O depoimento do empresário José Ricardo Santana na CPI da Covid até a suspensão da sessão no horário do almoço, nesta quinta-feira (26), foi marcado por uma série de “esquecimentos” e também pelo direito de ficar em silêncio. O depoente, que não prestou compromisso de dizer a verdade, foi convocado por ter participado do jantar em que teria sido feito o pedido de propina na compra de 400 milhões de doses da vacina da AstraZeneca.
Ricardo Santana chegou à CPI da Covid amparado por um habeas corpus concedido pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin, para não dizer nada que pudesse incriminá-lo. A partir disso, a testemunha recorreu à falta de memória quando questionado diversas vezes. Como, por exemplo, em relação a seu salário como funcionário da Anvisa ou de encontros feitos pelo empresário.
:: CPI ouve participante do jantar do pedido de propina de US$ 1 por dose de vacina ::
Quando decidiu responder as perguntas, o depoente foi superficial e não entrou em detalhes. Em outros momentos, usou o direito de ficar em silêncio. O presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM), se revoltou com o andamento da sessão. “A gente precisa manter cautela e sangue frio, mas é dito de maneira descarada que ele não lembra de nada. Não lembra como conheceu as pessoas ou como participou de uma negociação de vacina”, criticou.
Relação com lobista
Logo no começo da sessão, o relator Renan Calheiros (MBD-AL) exibiu um áudio de Ricardo Santana em conversa com o lobista Marconny Albernaz sobre a elaboração de um plano para o Ministério da Saúde. De acordo com o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), as informações colhidas pela CPI da Covid mostram que o empresário conheceu o lobista na casa de Karina Kufa, advogada do presidente Jair Bolsonaro.
:: Randolfe Rodrigues: “Única forma de Bolsonaro não ser preso é ser reeleito” ::
Porém, ao ser questionado sobre sua relação com Marconny e Karina, Ricardo disse “não se recordar das circunstâncias” em que foi apresentado ao lobista e não se lembrou também de quem mais estava na casa da advogada.
Ricardo Santana informou que, ao deixar a Anvisa, foi convidado para fazer parte da equipe do Ministério da Saúde pelo ex-diretor de logística Roberto Ferreira Dias. Ele também disse não se lembrar de como conheceu Dias, nem detalhou sua relação com o ex-diretor, mas afirmou que saiu da agência para trabalhar no Ministério da Saúde sem remuneração.
::Dias indica coronel como testemunha e reforça tese de "acordão" de militares com Centrão::
A senadora Simone Tebet (MDB-MS) insistiu, perguntando quando o depoente havia deixado o Ministério da Saúde, informação importante para estabelecer a cronologia da negociação de imunizantes. Ele afirmou se lembrar apenas da data em que preencheu os formulários para assumir um cargo no ministério, 25 de março.
Para os senadores, deixar um trabalho remunerado para ficar sem salário reforça a tese de que “ele era um lobista dentro do Ministério da Saúde”.
Memória curta de Ricardo Santana
O empresário Ricardo Santana também foi perguntado sobre o jantar em que teria ocorrido o pedido de propina na compra da AstraZeneca. O depoente afirmou não ter presenciado nenhum pedido de vantagem indevida durante jantar realizado, em 25 de fevereiro, em Brasília.
Santana acrescentou que foi um “encontro social” com o então diretor de Logística do Ministério da Saúde Roberto Ferreira Dias, mas chegaram à mesa o cabo Luiz Dominguetti Pereira e o militar Marcelo Blanco. Novamente, ele disse “não lembrar de detalhes” e afirmou que “conversaram sobre amenidades”.
:: BdF Explica | As principais suspeitas que a CPI da Covid levantou até agora ::
A testemunha também foi questionada sobre as viagens à Índia pagas pela Precisa Medicamentos – empresa investigada por irregularidades na compra da Covaxin. Sobre o tema e sua relação com a Precisa, preferiu ficar em silêncio.
Renan perguntou se Ricardo Santana já havia prestado serviços para a Precisa, mas o empresário usou novamente o direito ao silêncio.