"Nunca fui ao ginecologista porque na minha cidade não tem nenhum médico dessa especialidade”. O relato é da professora Ediele Silva, de 24 anos, que mora em Melgaço, na Ilha do Marajó, no Pará.
O município possui o menor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do Brasil, sendo que aproximadamente 55% da população vive com até meio salário mínimo, ou seja, pouco mais de R$ 500,00 por mês, cerca de R$16,00 por dia.
Essa informação consta no último censo realizado no país, em 2010, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
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As desigualdades que atingem os moradores da ilha do Marajó se agravam com os desafios de infraestrutura e logística, num cenário onde as pessoas vivem em constante privação de direitos.
Para tentar reduzir parte das desigualdades, uma parceria entre o Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) e o Conselho de Secretarias Municipais de Saúde (COSEMS/PA) foi articulada para ofertar consultas por telemedicina às mulheres da região.
Para mim, foi ótimo. Ainda tenho um retorno com ela, me senti muito à vontade
Intitulado "Saúde das Manas", o projeto fornece consultas de ginecologia e obstetrícia. Assim como Edilene, a agente de saúde Regina Lúcia Brandão, de 50 anos, moradora de Afuá, município também do Arquipélago do Marajó, foi beneficiada pelo programa.
Ela sofre de mioma, um tipo de tumor benigno que se forma no útero. No caso de Regina, causava, além de dor, sangramento. Antes de ser atendida por um especialista na consulta por telemedicina, ela foi diagnosticada por um clínico geral.
"Eu já tinha ido ao médico, ele pediu alguns exames e me passou um remédio. No entanto, eu continuava me sentindo mal com incômodo e dores. Eu nem conseguia dormir de preocupação e de dor", lembra.
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Com a pandemia, o caso de Regina se agravou pela dificuldade ainda maior de acesso a um médico. Foi quando ela soube do atendimento virtual e marcou consulta com uma ginecologista.
"Ela me passou alguns exames e um remédio de imediato. Para mim, foi ótimo. Ainda tenho um retorno com ela, me senti muito à vontade".
Na telemedicina, um profissional da saúde acompanha a paciente no consultório e, pela internet, um médico ou médica consegue atender os pacientes, de longe. Além da consulta, são oferecidos exames. As receitas, inclusive, são impressas e entregues ao paciente na hora.
Agora a gente vai conseguir fazer um diagnóstico precoce
Prevenindo o câncer do colo do útero
Segundo o Instituto Nacional do Câncer (Inca), a região Norte é a única onde o câncer uterino é o mais incidente e é a maior causa de morte por câncer entre as mulheres, superando, inclusive, o de mama, que é o maior do país.
Em 2019 foram diagnosticados 657 novos casos de câncer de colo de útero no Pará. Já em 2020, foram registrados 201 casos da doença, índice que deve ser considerado levando em conta a subnotificação causada pela pandemia de covid-19.
Para a médica Luciana Monteiro, uma das especialistas que atendem no projeto, apesar de a iniciativa ainda estar dando os primeiros passos, o fato de ajudar a diagnosticar o câncer mais precocemente é importante para preservar vidas.
"A gente vai conseguir fazer um diagnóstico precoce, porque, às vezes, a paciente colhe o exame preventivo e não tem um resultado levado para um profissional que tenha conhecimento para uma orientação e uma condução adequada do caso. Então, a gente vai conseguir contar o principal problema que é não só o diagnóstico, mas a conduta e o tratamento".
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Os equipamentos (TVs, notebooks e acessórios) foram doados pelo Fundo de População da ONU. Em contrapartida, o Cosems/PA contratou duas médicas e garantiu a internet banda larga para realizar as teleconsultas.
Já a Prefeitura do município tem o papel de fornecer a estrutura das salas de telemedicina, com mesa, cadeiras e profissionais para apoiar a ação.
Além de ginecologia e obstetrícia, também é oferecido o atendimento nas especialidades de cardiologia, neuropediatria, neurologia, endocrinologia, alergologia, psiquiatria, pediatria, urologia, pneumologia, gastroenterologia e dermatologia.
O projeto levará atendimento, por telemedicina, a mais de 80 mil mulheres residentes nos municípios de Santa Cruz do Arari, Afuá, Anajás, Bagre, Breves, Melgaço e Salvaterra.
Edição: Vinícius Segalla e Douglas Matos