Justiça

LGBTfobia não é "opinião": saiba como denunciar esse tipo de crime

Preconceito em razão de orientação sexual e identidade de gênero leva a até 5 anos de prisão

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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Maurício Souza não é mais jogador da seleção brasileira de vôlei - Foto: Reprodução/Instagram

“Liberdade de expressão” ou “opinião”. É assim que quase sempre declarações e atitudes LGBTfóbicas são justificadas por seus autores – principalmente quando são cobrados e acusados publicamente.

O caso mais recente é o do jogador de vôlei Maurício Souza, que há duas semanas fez uma postagem preconceituosa no Instagram a respeito da bissexualidade de um personagem de história em quadrinhos, o filho do Super-Homem.

Após pressão de patrocinadores do Minas Tênis Clube, do qual era contratado, Souza chegou a pedir desculpas na internet, mas voltou a usar uma posição homofóbica, dizendo que defende aquilo que acredita. Não foi o suficiente, e ele foi demitido na última quarta-feira (27).

A situação, além de trazer à tona mais um caso de preconceito, também desperta discussão sobre as circunstâncias em que comentários como o de Maurício Souza podem ser considerados crime, conforme prevê o STF (Superior Tribunal Federal). Em 2019, a Corte equiparou atos de discriminação em razão de orientação sexual ou identidade de gênero, ao crime de racismo.

Criminalização

Diferentemente de injúria racial, que é uma ofensa individualizada e atinge a honra de uma determinada pessoa, o racismo – e, por extensão, a LGBTfobia –  se caracteriza por ser uma conduta que agride toda uma coletividade.

São discursos que pregam a inferioridade, segregação ou eliminação de determinados grupos e que não são protegidos pelo direito à livre expressão de opinião e pensamento, garantido pela Constituição Federal.

Assim, é crime praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito, seja em razão de raça, cor, etnia, orientação sexual ou identidade de gênero. Dizer que LGBTs são um perigo para a sociedade e que não devem ter espaço na mídia ou produções culturais, é um exemplo de conduta punível. A pena é de 1 a 5 anos de prisão.

Denúncia

Se você foi vítima ou tomou conhecimento de um crime de LGBTfobia, o primeiro passo é procurar as autoridades responsáveis para registrar o caso. Se a denúncia não for formalizada, ela nunca será reconhecida nem entrará para as estatísticas oficiais.

Alguns estados possuem delegacias especializadas de combate à discriminação e grupos de promotores dedicados exclusivamente ao tema.

Existem, ainda, canais municipais, estaduais e federais que recebem esse tipo de denúncia. O mais conhecido é o Disque 100, ou Disque Direitos Humanos, mas há inúmeras ouvidorias, conselhos e órgãos de Direitos Humanos locais que realizam função semelhante.

De toda forma, sendo constatada a existência de crime, caberá sempre à Polícia Civil investigar os fatos e ao Ministério Público requerer a condenação dos acusados perante a Justiça.

Punição administrativa

Em alguns estados, leis locais estabelecem punições administrativas para atos de homotransfobia. Isso significa que pessoas e até estabelecimentos comerciais podem ser multados ou ter o alvará de funcionamento caçado por praticar atos de discriminação contra pessoas LGBTI+.

É o caso de São Paulo, que em 2001 aprovou a Lei 10.948, uma das primeiras legislações a punir discriminação em razão de orientação sexual e identidade de gênero. Em duas décadas, foram 168 condenações — 140 advertências e 29 multas, que totalizam cerca de R$ 940 mil –, como mostrou reportagem da Agência Diadorim.

Nesses casos, em geral, são as próprias secretarias estaduais de Justiça que recebem e processam as denúncias, mas o procedimento pode variar de acordo com cada legislação.

Apesar da decisão do Supremo ter mais de dois anos, ainda há um longo caminho pela frente. Uma pesquisa da organização All Out e do Instituto Matizes, apontou 34 barreiras para a efetivação da criminalização da LGBTfobia.

Entre os problemas estão a falta de preparo das polícias, pouca transparência, ausência de padronização de dados e preconceitos ainda firmemente enraizados nas instituições responsáveis por receber e processar denúncias do tipo.

Procure ajuda

Caso você não se sinta seguro ou não saiba como fazer a denúncia, procure um advogado para te orientar ou recorra ao atendimento da Defensoria Pública. Coletivos de ativistas e ONGs dedicadas à promoção dos direitos da população LGBTI+ também possuem ampla experiência no acompanhamento de denúncias e podem apoiá-lo no processo.

Para saber qual o coletivo ou ONG mais próxima de você, busque nos sites da ABGLT (Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos) e da Aliança Nacional LGBT.

A ABGLT também disponibiliza um “Mapa da Cidadania", com as principais legislações e órgãos de defesa da população LGBTI+ em cada estado.

*Paulo Malvezzi é integrante da Diadorim, agência de jornalismo independente, sem fins lucrativos, engajada na promoção dos direitos da população LGBTI+

Edição: Leandro Melito