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Fim da "lua de mel": Afeganistão faz popularidade de Biden despencar

Presidente dos EUA vê sua aprovação abaixo de 50% pela primeira vez desde que chegou à Casa Branca

Brasil de Fato | Los Angeles (EUA) |
Situação pode respingar no futuro do mandato e na situação dos Democratas no Congresso - Brendan Smialowski / AFP

Para além da fogueira das vaidades, a aprovação pública pode inflamar e ameaçar um governo inteiro. Nos Estados Unidos, a opinião popular costuma ditar o tom do Congresso, com os representantes se colocando mais ou menos favoráveis às pautas da Casa Branca de acordo com a avaliação dos eleitores.

"Quando Bill Clinton experimentou baixa no índice de aprovação do seu governo, em 1994, os democratas perderam uma participação significativa na Câmara e no Senado, e o então presidente confessou que a partir daquele momento foi impossível tomar qualquer decisão grandiosa", explica ao Brasil de Fato George C. Edwards III, professor emérito da Texas A&M University.

É por isso que a queda na satisfação popular com a liderança de Biden preocupa. Pela primeira vez desde que chegou ao posto máximo do Executivo, no final de janeiro, o democrata viu sua taxa de aprovação cair para abaixo dos 50% e estacionar nos atuais 47%.

O sobe e desce na opinião pública é bastante comum, e era esperado que as críticas ao governo surtissem efeito ao final da "lua de mel", como Dan Wood, professor do Departamento de Ciências Políticas da Texas A&M University, chama o período que compreende os meses procedentes das eleições.

"Essa lua de mel dura de três a nove meses e, dentre os presidentes modernos, Joe Biden foi quem curtiu a mais longa lua de mel registrada", afirma o docente.

Ainda segundo Wood, fatores econômicos e o que o pesquisador chama de drama político, como os acontecimentos recentes do Afeganistão, também entram na equação da popularidade.

As cenas de horror, de pessoas caindo de aviões em movimento e de bebês sendo passados sobre muros certamente atingiram Biden. O democrata colocou em prática o plano de seu predecessor, Donald Trump, comunicou a retirada militar do país do Oriente Médio e recebeu uma avalanche de críticas domésticas e internacionais.


Afegãos sentam no topo de uma avião enquanto esperam no Aeroporto Internacional de Kabul, em 16 de agosto de 2021. O rápido avanço do Talibã surpreendeu o Pentágono / Wakil Kohsar / AFP

"O Afeganistão tem um pouco a ver com a queda de aprovação do Joe Biden, mas acho que em algumas semanas os americanos não vão se lembrar disso", analisa Reed Welch, professor de Política Americana na Texas A&M University. "A popularidade de um presidente tem mais a ver com a época da pesquisa e, embora a retirada das tropas dos EUA tenha impactado nessa avaliação, acho que o real problema de Joe Biden é a covid-19, que está afetando a vida dos americanos e, muito provavelmente, continuará afetando por um bom tempo", diz.

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Isso não significa, contudo, que todos os eventos dramáticos derrubam a aprovação de um presidente. Welch relembra o simbólico caso do republicano Gorge H. W. Bush, que viu sua popularidade disparar nos anos 1990 graças a maneira com a qual administrou a primeira Guerra do Golfo. Da mesma maneira, seu filho, George W. Bush, viu sua aprovação, então baixa, subir para mais de 90% pela resposta militar dada aos ataques de 11 de setembro de 2001.

"Esses grandes acontecimentos podem levar um presidente do céu ao inferno ou vice-versa, mas o que ainda não aconteceu foi um presidente com menos de 50% de aprovação se reeleger", continua o professor Wood, "e isso ficou mais uma vez provado na última eleição presidencial, quando Trump, abaixo dessa linha de satisfação, perdeu para Joe Biden."

A expectativa do cientistas políticos é que a aprovação do democrata volte a subir nas próximas pesquisas. "Sabe o que o presidente pode fazer a respeito disso? Mudar a conversa", responde o professor Edwards, "ele quer que as pessoas falem do seu plano para infraestrutura, que discutam a economia e aprovem a proposta histórica de investimento que foi enviada ao Congresso."

Conseguindo ou não virar a página do Afeganistão, é pouco provável que Biden consiga elevar sua taxa de aprovação para muito além dos 55%. "A popularidade do líder é uma foto da nação, e a nossa está dividida", analisa Welch, que finaliza: "da mesma forma como os democratas se colocavam contra qualquer coisa que Trump fizesse e os republicanos o apoiassem, as pessoas já estão com a cabeça feita. Cada um veste a camisa do seu time e assim será — democratas com democratas, republicanos com republicanos."

Não é à toa, portanto, que o penúltimo índice de aprovação de Biden seja de 53%, refletindo uma porcentagem muito semelhante do resultado eleitoral. Em 2020, o democrata assumiu a Casa Branca com 51,3% dos votos, enquanto Trump ficou com 46,9% dos eleitores, uma margem virtualmente idêntica à sua aprovação popular.

Edição: Thales Schmidt