A 180ª Assembleia Geral Extraordinária da Eletrobras, marcada para esta quinta-feira (28), pode significar um passo decisivo para a privatização da empresa. Na ocasião, acionistas votarão uma proposta de mudança de estatuto que, segundo entidades de trabalhadores do setor elétrico, abre um atalho para a desestatização sem o aval do Congresso Nacional.
A Eletrobras é uma empresa de economia mista, com controle acionário do governo federal. A tentativa de privatização começou ainda durante o governo Michel Temer (MDB), entre 2016 e 2018. Com Jair Bolsonaro (sem partido), tornou-se uma das peças-chave do programa de desestatizações capitaneado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes.
Se aprovadas pelos acionistas, as mudanças no estatuto social desobrigam a estatal a manter o Centro de Pesquisas de Energia Elétrica (Cepel), maior centro de pesquisas de energia elétrica da América Latina, e programas de universalização do acesso à energia, como o Luz Para Todos, e de eficiência energética, como o Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica (Procel).
Não há nenhuma menção à universalização e ao Cepel no novo estatuto, que “trata a empresa como se já fosse privada”, segundo carta-manifesto assinada em 18 de janeiro pelo Sindicato dos Trabalhadores nas Empresas de Energia do Rio de janeiro e Região (Sintergia), pela Associação dos Empregados do Cepel (ASEC) e pelo Sindicato dos Engenheiros no Estado do Rio de Janeiro (Senge-RJ), com apoio da Associação dos Empregados da Eletrobras (AEEL).
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O desmonte da Eletrobras precede a entrega à iniciativa privada e vem ocorrendo a passos largos em 2020. No primeiro semestre, estão previstas 300 demissões no sistema elétrico brasileiro. A maioria delas ocorre na Eletronorte, que já desligou 213 trabalhadores entre 1º e 19 de janeiro.
No último dia 22, o Coletivo Nacional dos Eletricitários (CNE) também se posicionou sobre o novo estatuto, por meio de carta aos parlamentares brasileiros, para tentar barrar a mudança. O texto ressalta, especificamente, a importância do Cepel e da pesquisa científica no setor para evitar apagões e aprimorar o sistema.
A carta ressalta que a mudança do estatuto violaria até o projeto de lei da privatização da Eletrobras de 2019, que prevê a manutenção do Cepel por quatro anos após a desestatização.
O Cepel é uma associação civil sem fins lucrativos financiada pela Eletrobras para investir em pesquisa e desenvolvimento em energia elétrica. O texto do novo estatuto estabelece que, se o governo determinar investimentos nessas áreas, a empresa deverá ser ressarcida pela União.
A convocação da assembleia para mudança do estatuto foi feita em 18 de dezembro pelo então presidente do Conselho de Administração da Eletrobras, José Guimarães Monforte, que entregou o cargo três dias depois por “motivos pessoais”. Movimento idêntico foi realizado pelo então presidente da estatal, Wilson Ferreira Junior, na última segunda-feira (25).
As renúncias vêm sendo interpretadas como reflexo da dificuldade de encaminhar a privatização com a agilidade esperada pela equipe econômica. O novo presidente do Conselho, Ruy Flaks Schneider, assim como seu antecessor, foi nomeado pelo governo e é favorável à venda da estatal.
Ferreira Junior continuará à frente da empresa até o dia 5 de março. O sucessor ainda não foi definido. Nos bastidores, especula-se que um dos motivos da renúncia dele foi a confirmação do apoio de Bolsonaro a Rodrigo Pacheco (DEM-MG) como candidato a presidente do Senado. Pacheco não considera a privatização da Eletrobras uma prioridade.
Edição: Leandro Melito