Análise do índice

Ideb é "avaliação míope" do sistema educacional brasileiro, diz professor Daniel Cara

Brasil não atinge pelo quarto ano as metas nos anos finais do ensino fundamental e médio

Brasil de Fato | Brasília (DF) |

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Ideb mostra alguns problemas, mas não aponta soluções para problemas complexos da educação - Foto: Sumaia Vilela/Agência Brasil

O Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) é uma “avaliação míope” da realidade educacional no país, afirma o professor e pesquisador Daniel Cara, coordenador-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação (CNDE).

Os medidores, divulgados nesta terça-feira (15) pelo Ministério da Educação, apontaram que, pela quarta vez consecutiva, o Brasil não alcançou a meta para os anos finais do ensino fundamental e para o ensino médio. Veja os dados completos.

Com o índice, propõe-se a avaliar a evolução da aprendizagem no país, com base no desempenho dos alunos em provas de português e matemática. A meta é alcançar uma média 6, em uma escala de 0 a 10, no padrão de países desenvolvidos.

A previsão para o Brasil é de chegar em 6 até 2021 para os anos iniciais do ensino fundamental (estamos em 5,9); até 2025 para os anos finais (chegamos a 4,9); e até 2028 para o ensino médio (estamos em 4,2). 

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Para o coordenador da CNDE, o índice é um “museu de grandes novidades”, ou seja, é uma repetição consecutiva de dados que não apresenta grandes soluções para o desenvolvimento educacional da nação.

“O Ideb é um índice limitado que não sinaliza caminhos. É um ingrediente para o diagnóstico dos problemas educacionais, mas é um ingrediente que se encerra em si mesmo. O Ideb não mensura, de fato, a qualidade da educação, que é um fenômeno muito mais complexo”, diz.

Ele critica a construção limitada do índice somente baseada em provas aplicadas aos alunos. “O uso mais frequente do Ideb não é para melhorar a política educacional. O uso mais frequente do Ideb é treinar para a prova que compõe o próprio Ideb. Ou seja, não é um aprendizado real, é um aprendizado construído”.

De acordo com educador, o índice não é – ou não deveria ser – usado por gestores para a elaboração de diretrizes que melhorem a qualidade de ensino. 

“É muito difícil um gestor educacional que, de fato, entenda de educação ficar limitado ao Ideb. Ele só serve como semáforo, só vai indicar, em termos daquilo que ele mensura, se você está verde, amarelo ou vermelho. E no Brasil ninguém está verde. Mente quem diz que está verde. Concretamente, é só você visitar os lugares e perceber que ainda falta muito para a qualidade da educação”, pontua Cara.

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Ele ressalta que, hoje em dia, o índice tem sido usado muito mais para fins eleitoreiros do que para a reflexão sobre os problemas brasileiros. “A pergunta que deveria vir, na divulgação do Ideb, inclusive para os governadores que estão comemorando resultados é: vocês estão satisfeitos com esses resultados? Se sim, o que vocês vão fazer para melhorar? Porque, certamente, isso não é suficiente. Mesmo eles comemorando, eles sabem que os resultados não são suficientes”.

Cara afirma que, embora o Ideb não aponte soluções, os números reforçam a desigualdade social na educação. No recorte por município, por exemplo, 39,4% das cidades do Norte e 21,1% das do Nordeste têm o índice muito baixo (menor que 3,1) nas escolas estaduais. No Sudeste, apenas 2% dos municípios apresentam um índice tão preocupante.

O educador aposta que, se bem regulamentado, o Fundeb (fundo financiador da educação básica no país) pode fazer chegar investimento às cidades mais pobres e amenizar as diferenças no acesso a escolas de qualidade. Ele lamenta que, hoje, a educação esteja longe de cumprir seu papel de fortalecer a democracia.

“O Ideb mostra dois fatores: primeiro, a educação ainda não é um direito, em que pese o fato que o Ideb é só um dos ingredientes, bem pequeno, do que significaria o direito à educação; mas tem um outro fator: a educação, pelo fato de não ser um direito, não tem cumprido com um papel essencial que ela deveria cumprir que é de redução das desigualdades. Ou seja, as desigualdades não só se expressam, mas também se intensificam na educação”.

Edição: Rodrigo Durão Coelho