Inscrições abertas

Maranhão investe R$ 114 milhões em auxílio e fomento cultural em meio à pandemia

Inscrições para editais começam nesta segunda (21) no estado, um dos primeiros a receber repasses da Lei Aldir Blanc

Brasil de Fato | Imperatriz (MA) |

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Editais contemplam artistas, artesãos e escritores, além de fomentarem produções culturais e audiovisuais. - Divulgação

O boi não percorreu as ruas do Maranhão. Sem aquecimento de tambores, sem cores e magia, os artistas maranhenses se recolheram em isolamento contra a covid-19.

Após meses de discussões para a criação e aplicação dos recursos de uma lei federal que contemplasse o setor cultural, o Maranhão foi um dos primeiros estados a receber os repasses da Lei Aldir Blanc, por ter cumprido todos os prazos do processo. Ao todo, o governo Flávio Dino (PCdoB) investirá R$ 114 milhões na área cultural. Desse total, R$ 61 milhões serão geridos pelo estado e R$ 53 milhões para execução nos municípios.

No estado, os recursos serão aplicados de duas maneiras: uma diretamente aos artistas, na mesma modalidade do auxílio emergencial, e outra, por meio de seis opções de editais de fomento cultural já lançados, com inscrições a partir desta segunda-feira (21).

“É um valor substancial, aplicado em forma de auxílio emergencial, no caso do estado, para as pessoas físicas que deixaram de trabalhar. Trabalhadores da cultura podem receber R$ 600 em três parcelas, desde que sejam elegíveis. São critérios de renda, para quem não tem emprego formal e não recebeu o auxílio emergencial do governo federal”, explica o Secretário de Estado de Cultura, Anderson Lindoso.

Artistas e profissionais da área que já recebem o auxílio emergencial do governo federal podem concorrer a fomentos culturais por meio de editais, com valores que variam de R$ 1.500 a R$ 100 mil.

Renda básica

O repasse de R$ 600, semelhante ao programa do governo federal, foi chamado de Renda Básica e contempla artistas, contadores de histórias, produtores, técnicos, curadores, oficineiros e professores de escolas de arte e capoeira, sem emprego formal, que comprovaram atuação na área nos últimos dois anos e que não receberam o auxílio emergencial. 

Além dos dados pessoais, é necessário comprovar atuação no segmento cultural. Para isso, um dos requisitos é informar o segmento e a função de atuação cultural, acompanhados de um breve histórico. Para aqueles que não consigam comprovar a atuação, é possível optar pela autodeclaração, imprimindo um formulário específico para a opção e anexando à plataforma.  

Editais

Os editais de fomento cultural, destinados a pessoas físicas e jurídicas, oferecem recursos para artesãos, produtores literários e produtores culturais de diversas áreas, por meio da aquisição de bens e serviços vinculados ao setor. Para estes, os valores variam entre R$ 1.500,00 e R$ 100 mil. Os editais estão disponíveis na página da Lei Aldir Blanc, vinculada à Secretaria de Estado da Cultura.

Um dos destaques é a parceria com a Secretaria de Estado de Turismo, que contempla artesãos com a aquisição de até R$ 5 mil em produtos, por pessoa. Os produtos contemplados no edital são de itens de artesanato tradicionais da região, tais como azulejaria, pintura à mão livre com porcelana, artesanato indígena em fibra de buriti, rendas, chapéus, tapetes de palha de carnaúba, além de peças produzidas em madeira, cerâmica, tecido e outros.


Artesãos podem concorrer a fomento de até R$ 5 mil em aquisição de seus produtos pelo governo do estado. / Canal Matopiba

Ilton Vasconcelos, artesão há mais de 45 anos e morador de Imperatriz (MA), reclama que, apesar de ajudar, o edital chega tarde. Ele produz materiais de argila, cerâmica, fibras de buriti e sementes de frutas típicas da região, mas teve as vendas totalmente paralisadas e não vê previsão de retorno.  

Vasconcelos acrescenta que a classe vive um momento dramático, uma vez que o auxílio emergencial só supre as necessidades alimentícias: “Artesão não está vendendo, não tem chance de artesão vender nessa época. Eu estou vivendo uma situação muito difícil, as dívidas estão acumulando, o benefício só dá para as despesas de comer”. 

Durante esse período, algumas medidas paliativas foram adotadas a nível municipal, mas não resolveram o problema dos artesãos, que dependem da circulação de turistas nas cidades. “A Prefeitura fez uma feirinha nos bairros que não dá quase nada, porque o artesanato é só para o turismo. O povo da cidade não tem nem dinheiro, e é nos bairros populares de classe C e D, então... é pouca coisa. Anel de tucum, eu vendo. Fui em uma feira e vendi um anel de tucum de R$ 5. É difícil”, desabafa o artesão.

Uma preocupação apontada por Vasconcelos em relação ao edital do estado é que muitos artesãos é a burocracia. Entre seis certidões negativas solicitadas para cadastro, estão negativa de débito junto à Companhia de Saneamento Ambiental do Maranhão (CAEMA) e documento de Cadastro do Artesanato Brasileiro (SICAB).

Sobre a documentação, a Superintendente de Cultura da Região Metropolitana de Imperatriz e Polo da Chapada das Mesas, Lília Diniz, explica que  foram feitas reuniões com todos os segmentos culturais para explicar o passo a passo e definir os requisitos. “Infelizmente, no Brasil, nós ainda temos um conjunto de leis, em especial a lei de licitações para contratação de serviços públicos, que exige realmente uma série de documentos. O mesmo documento que é pedido, por exemplo, para uma empresa para contratar asfalto, é a mesma lei que regula a contratação de artistas. Essa lei precisa ser revisitada, discutida, pois são situações diferentes”, admite.


Luciana Simões é cantora e produtora do Festival BR 135, que vai concorrer a um dos editais de fomento cultural. / Laila Razzo

Empresas de cultura

Para além de um número de CNPJ, as empresas de cultura que poderão concorrer aos editais de fomento fazem parte de uma gigantesca cadeia de profissionais, que envolve desde técnicos de palco, som e luz, quanto serviços de aluguel de instrumentos, espaços de ensaio, casas de shows, alimentação, entre outros. Devido à pandemia, as empresas estão em situação de extrema vulnerabilidade, como conta Luciana Simões, cantora e produtora de um dos maiores festivais de música do estado, o Festival BR 135.

O Festival já levou ao palco grandes nomes da música como Arnaldo Antunes, Nação Zumbi, BaianaSystem e Liniker e os Caramelows, com acesso gratuito para maranhenses. Para além da música, o evento propõe divulgar e fortalecer a cadeia produtiva da arte e a economia criativa do Maranhão, por meio de palestras, capacitações e ações sociais.

"Quando cai uma empresa de cultura, derruba também todo um sistema de fornecedores, de trabalhadores profissionais que orbitam e servem à cultura, como os técnicos, como os profissionais que trabalham no palco, na luz, no som, no vídeo, aluguel de instrumentos, estúdios de ensai", analisa Simões. "Enfim, é todo um ecossistema de pessoas que são afetadas e a gente realmente necessita muito desses recursos. Estamos todos em permanente conferência para cuidar uns dos outros".

Cada edição do festival envolve diretamente uma média de 60 pessoas na equipe e até 700 artistas nas diversas programações. Sem ações culturais desde o início do ano, uma saída encontrada foi a entrega de um copo colecionável mediante doações para os profissionais da cadeia produtiva, inclusive com opção de delivery

“Desde o começo do ano a gente não realiza nenhuma ação, então por consequência disso, esses profissionais todos estão parados e nós acreditamos, enquanto festival, que precisamos nos responsabilizar em buscar auxílio também, para esses profissionais”, completa Simões, que será uma das concorrentes ao edital de fomento a projetos culturais, com um novo formato do Festival BR 135, na modalidade digital.


Mais de 600 artistas foram contemplados com o Conexão Cultural, iniciado em março. / Reprodução

Iniciativas anteriores

Antes do acesso aos recursos da Lei Aldir Blanc, o estado já vinha desenvolvendo outras ações na tentativa de reduzir os impactos da pandemia ao setor cultural, como o edital Nosso Artesanato, que adquiriu R$ 2 mil em peças de artesãos locais, por meio da Secretaria de Estado do Turismo (SETUR) e o Conexão Cultural, programa de apresentações culturais pela internet que em dois editais, contemplou aproximadamente 650 artistas maranhenses.

Entre os beneficiados estão grupos de samba, forró, bandas de rock, contadores de estórias, dançarinos, atores, entre outros. O segundo edital, que previa 50 vagas, recebeu 362 inscritos, mas por decisão do governador Flávio Dino, todos foram contemplados.

Editais disponíveis

Todos os editais disponibilizados pelo Governo do Estado do Maranhão já foram divulgados, mas tem datas de inscrições, segmentos e premiações variadas.

Confira relação completa, com mais detalhes e links de acesso:

EDITAL LAB 03.2020 – CONEXÃO CULTURAL 3 – Vai premiar produções artísticas inéditas em vídeo, para difusão em plataformas digitais. Serão premiadas 1.850 produções nos segmentos: artes cênicas (circo, dança e teatro), literatura (leitura dramática), artes visuais e música (autoral, barzinho, grupos, bandas e outros). O valor do prêmio para qualquer uma das categorias é de R$ 2.500,00. Inscrições de 21 a 30 de setembro de 2020.

EDITAL LAB 04.2020 – OFICINAS ARTÍSTICAS – Vai premiar oficinas artísticas em vídeo, para difusão em plataformas digitais. Serão premiadas 2.500 oficinas nos segmentos: artes cênicas, artes visuais, literatura e música. O valor do prêmio para qualquer categoria é de R$ 1.500,00. Inscrições de 21 a 30 de setembro de 2020.

EDITAL LAB 05.2020 – FOMENTO A PROJETOS CULTURAIS – Vai premiar projetos culturais de versão inédita, com temática diretamente relacionada à cultura, com data de realização até o dia 31 de dezembro de 2020. Os projetos deverão ter, no mínimo, uma edição já realizada anteriormente. Serão premiados projetos de feiras, mostras, festivais, premiações, festas populares e tradicionais, encontros, exposições e eventos de cunho artístico-cultural de finalidade pública, realizados gratuitamente, na modalidade virtual. O valor de apoio será de até R$ 100 mil. Inscrições de 21 a 30 de setembro de 2020.

EDITAL LAB 06.2020 – FOMENTO A LITERATURA – Vai credenciar autores maranhenses para o fornecimento de obras literárias, dos mais variados gêneros. Os autores devem ter pelo menos uma obra publicada e serão fornecidos até 100 exemplares por autor, de valor até R$ 100,00 unitário. O valor total destinado ao pagamento dos credenciados será de até R$ 10 mil. Inscrições de 05 a 15 de outubro de 2020.

EDITAL LAB 07.2020 – ARTESANATO – Vai credenciar artesãos maranhenses, para produção e fornecimento de artigos artesanais. Cada credenciado deverá fornecer uma quantidade de itens que, somados, totalizem o valor de até R$ 5 mil. Inscrições de 05 a 15 de outubro de 2020.

EDITAL LAB 08.2020 – PROJETOS AUDIOVISUAIS – Vai premiar 38 projetos nas categorias Roteiro curta-metragem e Roteiro longa-metragem, em formato live action, animação, ou documentário na categoria ficção. Para curta-metragem, a premiação é de R$ 10 mil e longa-metragem R$ 100 mil. Inscrições de 05 a 15 de outubro de 2020.

Edição: Rodrigo Durão Coelho