Cerca de 48 horas após o desaparecimento do jornalista britânico Dom Phillips e do indigenista Bruno Pereira no Vale do Javari, Amazônia, o governo federal anuncia ações tímidas para localizá-los. Nas divulgações feitas nesta terça (7) pela Polícia Federal, pelo Ministério da Justiça e por outros órgãos sob administração do presidente Jair Bolsonaro (PL), o contingente reduzido de agentes chamou a atenção de entidades.
No início da tarde, a Fundação Nacional do Índio (Funai) afirmou que ampliou as buscas pelo indigenista e pelo repórter. Contudo, na nota oficial, admitiu que a operação conta com 15 servidores. Até o momento, o órgão mantém quatro embarcações em deslocamento na área. A terra indígenas do Vale do Javari tem 8,5 milhões de hectares. É o segundo maior território indígena do país e supera, em extensão territorial, países europeus, como a Áustria.
A PF, por sua vez, divulgou uma nota afirmando que destacou uma aeronave para atuar na região. Na foto divulgada pela corporação, aparecem apenas 11 agentes. "Foi enviada mais uma aeronave com policiais federais e integrantes do exército à região compreendida entre a frente de proteção etnoambiental itui-itauqai e o município de Atalaia do Norte/AM, região noroeste do Amazonas", diz o comunicado, também divulgado no início da tarde desta terça (7).
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Na noite de segunda-feira (6), o Ministério da Justiça afirmou, que, "desde que tomou conhecimento, iniciou operações na região amazônica do Vale do Javari juntamente com a Marinha do Brasil". "As operações ocorrem concomitantemente por meio aéreo, marítimo e terrestre e por determinação do Ministério da Justiça, a procura pelo indigenista e jornalista conta com equipes da Polícia Federal, Força Nacional de Segurança Pública e Funai", disse a pasta.
Na manhã desta terça, o ministro Anderson Torres (Justiça) fez uma publicação no Twitter com uma foto com cinco agentes perfilados e uma embarcação de pequeno porte. Pouco antes, o Exército divulgou as primeiras imagens de sua equipe na região.
Em publicação feita nesta terça (7), o Comando do Exército relatou que o Comando Militar da Amazônia "foi acionado para apoiar as buscas pelo servidor da Funai, Bruno Araújo Pereira, e pelo jornalista britânico Dom Phillips". Em nota divulgada no dia anterior, os militares haviam afirmado que aguardavam orientações do "alto escalão" para atuar no caso. Na foto divulgada pelo Exército, aparecem cerca de 50 agentes.
Vigília por Bruno Pereira e Dom Phillips
A organização Indígenas Associados (INA), associação de servidores da Funai, convocou para um ato-vigília permanente, a partir das 18h desta terça (7), em frente à sede do órgão em Brasília (DF), e nas unidades locais e regionais da Funai.
A INA, associação de servidores da FUNAI, convoca para Ato-Vigília Permanente!
— Indigenistas Associados (@INAindigenista) June 7, 2022
QUANDO: 07/06/2022, a partir das 18h
ONDE: Em frente à FUNAI-Sede (Brasília/DF), e nas unidades locais e regionais da FUNAI.#CadeBrunoeDom
JAIR APARELHOU A FUNAI pic.twitter.com/Gn6CzNiHp0
Apelos e acusação de omissão
Dom Phillips e Bruno Pereira faziam o percurso entre a vila ribeirinha São Rafael e a cidade de Atalaia do Norte na manhã de domingo (05), quando desapareceram. O objetivo da viagem era visitar a equipe de Vigilância Indígena que se encontra próxima à localidade chamada Lago do Jaburu, onde o jornalista faria entrevistas com os indígenas. O Vale do Javari abriga a maior quantidade de povos isolados do mundo. Dias antes do desaparecimento, o jornalista e o indigenista haviam sido ameaçados.
Enquanto prosseguem as buscas – bastante criticadas nas redes sociais por falta de empenho –, as famílias dos desaparecidos aumentaram o tom dos apelos públicos. Alessandra Sampaio, esposa de Phillips, gravou um vídeo curto, publicado nas redes sociais da jornalista Eliane Brum. "Queria fazer um apelo ao governo federal e para os órgãos competentes para intensificarem as buscas, porque a gente ainda tem um pouquinho de esperança de encontrar eles. Mesmo que eu não encontre o amor da minha vida vivo, eles têm que ser encontrados", disse ela, emocionada.
Já a família de Bruno Pereira, em nota à imprensa lamentou a falta de notícias e pediu mais empenho das autoridades. Leia a nota na íntegra:
Já são 48 horas de angústia à espera de notícias sobre Bruno Pereira e Dom Philips, que desapareceram no domingo quando viajavam no Vale do Javari, Amazonas. Durante todo o dia de ontem, tivemos poucas informações sobre a localização deles, o que tem aumentado este sentimento. Mas também temos muita esperança de que tenha sido algum acidente com o barco e que eles estejam à espera de socorro. Mantemos orações e agradecemos o apoio de familiares e amigos.
Contudo, em virtude de mais de 48 horas do desaparecimento do nosso Bruno e seu companheiro de viagem Dom Phillips, apelamos às autoridades locais, estaduais e nacionais que deem prioridade e urgência na busca pelos desaparecidos. Compreendemos que Bruno possui vasta experiência e conhecimento da região, porém, o tempo é fator chave em operações de resgate, principalmente se estiverem feridos. É fundamental que buscas especializadas sejam realizadas, por via aérea, fluvial e por terra com todos os recursos humanos e materiais que a situação exige. A segurança dos indígenas e equipes de busca também precisa ser garantida.
Bruno é um dedicado servidor público federal pela FUNAI e muito apaixonado e comprometido com seu trabalho. Pai amoroso de duas crianças e uma moça lindas, Bruno é filho, marido, irmão e amigo, ele leva essa paixão para sua jornada toda vez que entra na mata com o propósito de ajudar o próximo. Pedimos às autoridades rapidez, seriedade e todos os recursos possíveis para essa busca. Cada minuto conta, cada trecho de rio e de mata ainda não percorrido pode ser aquele em que eles aguardam por resgate.
Entidades pedem diálogo com o governo
Organizações dedicadas à proteção e defesa da liberdade de expressão e de imprensa no Brasil encaminharam, nesta terça-feira (07), um pedido de audiência urgente com o governo brasileiro para discutir o desaparecimento de Phillips e Pereira.
No Dia Nacional da Liberdade de Imprensa, as entidades enviaram ofício aos ministros da Justiça e Segurança Pública, Anderson Gustavo Torres, e da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, expressando apreensão com as buscas lentas e a falta de informações sobre o caso.
"Até a noite de 6 de junho, as informações divulgadas pela imprensa tratavam de um operativo limitado para as buscas de Bruno Araújo Pereira e Dom Phillips no local. Requeremos que seja concedida prioridade e urgência nas missões de busca de Bruno Araújo Pereira e Dom Phillips, e também que o governo brasileiro receba as organizações para uma audiência emergencial, em que informações sobre o andamento das buscas possam ser compartilhadas e atualizadas", dizem as entidades.
Assinam o documento: Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), Associação dos Correspondentes da Imprensa Estrangeira no Brasil (ACIE), Associação de Jornalismo Digital (Ajor), Artigo 19, Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ), Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), Instituto Tornavoz, Instituto Vladimir Herzog, Intervozes e Repórteres sem Fronteiras (RSF).
Edição: Rodrigo Durão Coelho