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Bolsonaro não ajudou, mas deverá fazer propaganda de queda de homicidios, dizem especialistas

Estudo do Monitor da Violência mostra que 21 estados do Brasil tiveram redução no número de assassinatos em 2021

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Queda no índice de homicídios ocorreu mesmo com maior introdução de armas no país por conta de decretos e mudanças na legislação promovidas pelo governo Bolsonaro - Arquivo/EBC

O Brasil registrou uma queda nos homicídios, e o número de assassinatos caiu 7% em 2021 na comparação com o ano anterior. Foram 41 mil mortes no ano passado, o menor número registrado desde 2007. Os dados são do Monitor da Violência, criado pelo portal G1 em parceria com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública e o Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (NEV-USP).

diminuição dos assassinatos em 2021 retoma a tendência de queda registrada no país pelo Monitor da Violência desde o balanço de 2018. A diminuição foi interrompida em 2020, ano que teve uma alta de mais de 5%. Com a redução, o número de homicídios volta ao patamar de 2019, quando foram registradas 41,7 mil mortes. Naquele ano, houve a maior queda da série, de 19%.

De acordo com especialistas em segurança pública, o menor número de mortes é motivado por um conjunto de fatores, incluindo: profissionalização do mercado de drogas brasileiro; maior controle e influência dos governos sobre os criminosos; apaziguamento de conflitos entre facções; políticas públicas de segurança e sociais; e redução do número de jovens na população.

Um artigo assinado pelos diretores do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Samira Bueno e Renato Sérgio de Lima, publicado no g1, afirma que o governo de Jair Bolsonaro (PL) pouco contribuiu para esses números e houve um aumento nos repasses para estados e municípios, graças à regra criada no final do governo Michel Temer (MDB). “Ou seja, o governo Bolsonaro deverá fazer propaganda desta nova e positiva realidade como se fosse obra de sua gestão, mas, no limite, a União não inovou e, por muitas vezes, atrapalhou a segurança pública, incentivando a radicalização política de demandas corporativas como forma de antagonizar policiais e governadores, não colocando os mecanismos de avaliação do SUSP em vigor ou desmontando os mecanismos de controle e rastreabilidade de armas de fogo”, diz o texto.

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Queda nos homicídios

O último trimestre de 2021 aponta para uma tendência de queda ainda maior do que nos meses anteriores. A redução dos assassinatos entre outubro e dezembro do ano passado foi de 14,1% em comparação com o mesmo período de 2020.

Os dados mostram que em 21 estados do país houve a redução de assassinatos no ano passado. Embora a maior queda foi registrada no Acre, de 38%, outros estados tiveram aumento de mortes violentas – sendo que quatro deles estão na região Norte: Amapá, Amazonas, Roraima e Rondônia. Inclusive, a maior alta foi registrada no estado anazonense, com aumento de 54% nos casos de homicídio – o número passou de 1.019 para 1.571.

Ainda segundo o texto dos especialistas do fórum, o aumento de vítimas no Amazonas é motivo pelo avanço da criminalidade e também do desmatamento deliberado na região. “O estado vive uma sobreposição de crises no campo da segurança pública: por um lado, após um período de relativa estabilidade com o aparente monopólio do Comando Vermelho na região de Manaus. Por outro, o crescimento dos homicídios nas regiões em que avança o desmatamento indicam a profusão de conflitos fundiários e crimes ambientais que tem tomado a região”, afirmam.

Eles explicam que a violência da região Norte, onde está localizada a maioria dos estados da Amazônia Legal, apresenta um crescimento acentuado da violência nas áreas rurais e de floresta, que parece associado às dinâmicas que sobrepõem crimes ambientais e criminalidade organizada. “A Amazônia está em chamas e sob julgo da violência e da criminalidade. Esse fenômeno aponta para a importância de conflitos agrários e crimes ambientais, que coexistem e se imbricam no território com as dinâmicas das facções criminosas e da pistolagem. Assim, é preciso investir no fortalecimento de mecanismos integrados de comando e controle, que conectem esferas federal e estadual e, em especial, diferentes órgãos e Poderes (Polícias, MP, Defensorias, IBAMA, ICMBio, Judiciário, entre outros”, defendem os especialistas.

Controle de armas

Os pesquisadores destacam que a queda no índice de homicídios pode acontecer mesmo com a maior introdução de armas no país por conta dos decretos e mudanças na legislação promovidas pelo governo Bolsonaro. Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública publicado no ano passado, o Brasil dobrou o número de armas nas mãos de civis em apenas três anos.

O jornalista e pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência da USP, Bruno Paes Manso, explica que essa facilitação no acesso à arma não interfere na dinâmica do crime organizado, apenas nos crimes ocasionais. “As armas e munições legais e ilegais – que são desviadas e ingressam no mercado do crime – não causam, isoladamente, variações nas taxas. Elas tendem a aumentar os homicídios circunstanciais, em bares, boates e no trânsito, por exemplo, e os femininídios. Mas não afetam necessariamente as dinâmicas criminais nos estados”, explicou, também, ao G1.

Samira e Renato Sérgio argumentam que diferentes estudos científicos demonstram o papel do controle de armas na desaceleração da violência no Brasil. Eles citam como exemplo o Estatuto do Desarmamento, criado em 2003, que foi responsável por poupar 135 mil vidas, entre 2004 e 2014. “É um legado importante para a compreensão do cenário aqui analisado, e que está em risco em função das medidas recentes de flexibilização do controle de armas por parte do governo federal. Com a facilitação para aquisição de armas e munições, facilita-se o desvio de armas legais para as mãos de criminosos, prejudica-se a capacidade investigativa das forças policiais e aumenta-se o risco de conflitos, muitas vezes banais, tornarem-se tragédias, como brigas de trânsito”, acrescentam.