O relato do trabalhador Jamilton Ferreira de Abril sintetiza o sentimento atual de muitos guarulhenses:
"Desde criança, eu ouvi falar da história da Proguaru, me simpatizei muito com a Proguaru, sou guarulhense, moro em Guarulhos, e lá na minha casa a minha família ama a Proguaru, como eu acredito que grande parte de Guarulhos. A Proguaru saindo é uma tristeza enorme que fica no coração da gente."
Contra a vontade da população, a maior empresa do funcionalismo público de Guarulhos (SP), caminha para ser extinta. Evitar a dissolução, liquidação e extinção da Progresso e Desenvolvimento de Guarulhos S/A - a Proguaru, que emprega quase 5 mil trabalhadores em serviços de limpeza urbana, obras de edificações e de infraestrutura, é uma luta que já dura mais de 10 meses.
Neste período, foram duas greves. A última delas, suspensa na quinta-feira passada (14), após 25 dias de paralisação.
Aprovada na Câmara dos Vereadores, em dezembro de 2020, a Lei 7.879 autorizou o fechamento da empresa. A alegação da Prefeitura, que apresentou a proposta em meio à pandemia, é de que a empresa estaria falindo e causando prejuízos financeiros ao município. A alternativa escolhida pela gestão foi a terceirização dos serviços.
O estudo que baseou a decisão, contratado pela gestão sem licitação, foi questionado pelos grevistas. De acordo com o documento, assinado pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE), os dados sobre receitas da Proguaru teriam sido desconsiderados na auditoria.
O documento foi também base para um pedido de cassação do atual prefeito do município, Gustavo Costa, o Guti, do PSD.
"A argumentação é toda mentirosa, o objetivo é deixar rico quem é mais rico, com os contratos milionários da cidade", aponta Raul Campos Nascimento, que é assistente administrativo e foi eleito para integrar a Comissão de Trabalhadores da Proguaru.
Além de evitar prejuízos aos servidores, a justificativa para a suspensão da última greve, considerada legal pelo Tribunal Regional do Trabalho, está na garantia de um espaço de diálogo direto entre trabalhadores e a Prefeitura.
As estratégias hoje são apontadas pelo movimento apenas para mitigar os efeitos do desmonte, especialmente em relação às demissões. Após duas rodadas de negociações, a gestão municipal ainda está irredutível e não quer voltar atrás na ideia de extinguir a empresa.
"É um impacto muito difícil de descrever. São quase 5 mil famílias. Do que elas vão sobreviver daqui pra frente? Os mais velhos que não estão aposentados, o que serão deles?", lamenta Jamilton, que atua há 3 anos na Proguaru.
Proguaru nas escolas
O ambiente escolar é onde a Proguaru tem a relação mais afetiva com o povo guarulhense. Só na educação, cerca de 2100 trabalhadores da empresa atuam nas escolas e creches do município - como auxiliares de limpeza, de serviços gerais, e agentes de portaria. É quase metade do quadro total de funcionários da empresa pública, cuja média salarial gira em torno de 1200 reais.
Simone Carleto é servidora de carreira e há 20 anos trabalha na Prefeitura, dez como diretora de escola. Ela considera que hoje a relação entre as crianças e os funcionários não é apenas profissional, mas também carrega laços de afeto e reciprocidade.
"Essas pessoas não apenas limpam as escolas e controlam os acessos, muito mais do que isso. Essas pessoas têm envolvimento e contribuem decisivamente para o processo educacional dentro da escola", aponta a profissional.
"Hoje as escolas não são apenas equipamentos educacionais, tem estudos científicos que dão conta disso, que a escola hoje é um grande centro de acolhimento, é onde as pessoas identificam que está presente o setor público em uma comunidade", completa Carleto.
Referendo Popular
A realização de um inédito referendo popular municipal, encaminhado em agosto ao Tribunal Regional Eleitoral (TRE), com quase 15 mil assinaturas da população em apoio à empresa, é uma das últimas alternativas para tentar salvar a Proguaru.
A adesão é mais que o necessário para convocar oficialmente o instrumento democrático. A prefeitura, porém, já recorreu e tenta deslegitimar o processo.
"O prefeito entrou com recurso, dizendo que o referendo deveria passar pelo plenário da Câmara dos vereadores, o que não tem o menor sentido. Se você entra com um referendo para contestar uma decisão da Câmara dos vereadores, como que pode a ter que passar por ela de novo", destaca o representante da Comissão de Trabalhadores.
O processo agora está sob análise no TRE. Se não for acatado o pedido, a comissão de trabalhadores pretende recorrer ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
"A população está apoiando os trabalhadores, o que não é normal. Em geral, grevistas são mal vistos, serviço público por vezes é atacado. No caso da Proguaru, está todo mundo vendo que está errado, que é uma injustiça", finaliza Raul.
Outro lado
O Brasil de Fato insistiu por várias vias, mas não conseguiu contato com o gabinete do prefeito Gustavo Costa para comentar os assuntos levantados nesta reportagem.
Edição: Isa Chedid