Aguardado pela população mais vulnerável desde o início do ano, o auxílio emergencial ainda deve demorar dias ou semanas para chegar ao bolso dos trabalhadores que amargam os prejuízos da crise sanitária e econômica.
Após receber aval final do Senado nesta quinta (4), o texto da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 186, conhecida como PEC Emergencial, precisa ser analisado pela Câmara dos Deputados, que agendou a discussão da pauta para a próxima terça-feira (9) e a votação para quarta (10).
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Em caso de alterações na Câmara dos Deputados, a proposta precisa retornar ao Senado para nova avaliação, sendo promulgada somente na sequência, mas a via crucis dos que aguardam ansiosamente pelo auxílio não termina nesse ponto.
O governo Bolsonaro diz projetar o pagamento do dinheiro para este mês de março, mas ainda não há data específica para que se possa sacar a primeira parcela, pois o calendário também será definido por meio de uma Medida Provisória (MP). Esse último texto será o dispositivo que irá definir os valores, a quantidade de parcelas e a abrangência do benefício.
Governo cria embaraços
A leitura de diferentes organizações civis é de que o governo cria embaraços para atrasar o percurso político que precede o pagamento do benefício.
O presidente da Rede Brasileira de Renda Básica, Leandro Ferreira, afirma que a gestão não precisaria se utilizar de uma PEC para liberar o benefício. “A solução encontrada pra pagar o auxílio que está na PEC é a de abertura de créditos extraordinários, e isso poderia ser feito independentemente de uma PEC neste momento, realça Ferreira.
Diferentes atores políticos e sociais apontam que a gestão Bolsonaro poderia ter assinado uma MP diretamente para tratar do tema. Competência privativa de presidente da República, a edição de medidas provisórias é prevista constitucionalmente para situações de relevância e urgência.
“O que eles procuraram fazer, e isso está claro, é introduzir [no texto da PEC 186] dispositivos que estão mais alinhados ao desejo do campo liberal no que se refere a gastos e despesas do Estado”, atribui Ferreira, ao lembrar as medidas de ajuste fiscal que acompanham a concessão do auxílio prevista na PEC 186.
A declaração do dirigente é uma referência ao conjunto de cortes previstos pelo governo Bolsonaro para a máquina pública como condição para o benefício. Mas as críticas das organizações civis não encerram por aí. O segmento também se queixa da proposta lançada pela gestão, que prevê quatro parcelas de R$ 250 entre os meses de março de junho.
Elisa de Araújo, da ONG Conectas Direitos Humanos, uma das entidades da campanha “Renda Básica que Queremos”, sublinha que a ideia está aquém das necessidades da população.
“A gente avalia como tenebroso isso que o governo se propõe a fazer de uma rodada do auxílio com R$ 250 por quatro meses. Duzentos e cinquenta reais hoje não pagam nem metade do valor da cesta básica, que, pelo Brasil, está entre R$ 450 e R$ 650".
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Uma pesquisa Datafolha publicada em agosto de 2020 mostrou, por exemplo, que 53% dos recursos do auxílio de R$ 600 pago no período foram utilizados pelos trabalhadores para a aquisição de gêneros alimentícios.
O levantamento considerou beneficiários que receberam ao menos uma parcela. O público pesquisado também utilizou o dinheiro para pagamento de contas (25%), despesas domésticas (16%) e remédios (1%), entre outros itens.
Sobre a amplitude do benefício, por exemplo, o ministro da Economia, Paulo Guedes, tem dito que pretende atender um número menor que o alcançado no ano passado. Enquanto em 2020 foram 68 milhões de beneficiários, agora o limite considerado seria de 40 milhões de pessoas.
Organizações sociais criticam a redução e também o período de quatro meses apontado pelo governo para esta segunda rodada do auxílio. Em 2020, as parcelas começaram no primeiro semestre e foram liberadas até dezembro, sendo reduzidas a R$ 300 na metade do caminho.
A argumentação da gestão é de que não seria financeiramente possível abrir o caixa do Estado para novas parcelas sem desidratar outros segmentos.
A diminuição gerou ampla reação no ano passado e segue preocupando os especialistas em 2021. Cálculos da ONG Ação da Cidadania apontam, por exemplo, que o contingente de pessoas acometidas pela insegurança alimentar no país é de cerca de 10,3 milhões, dado considerado relevante para se medir a necessidade dessa população diante da crise socioeconômica.
“A ausência do auxílio coloca muita gente na fome. Sabemos que em quatro meses a população não vai estar vacinada. Só iremos sair da crise aguda, tanto sanitária quanto econômica, quando se tiver pelo menos 70% da população vacinados. Em quatro meses, na melhor das hipóteses, a gente vai ter vacinado apenas os grupos prioritários”, argumenta Elisa de Araújo.
Edição: Poliana Dallabrida