A Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) repudiou, em nota divulgada nesta terça-feira (8), a tese do chamado “marco temporal”, que coloca em xeque o reconhecimento de territórios indígenas ocupados antes da Constituição Federal de 1988.
O tema chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF) nos últimos anos e tem julgamento marcado para iniciar na próxima sexta (11) no plenário virtual da Corte.
A ANPR aponta que a ideia de um marco temporal restringe e afeta a “efetivação plena dos direitos territoriais indígenas”. A tese é defendida por ruralistas e segmentos interessados em avançar sobre áreas tradicionais, como garimpeiros ilegais, madeireiros e outros grupos.
“O texto constitucional não estabeleceu qualquer marco temporal para o reconhecimento desses direitos. Além disso, não há sentido em prever uma limitação do gênero, dado o histórico de deslocamentos forçados, remoções e violências a que estiveram submetidos os povos indígenas”, argumenta a entidade, em nota.
Os procuradores lembram ainda que, até o ano de 1988, os indígenas eram tratados juridicamente como “inferiores, sendo fadados ao desaparecimento, incapazes do ponto de vista civil e sujeitos ao regime tutelar pela Fundação Nacional do Índio (Funai)”.
O documento também destaca que a Constituição traz “diretriz clara” para a materialização dos direitos dessa população ao “aprofundar previsões contidas em constituições anteriores”.
A nota cita o artigo 231 da atual Carta Magna, que registra o “caráter originário dos direitos territoriais”, e lembra que o reconhecimento dessas garantias não depende da efetivação dos processos administrativos de demarcação.
“A Assembleia Constituinte e a mobilização dos povos indígenas contribuíram para a formulação da norma constitucional, por meio da qual o Estado brasileiro se compromete a acertar contas com uma dívida histórica com os povos originários", destaca o texto.
"Identidades que estavam sufocadas puderam finalmente afirmar-se e reivindicar seus territórios, denunciando os esbulhos que sofreram ao longo dos tempos.”
Judiciário
Os procuradores destacam ainda que a tese do marco temporal já foi reprovada pelo Supremo quando os ministros avaliaram o Caso Raposa Terra do Sol, em 2009, e conflita com entendimentos históricos do STF sobre terras indígenas.
Por fim, a ANPR pontua que a referida tese não tem amparo em normas de referência internacional, como a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas e a Declaração Americana sobre os Direitos dos Povos Indígenas.
Edição: Leandro Melito