que está assegurado pela Constituição”, completa.
Ofensiva ruralista contra retomadas
As lideranças indígenas apontam que a violência se agravou com a chegada de Jair Bolsonaro à presidência. Os seguidos adiamentos da análise do marco temporal pelo Supremo Tribunal Federal e a paralisação das demarcações fazem a balança pender a favor dos latifundiários.
“Aqui é o estado onde mais se persegue e criminaliza a liderança. É o próprio estado, a própria polícia. Todas as pessoas que são foco do movimento são perseguidas. Não estamos nos sentindo seguros", relata a liderança Guarani Kaiowá.
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Segundo o professor da UEMS, a estrutura de segurança pública do estado atua em prol dos fazendeiros, na tentativa de impedir as retomadas. "Há uma constante violação de direitos. E o Estado não se reconhece como o principal agente desse problema", problematiza.
O antropólogo aponta uma contradição no papel do poder público. "O Estado tem papel histórico na defesa de direitos dos povos indígenas, porém há toda uma estrutura jurídica e política regional que faz pressão no Estado para que a proteção ao direito de propriedade prevaleça sobre os direitos originários", aponta.
Outro lado
A reportagem encaminhou as críticas à assessoria de imprensa do governo do Mato Grosso do Sul, mas não obteve resposta.
Edição: Rodrigo Chagas