De promessa democrata à persona non grata, Andrew Cuomo deixa o cargo de governador de Nova York em meio a escândalos de assédio sexual. Cinco procuradores regionais investigam as acusações feitas por pelo menos onze mulheres que trabalham ou trabalharam com o político e se dizem vítimas de comportamento inadequado.
Embora o caso se arraste há meses, Cuomo comunicou sua renúncia apenas na última terça-feira, 10 de agosto. O comunicado veio depois de o governador afirmar, por inúmeras vezes, que não renunciaria. Sua resistência, contudo, caiu por terra à medida que republicanos e democratas passaram a criticar sua postura e defender seu afastamento.
Colegas de relevo no Partido Democrata defenderam sua saída, como a congressista Alexandria Ocasio-Cortez, a presidente da Câmara dos Representantes, Nancy Pelosi, e o presidente Joe Biden.
"Acho que ele deveria renunciar, mas entendo que a legislatura estadual possa decidir pelo impeachment", respondeu o líder da Casa Branca em entrevista à CNN.
Insistindo em sua inocência, o governador de 63 anos afirmou, em vídeo, que sua decisão de sair do cargo foi tomada pensando no bem coletivo. "Dadas as circunstâncias, a melhor forma de continuar ajudando é deixando o cargo e, portanto, é o que eu faço agora, porque eu trabalho para vocês", disse.
A renúncia de Cuomo entra em vigor em 14 dias, e a vice-governadora, Kathy Hochul, assumirá o cargo e será a primeira mulher a liderar Nova York.
O desenrolar dessa história surpreendeu até os pesquisadores da área. John A. Tures, sociólogo professor da LaGrange College, avalia em entrevista ao Brasil de Fato que Cuomo talvez seja o primeiro político de alto escalão a sofrer consequências por atos de assédio sexual.
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No passado, o então presidente Bill Clinton também foi investigado por seu affair com a então estagiária Monica Lewinski e Donald Trump também foi acusado de assédio sexual. Nenhum dos dois casos resultou em impeachment ou em punição exemplar.
"O comportamento de Cuomo não foi diferente do comportamento de outros tantos políticos, e por isso consigo vê-lo dizendo que ele é um produto de seu tempo, mas acho que não podemos mais aceitar esse tipo de desculpa', analisa Ture.
Para o sociólogo, a recorrência de casos de assédio sexual na política tem a ver também com a má interpretação da origem deste crime. "Algumas mulheres e muitos homens acreditam que isso é uma questão sexual, quase biológica, uma necessidade ou paixão. Na verdade é sobre poder, e esse é um perfeito exemplo do uso inapropriado do poder", explica.
Nas pesquisas sobre o tema, Ture apurou que a incidência desse delito é apartidária. Ou seja, acontece tanto no lado republicano, quanto no lado democrata, e que os escândalos seriam mais numerosos e volumosos se tantas pessoas não tivessem medo ou vergonha de denunciar seus superiores.
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Para evitar novos casos de assédio, o professor da LaGrange College defende que sejam realizados debates sobre comportamentos aceitáveis e não aceitáveis, além de promover a inclusão de mulheres na política.
Qual o futuro de Cuomo?
Por enquanto, ainda não está claro o destino das investigações e da tentativa de impeachment contra Cuomo. Caso a medida seja aprovada, o futuro ex-governador de Nova York pode dar adeus à carreira política, uma vez que seria legalmente proibido de se candidatar a um cargo público.
Divorciado e pai de três meninas, Cuomo é ainda investigado pelo mal uso de recursos públicos e de má gestão de asilos durante a pandemia. O governador de Nova York é acusado de alocar funcionários públicos na produção e promoção de seu livro "American Crisis: Leadership Lessons from the COVID-19 Pandemic", ou "Crise Americana: lições de liderança da pandemia de COVID-19" em tradução livre. O então governador recebeu US$ 5,1 milhões, cerca de R$ 26,6 milhões, da editora Crown Publishing pela obra.
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O FBI e o Ministério Público do Brooklyn estão investigando Cuomo e sua administração pelo manejo de asilos durante a pandemia de coronavírus, uma crise revelada pelo The Washington Post. O jornal revelou uma confissão de uma de suas assessoras em conversa com democratas sobre o acobertamento do número de mortes causadas pela enfermidade em lares de cuidados especiais.
Cuomo pode encerrar sua vida pública como um exemplo — mas não a ser seguido. "Espero que isso provoque uma mudança de ideias, de atitudes e, principalmente, de comportamento", avalia Ture. "Sei que tudo está bagunçado agora, mas eu prevejo uma experiência positiva disso, porque as pessoas vão entender que há consequências para esse tipo de crime até para poderosos como Andrew Cuomo, que muitos acharam que seria o próximo presidente dos Estados Unidos."
Edição: Thales Schmidt