Crise em Brasília

CPI e desgaste de Bolsonaro impactam avanço de reformas liberais no Congresso

Investigação sobre corrupção na Saúde empareda governo e altera andamento de reformas tributária e administrativa

Brasília (DF) |
O ministro Luiz Eduardo Ramos, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), o ministro Paulo Guedes e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG) - Luis Macedo / Câmara dos Deputados

O avanço de reformas liberais no Congresso Nacional foi impactado pelo desgaste do governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), intensificado pela crise causada pelas investigações da CPI da Covid no Senado.

As mudanças nas legislações tributária e administrativa eram dadas como certas em fevereiro, quando Arthur Lira (PP-AL) foi eleito presidente da Câmara e Rodrigo Pacheco (DEM-MG) assumiu o comando do Senado.

Os dois tiveram apoio do governo federal durante o pleito e colocaram as reformas como prioridades de seus mandatos à frente das Casas.

O primeiro semestre legislativo com os novos comandantes do Congresso, no entanto, não foi frutífero para o avanço dessas pautas. O recrudescimento da pandemia nos primeiros meses de 2021 e a queda na popularidade de Bolsonaro são apontados por congressistas como os principais motivos para a morosidade na tramitação de projetos do Executivo.

A aprovação do Congresso, em maio, a uma medida provisória (MP) apresentada pelo governo que previa a privatização da Eletrobras (MP 1031/21) foi a única grande vitória do governo no Legislativo durante o semestre.

Mesmo com sinalizações aos partidos que compõem o chamado centrão, como a "mini-reforma" ministerial realizada em março, a má gestão do governo nas políticas de combate à pandemia colocaram Pacheco e Bolsonaro em rota de colisão.

O senador mineiro fez críticas explícitas ao governo e capitaneou a criação de um comitê de enfrentamento à covid-19 com participação de representantes dos Três Poderes, mas resistiu à implantação da CPI – até que foi, em maio, forçado a criá-la por determinação do Supremo Tribunal Federal (STF).

O avanço da CPI e a revelação de supostos casos de corrupção na aquisição de vacinas conta a covid-19 nas últimas semanas abalaram ainda mais o andamento dos projetos.

A reforma eleitoral, que tem especial atenção de Bolsonaro, chegou a avançar na Câmara com relativo apoio de líderes partidários nos primeiros meses do semestre. A proposta, porém, também não deve prosperar após acordo de siglas para esvaziamento da tramitação determinado nesta semana.

As denúncias feitas pelo deputado federal Luis Miranda (DEM-DF) e de seu irmão, o servidor concursado do Ministério da Saúde, Luis Ricardo Miranda, sobre um caso de corrupção na compra da vacina indiana Covaxin é simbólico sobre os estragos feitos pelo avanço da CPI nas pautas do governo.

O congressista, aliado de Bolsonaro durante todo o mandato, seria o relator da reforma tributária no Congresso, com anuência de Lira. O rompimento de Miranda com o governo, no entanto, já o fez ser retirado do posto. O fato foi alvo de reclamação do deputado durante seu depoimento à CPI da Covid.

Pela falta de apoio da maioria dos deputados, o projeto foi fatiado pelo Ministério da Economia a pedido de Lira. No momento, o governo foca na reformulação das regras do Imposto de Renda.

Um dos textos foi encaminhado a Lira na última sexta-feira (25). O projeto aumenta a faixa de isenção do IR para pessoas físicas e estabelece a taxação de lucros e dividendos de empresas.

A apresentação do texto na Câmara, com a presença de Guedes e dos ministros Luiz Eduardo Ramos (Casa Civil) e Flávia Arruda (Secretaria de Governo), foi ofuscada pelo depoimento de Miranda à CPI, que transcorria exatamente no mesmo momento.


Comitiva do governo federal visita a Câmara na sexta-feira (25/6) para entrega de fatia da reforma tributária; no mesmo momento, Miranda depunha à CPI da Pandemia / Pablo Valadares/Agência Brasil

Na sessão, uma das mais conturbadas desde o início da comissão, Miranda disse ter mudado de opinião em relação à reforma administrativa. Antes favorável à proposta, ele afirmou que o papel do irmão concursado na fiscalização das contas públicas o fez compreender a importância da estabilidade no serviço público.

“Depois do que fizeram com o meu irmão, queria dizer para todos os servidores públicos, principalmente aqui do Distrito Federal, que se sintam abraçados porque, a partir de agora, sou contra a reforma administrativa", declarou.

"Se não fosse a estabilidade meu irmão não estaria aqui sentado, com a coragem que ele tem, de denunciar isso tudo que está ocorrendo. A estabilidade, para o funcionário público, é a garantia de que eles não podem ser coagidos como o ministro Onyx Lorenzoni tentou fazer”.

O caso será utilizado pelos deputados da oposição e por representantes sindicais como argumento para rejeição do projeto. Nessa quinta-feira (1º), o deputado Arthur Maia (DEM-BA), relator da reforma administrativa na comissão especial da Câmara, disse que, antes de o plenário avaliar o texto, a Casa deve votar o projeto que acaba com os supersalários do funcionalismo.

Edição: Leandro Melito