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Qual a responsabilidade dos EUA e da Otan pela Guerra na Ucrânia?

O socialista Brian Becker analisa o tema no Caminhos para o Mundo desta terça (3)

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Brian Becker é pacifista e fundador do Partido pelo Socialismo e Libertação (PSL) dos EUA - CGTN América

No dia 24 de fevereiro de 2022, a Rússia anunciou a invasão da Ucrânia e disse que seu objetivo era garantir que o país vizinho não entrasse na Aliança do Tratado do Atlântico Norte (Otan). Além disso, o presidente russo, Vladimir Putin, afirmou que pretendia "desnazificar" o leste ucraniano. 

Na prática, a ocupação parece dar início a uma nova etapa das relações geopolíticas internacionais. Além disso, movimentos populares e de esquerda pelo mundo apontam para a responsabilidade dos Estados Unidos e Otan no conflito, perspectiva pouco abordada pelo discurso predominante na mídia comercial. 

Para falar sobre o tema, o Caminhos para o Mundo convidou Brian Becker, fundador do Partido pelo Socialismo e Libertação (PSL) dos EUA, e apresentador do podcast de notícias The Socialist Program with Brian Becker

Pacifista de longa data, Becker foi articulador de mobilizações de massa antiguerra em Washington na última década, como diretor da ANSWER Coalition (Act Now to Stop War & End Racism), um grupo de protesto composto por diversas organizações antiguerra e de direitos civis dos Estados Unidos que foi criado três dias após os ataques do 11 de setembro de 2001.

“Um de cada dois estadunidenses, neste que é o país mais rico do mundo, vive na pobreza ou próximo a ela. Nós temos que ser capazes – e estamos tentando – de nos organizarmos aqui para dizer que a política externa dos EUA e a política de guerra estadunidense são as políticas das mesmas classes capitalistas e dos banqueiros, a classe bilionária, que está nos oprimindo aqui, em nosso país. E ao invés de ser roubado, atropelado e afogado na histeria de guerra gerada por nossos próprios opressores, temos que expor que a guerra é algo dos ricos. A guerra é realizada para que haja despesas, lucros e dominação dos trabalhadores”, afirma o ativista.

Confira a entrevista na íntegra:

Brasil de Fato: A imprensa comercial costuma apontar a Rússia como única culpada pela guerra na Ucrânia. Porém, diversos analistas vêm expondo, nos últimos tempos, a responsabilidade dos Estados Unidos e da Otan no aumento das tensões entre os dois países. Qual o papel histórico dos EUA e da Otan nessa guerra? 

Brian Becker: Está é a pergunta mais importante, porque todos nós que nos preocupamos com a paz e que queremos acabar com a guerra – nossa exigência mais urgente – precisamos entender como ela começou, o que a causa, quais são as várias dimensões da guerra, pois a menos que você entenda o que causou a invasão russa, você não será capaz de entender realmente qual o caminho para a paz na Ucrânia. Porque a invasão russa, em 24 de fevereiro, não foi simplesmente uma ação espontânea. Não foi como se o governo russo tivesse acordado um dia e dito “Ei, vamos invadir Ucrânia! Vamos começar uma grande guerra na nossa fronteira”. Não, isso não foi o que aconteceu.

Para podermos entender porque a Rússia tomou essa medida extrema que o governo russo sabia com toda certeza que traria sanções muito duras, traria a tentativa e vigente implementação de um plano para expulsar a Rússia da economia mundial, para isolar a Rússia – em outras palavras, uma decisão que terá consequências muito abrangentes para a Rússia e os russos –  o fato óbvio é que o governo russo estava preocupado que a menos que a Ucrânia continuasse fora da Otan, a Rússia enfrentaria uma ameaça existencial que não teria fim. Pois para que a Ucrânia integre a Otan, significa que um país – Ucrânia – que compartilha uma fronteira de 1,2 mil milhas de extensão [1.930 km] com a Rússia seria o palco para posicionamento de avançados mísseis estadunidenses convencionais e nucleares ao longo de toda a fronteira russa. A Rússia disse que esta é uma linha vermelha inaceitável e insistiu que o Ocidente, e particularmente os EUA, deem a ela a garantia de que a Ucrânia não se tornaria palco para estes tipos de operações militares. Isso é o que significa neutralidade do ponto de vista da Rússia.

Isto está também dentro do contexto de três eventos muito importantes: um, em fevereiro de 2014, um golpe de Estado ocorreu na Ucrânia depondo o governo democraticamente reeleito de Viktor Yanukóvych. Isso foi em 22 de fevereiro de 2014. Milícias armadas invadiram o Parlamento, dissolveram o governo e tentaram matar o presidente. Ele saiu do país para salvar sua vida. E quando isso aconteceu, autoridades estadunidenses, tanto do Partido Democrata quanto do Partido Republicano, inclusive membros do Departamento de Estado – Victoria Nuland em particular – disseram “Este foi um grande dia para a democracia ucraniana. Esta foi uma maravilhosa abertura de um novo capítulo”. E o novo governo imediatamente anunciou que queria levar a Ucrânia para dentro da Otan.

O segundo evento foi em 2018, quando os Estados Unidos anunciaram uma nova doutrina militar que substituiu a doutrina militar que fora estabelecida após os atentados do 11 de Setembro de 2001. E a nova doutrina militar afirmou que a Guerra ao Terror, que havia sido a doutrina militar usada pelos EUA, não era mais a doutrina corrente. A nova doutrina estava sendo elaborada para preparar os EUA para grandes conflitos de poder, o que significa preparar-se para uma guerra com a Rússia ou China. E então o terceiro evento ocorreu em 2019: os Estados Unidos cancelaram unilateralmente o Tratado de Forças Nucleares de Alcance Intermediário, que baniu o posicionamento de mísseis tanto nas fronteiras dos EUA quanto nas fronteiras da Rússia, mísseis que demoram de 6 a 7 minutos até o alvo, com alcance 3 mil milhas [4,8 mil km] a 6 mil milhas [9,6 mil km]. Esses mísseis foram posicionados contra a União Soviética na Europa em 1981. Houve um grande movimento antibélico, antinuclear na Europa daqueles tempos. Em 1986, Ronald Reagan assinou um acordo, o Tratado de Forças Nucleares de Alcance Intermediário (Tratado INF), para banir estes tipos de mísseis em 1986. E em 2019, Donald Trump e o Pentágono anunciaram a revogação desse acordo.

Então, a Ucrânia anuncia em 2014 que tem a intenção de se tornar parte da Otan. Em 2018, os EUA anunciam que se prepararão para uma guerra com a Rússia ou a China. Em 2019, [ocorre] o cancelamento do Tratado INF. A Rússia disse em dezembro de 2021, apenas cinco meses atrás, “Não deixaremos isso acontecer. Não nos tornaremos tão vulneráveis e falamos a sério. Estas são linhas vermelhas. E para mostrar que falamos sério, estamos enviando 150 mil russos soldados na Rússia e Belarus, circundando as porções leste e norte da Ucrânia e exigindo negociações com os Estados Unidos". Para as quais os Estados Unidos disseram que as exigências russas são “não são um começo”, o que significa que os Estados Unidos não negociarão de forma alguma. Durante esses mesmos meses, gastaram vários bilhões de dólares em armas para a Ucrânia.

Após a  dissolução da União Soviética em 1991, quais foram as mudanças na política externa dos EUA, e como isso se relaciona com o imperialismo como conhecemos hoje? 

Bem, durante todo o período que vai de 1945 a 1991, quando a União Soviética colapsa, havia no mundo o que pode ser chamado de “poder bipolar”, o que significa que os EUA e os principais países capitalistas constituíam um mesmo campo, um único poder, e do outro lado estava a União Soviética e o campo socialista. Antes da Segunda Guerra Mundial acabar, a União Soviética era o único governo socialista. Após a Segunda Guerra Mundial, havia a União Soviética, a República Popular da China, Vietnã do Norte, Coreia do Norte e então os países do leste europeu e da Europa Central [Polônia, Bulgária, Romênia, Tchecoslováquia, Albânia e Alemanha Oriental].

Esses países estavam alinhados com a União Soviética, então você tinha dois poderes, e isso criou certo equilíbrio na situação mundial. E o Terceiro Mundo basicamente se beneficiou dessa bipolaridade, porque se os Estados Unidos impusessem sanções ou tentassem isolar um país do Terceiro Mundo ou, por exemplo, Cuba, ela poderia contar com o campo socialista. E ao invés de ser isolada e embargada, esmagada, eles [países] poderiam ir com outra potência mundial que não era simplesmente uma potência militar, mas que era um bloco econômico integrado.

E então a União Soviética colapsou e, com ela, o campo socialista, tendo início uma era de unipolaridade. Foi nesta época que os Estados Unidos mudaram toda a sua orientação e decidiram adotar um programa que foi delineado a partir de algo chamado de “o Papel Branco”, divulgado pelo The New York Times em 1991 e 1992, escrito por Paul Wolfowitz, que mais tarde se tornou uma figura importante na administração de George W. Bush. E essa nova doutrina essencialmente esboça que os Estados Unidos usariam seu poder unipolar em sua gigantesca capacidade militar para evitar que qualquer rival conseguisse emergir novamente, o que seria um xeque-mate no poder unipolar dos Estados Unidos.

Então os Estados Unidos iniciam ataques por todo o mundo. Ataque ao Iraque, invade o Afeganistão, destrói a Líbia, tenta destruir Síria. Todos os governos anticoloniais... todos os governos que devem suas existências à fase anticolonial após a Segunda Guerra Mundial na qual nações oprimidas lutaram por libertação nacional e que se voltaram para o campo socialista – ainda que elas mesmas não fossem socialistas – e puderam conseguir auxílio, assistência financeira, apoio diplomático e militar. Então os Estados Unidos decidiram destruir todos esses governos pós-coloniais porque podiam, porque não havia qualquer outro poder para desafiá-los.


Soldados ucranianos supervisionam armamento estadunidense em Kiev; os EUA concentram 39% do orçamento militar global, segundo dados do SIPRI de 2021 / AFP

Por que a escolha da Otan pelo confronto, e não por uma parceria pacífica com a Rússia?

A política ridícula e irracional da Otan de se expandir infinitamente em direção à Rússia só pode ser explicada com base de [que] os países europeus membros da Otan não são quem de fato possuem o poder na Organização, pois eles não quiseram ter relações tensas com a Rússia. Bem, a Rússia é parte da Eurásia, ela é vizinha da Europa. Os países europeus querem ter boas relações com a Rússia e se beneficiar de laços econômicos com aquele país, especialmente quanto à energia, petróleo e gás natural, dos quais a Rússia possui grandes quantidades.

Mas os Estados Unidos não querem que a Europa se torne independente. Não querem que a Europa se torne independente de modo que potências europeias, particularmente a Alemanha, gravitem em direção a ter relações próximas com a Rússia. Porque, dessa maneira, não somente os EUA não seriam a única potência mundial, como também [ruiria] a frente unida dos EUA pós-Segunda Guerra Mundial na qual todos os países capitalistas da Europa mais o Japão estavam, basicamente, sob controle estadunidense, funcionando como nada mais que “sócios juniores” dos EUA.

E a Rússia, por sua vez, finalmente responde militarmente em 24 de fevereiro, e os Estados Unidos dizem: “Vejam, a Rússia é o agressor. A Rússia é bárbara, está violando os direitos humanos, ameaçando a segurança europeia". Com base nisso, os EUA juntam todos os países europeus que estão sob seu apoio. Portanto, hoje a Alemanha e a França, que eram céticas sobre a expansão da Otan, agora estão totalmente do lado dos EUA contra a Rússia. A Finlândia, que era neutra e faz fronteira exatamente com a Rússia, [estando] apenas há alguns minutos de distância de São Petersburgo, a Finlândia agora diz que quer entrar para a Otan. A Suíça, que também não integra a Otan, agora diz que vai se juntar à Otan também.

A invasão russa ajudou muito os Estados Unidos em termos de consolidação de seu controle sobre a Europa. E isso nos leva de volta para a questão de por que a União Europeia não está negociando quando os russos estavam dizendo em dezembro, janeiro, fevereiro, disseram durante os últimos cinco meses “Por favor, nos ouçam seriamente: estes são nossos limites. Garantam que a Ucrânia não se torne parte da Otan”.

Por que os Estados Unidos disseram não várias vezes em vez de se reunir com os russos e negociar de maneira sincera? Enviaram mais armas para a Ucrânia como um sinal para a Rússia de que nunca negociaria. Por que os EUA fizeram isso? Porque os Estados Unidos queriam essa guerra. Os Estados Unidos queriam a invasão russa. Eles colocaram a Rússia num beco sem saída. Eu acho que isso foi um erro tático e também um erro da parte russa ter invadido, pois se ao invés de invadir, os russos tivessem continuado a promover a ideia de que eram os Estados Unidos que estavam ameaçando a Europa com um conflito global, isso poderia apartar algumas das populações europeias da propaganda estadunidense, bem como distanciar alguns dos países europeus da orientação política estadunidense.

A política externa soviética era muito clara, seja com Lênin, Stálin, Brejnev e todos os outros até o fim: não siga uma política que permita a todos os imperialistas se unirem contra nós, a União Soviética. Ao invadir a Ucrânia, a Rússia permitiu que os imperialistas se unissem contra ela. Para além da trágica perda de vidas na Ucrânia e a trágica perda de vidas de soldados russos, eu acredito que, pelo menos no curto prazo, isso fortalece a posição dos EUA. 

O combate a grupos neonazistas é central no discurso de Putin na sua defesa da invasão na Ucrânia. A iniciativa de Putin foi a mais apropriada? Suas decisões foram estratégicas no sentido de dar uma resposta à Otan?

Bem, a Rússia disse que tem dois objetivos: desnazificar o país e desmilitarizá-lo. Se estes são os objetivos, os russos não lograram alcançá-los, pois os nazistas, os fascistas, o Batalhão Azov, que são uma importante parte da população, ainda que minoritária, passaram a ser agora os heróis valentes lutando para defender a soberania ucraniana diante de uma agressão, contra uma invasão. Eu acho que a projeção dos fascistas na Ucrânia está crescendo, não diminuindo.

Quanto a se a Ucrânia se desmilitarizará, a resposta é não. A Ucrânia será ainda mais militarizada. E se houver um acordo – ele será alcançado, em algum momento –, mesmo que os russos ganhem e, digamos, a região do Donbas se torne independente ou decida, como fez a Crimeia, se tornar parte da Rússia, o resto da Ucrânia estará completamente sob o controle dos EUA e Otan. E os fascistas serão vistos como heróis corajosos. A operação militar russa, eu acho que ela estava perplexa. Eu acho que a razão pela qual os russos não atacaram simplesmente Donbas, o que poderia ser um argumento com mais legitimidade, porque a população falante de russo tem sido tão atacada e sendo morta. Mas eles vieram do sul, do norte. Houveram milhares de dezenas de milhares de tropas vindas de Belarus, descendo até Kiev, a capital.

Eu acho que o objetivo deles, a sua avaliação de inteligência foi a de que o governo Zelensky cairia. Zelensky poderia acabar fugindo. E de que os partidos ucranianos que se opõem fortemente à administração do Zelensky e à Otan, partidos políticos que são de fato grandes na Ucrânia, incluindo os partidos que foram proibidos, eu acho que o objetivo russo era de que esses partidos ucranianos tomassem o poder na Ucrânia e em Kiev e de que eles declarassem a Ucrânia um país neutro. E então o país teria relações normais e boas com a Rússia e a guerra civil contra os falantes de russo residentes no leste ucraniano acabaria. E esse novo governo ucraniano iria, então, atacar ou desnazificar o país por meio de ataques ao Batalhão Azov.

Mas independentemente, no fim das contas, a Ucrânia, o Ocidente e a região central da Ucrânia serão parte da Otan. Eles vão ser um palco para o posicionamento de armas avançadas. O ceticismo alemão e francês em relação à Otan foi superado, pelo menos por enquanto. Portanto, eu acho que isso foi um cálculo militar. A Ucrânia iria ser derrubada rápido. Porém, quando ela não caiu, eu acho que os russos tiveram que reavaliar, focar novamente. Eu sinto que politicamente isso é muito ruim, bem, eu preciso ser honesto. Essa é a minha avaliação.

Claro, nós não sabemos como isso terminará. A guerra é algo dinâmico. Eu acredito que, com toda a probabilidade, uma vez que os americanos querem a guerra e querem que ela continue, e os russos estão determinados a não perder, eu acho que o provável é que a guerra irá escalar. E penso que para as pessoas de todo o mundo que se importam com a paz, nós deveríamos insistir e exigir de nossos governos que os Estados Unidos retornem à mesa de negociação, atendam às demandas legítimas de segurança da Rússia, não usem a Ucrânia e os ucranianos como peões em tabuleiros geoestratégicos alheios, permitam aos ucranianos viver em paz terminando a guerra. Há um único caminho para a paz e este caminho é o da negociação. O outro caminho é seguir com a escalada da guerra. 

Quais respostas a classe trabalhadora global pode oferecer no sentido de estabelecer a paz mundial? 

Bem, no Manifesto Comunista, Marx e Engels escreveram que “os trabalhadores do mundo deveriam se unir”. Esse é sempre o problema mais difícil, de certa maneira, é como construir solidariedade entre trabalhadores que vêm de diferentes nações, talvez parecendo um pouco diferentes, falando diferente, talvez tendo diferentes religiões. E as elites dessas nações estão perfeitamente felizes em ter nós, da classe trabalhadora, matando trabalhadores de outras nacionalidades. E no final das contas, as elites dizem “Veja, estamos todos nessa juntos. Somos todos estadunidenses, franceses, alemães”.

O conceito de socialismo é separar as pessoas desse tipo de nacionalismo estreito e dizer “Não somos um único povo”. Podemos até ser uma única sociedade, mas nossa sociedade está dividida em classes, entre os muito ricos, elites, corporações e bancos. Nos Estados Unidos, esse sistema que exige que haja apenas uma única potência não é um único poder para os trabalhadores na cidade do Kansas. É um poder unipolar para os bancos estadunidenses, para as próprias empresas multinacionais estadunidenses. E essas corporações olham para o resto do mundo como um lugar a ser explorado e para conseguir lucros enormes. Portanto, você tem trabalhadores estadunidenses no estado do Michigan que escutam “coloque a mão sobre o coração, diga a promessa de fidelidade, seja patriota, saúde a bandeira. Estamos todos nessa juntos”. E então essas mesmas corporações estadunidenses no Michigan dizem “Agradecemos pelo seu trabalho nos últimos 40 anos, mas agora estamos mudando nossa fábrica para o México ou China, ou para qualquer outro lugar no qual possamos pagar aos trabalhadores um décimo do que pagávamos a vocês”. E, de repente, não somos mais todos estadunidenses. Somos apenas classes oprimidas e classes opressoras.

Portanto, a ideia, num mundo complicado, onde estamos sendo constantemente atraídos para um nacionalismo estreito, não quero dizer que o nacionalismo seja o amor pelo país, cultura ou povo, mas um nacionalismo estreito no qual estaríamos saudando e apoiando a agenda  global de nossas elites. Nós temos que nos livrar disso. E a única maneira disso acontecer é ter um movimento social com essa mensagem e com argumentos persuasivos que expliquem a natureza de classe da sociedade e, por conseguinte, a natureza da política externa de cada governo. A política mundial é uma extensão da política doméstica.

Nos Estados Unidos, onde pessoas negras são tão terrivelmente oprimidas e onde foram, no passado, a classe trabalhadora escrava que criou a riqueza da burguesia ou a população imigrante que é superexplorada, ou, ainda, os outros grupos da população, a classe trabalhadora dos EUA. Um de cada dois estadunidenses, neste que é o país mais rico do mundo, vive na pobreza ou próximo a ela. Metade dos estadunidenses, segundo a Poor People’s Campaign. Nós temos que ser capazes – e estamos tentando – de nos organizarmos aqui para dizer que a política externa dos EUA e a política de guerra estadunidense são as políticas das mesmas classes capitalistas e dos banqueiros, a classe bilionária, que está nos oprimindo aqui, em nosso país. E ao invés de ser roubado, atropelado e afogado na histeria de guerra gerado por nossos próprios opressores, temos que expor que a guerra é algo dos ricos.

A guerra é realizada para que haja despesas, lucros e dominação dos trabalhadores. E eu acho que este é um trabalho duro para a esquerda, mas é o trabalho, pois estamos indo em direção a uma crise existencial. Uma catástrofe climática causada pelas mesmas classes que estão no poder, guerras sem fim e que aumentam em número, guerra global, grandes conflitos de poder, este é o segundo. E, claro, a maneira como a tecnologia tem sido levada aos locais de trabalho, com a inteligência artificial, trabalhadores cujas funções foram substituídas por computadores, eles escutam “Agradecemos, mas nós não temos qualquer obrigação com você. Iremos substituí-lo por uma máquina”.

Essas são crises existenciais enfrentadas pela sociedade. A guerra, crise climática e, claro, a raiz capitalista de introdução de novas tecnologias que não nos liberta. Nós queremos novas tecnologias para que os trabalhadores não sejam sobrecarregados, mas sob o capitalismo, todos os produtos são pensados somente para maximizar os lucros do dono. A tecnologia substitui os trabalhadores que são então considerados desnecessários. Portanto, eles enfrentam pobreza extrema ou prisão nos Estados Unidos. Então, essas são as tarefas: construir um movimento consciente e não simplesmente um movimento ativista, mas um movimento consciente de solidariedade internacional.

Onde assistir ao programa

O Caminhos para o Mundo tem duração de 30 minutos e vai ao ar quinzenalmente, às terças-feiras, sempre às 20h, nos canais do Brasil de Fato e da TVT no YouTube.

Na TV aberta, o programa é exibido na TVT, canal 44.1 - sinal digital HD aberto na Grande São Paulo e canal 512 NET HD-ABC. 

Edição: Thales Schmidt