LITERATURA

Presidente da Companhia Editora de Pernambuco: setor vai reagir à taxa de Guedes

Ricardo Leite diz que já há uma movimentação nacional para barrar proposta no Congresso

Brasil de Fato | Recife (PE) |

Ouça o áudio:

A desfaçatez é tamanha a ponto de a pobreza do povo servir de justificativa, recorrendo à chantagem: livros ou programas sociais. - Foto: Prefeitura de Caxias do Sul

Atualmente, o setor de livros no Brasil não paga impostos e é protegido dessa cobrança pela Constituição Federal. Com proposta do governo federal feita pelo ministro da Economia do Brasil, Paulo Guedes, em reforma tributária, a isenção deixa de existir e o setor passaria a ter taxação de 12%. Nas redes sociais, a hashtag “#DefendaOLivro” vem sendo usada como campanha para reagir contra a proposta. 

Continua após publicidade

O Brasil de Fato Pernambuco conversou com o jornalista e presidente da Companhia Editora de Pernambuco (Cepe), Ricardo Leite de Castro Leitão, para entender as implicações da possível taxação e o que poderia ser feito para incentivar a leitura no país. Confira entrevista: 

BdF Pernambuco: a reforma tributária, proposta pelo governo federal, pode provocar uma alta no preço dos livros do país, com uma taxação de 12%, sendo que o mercado editorial já enfrenta uma crise estrutural. Como essa taxa pode impactar a vida dos livros no Brasil?

Ricardo Leitão: o preço do livro vai crescer e, consequentemente, menos pessoas vão ter condições de comprá-lo. O livro no Brasil é caro, não é subsidiado, e com essa taxação a perspectiva é que menos pessoas leiam. De 2009 até 2019, houve uma retração de 26% nas vendas de livros no país. E se o nosso mercado editorial, já fragilizado, ainda tiver aumento do preço do livro, é mais uma pancada em um setor que tem relações estreitas com a promoção da cultura no Brasil. 

O Brasil já é um país que tem um índice de leitura muito baixo entre a população, e o Paulo Guedes, que propôs a taxação, falou que o pressuposto dessa taxa é que ela vai “impactar as elites que compram livros no país”. Para além das editoras, quem é a parte do público que sai mais prejudicada com essa taxa? 

O preço do livro prejudica todo mundo. O preço do livro deveria ser cada vez mais baixo, se possível, até de graça. O Estado não pode, em momento de crises econômicas, taxar produtos que têm relação com a cultura. Daqui a pouco estão aumentando os preços do ingressos do cinema e do teatro. Por que não se aumenta a taxação sobre grandes fortunas? Por que não se aumenta a taxação sobre operações financeiras? Por que o Brasil não renegocia dívidas e consequentemente economiza para ter mais recursos para investir? 

Isso é um erro e nós estamos nos organizando, do ponto de vista político, para reagir. Organizando o sindicato nacional dos editores de livros, organizando a associação das editoras oficiais do Brasil, para reagir no Congresso e impedir que esse projeto seja aprovado. 

Como o senhor acha que podemos melhorar o acesso aos livros no país, do ponto de vista não só do acesso, mas também de difusão? Como fazer que os livros se popularizem? 

Pelas escolas. No interior, por exemplo, as pessoas não leem em casa, porque não há um incentivo para leitura em casa, porque são famílias mais pobres de fato, que não têm a prática, a preocupação com a leitura. Então um dos caminhos é fortalecer as bibliotecas municipais e movimentar as bibliotecas das escolas. 

Outra coisa, não necessariamente precisa ser o livro impresso, físico. A gente pode trabalhar com o livro digital e ampliar esse contato. Além disso, reduzir o preço do livro digital, que já é menor do que o livro impresso; e reduzir também o preço do livro impresso amplia a compra do livro. E não apenas do livro didático, mas também o livro de ficção. 

Investir no teatro infantil; premiar o teatro infantil; criar o hábito a partir da escola, para que desde crianças se interessem pela leitura. Tornar os livros mais interessantes com os recursos de edição, de ilustração. Estimular concursos nas escolas, feiras literárias, trabalhar com autores regionais para que as temáticas possam aproximar a criança da leitura. 

Tudo isso são movimentos que já existiam e já existem em outros países e no Brasil. A Cepe já faz tudo isso: tem concurso nacional literário, para adultos e para crianças; somos provedores de livros nas bibliotecas públicas e escolares do estado. Promovemos feiras literárias, são mais de 13 feiras regionais. E isso pode ser ampliado se o livro e a leitura forem uma política. Se ler for uma política constante. Infelizmente, não é. Pode passar a ser. Pernambuco, felizmente, aprovou a lei estadual do livro e da biblioteca e de certa maneira contempla esses aspectos. Mas a gente tem que fazer cada vez mais. O livro é fundamental. 

O senhor comentou sobre as ações que a Cepe já desenvolve. Como vocês têm visualizado esse momento de pandemia? Tem refletido na compra de livros? 

A pandemia nos prejudicou e prejudicou várias editoras. Por exemplo, nós temos quatro livrarias próprias. Todas estão fechadas desde março. Estamos somente vendendo livros digitais, por e-book. Cancelamos todas as feiras literárias desse ano e cancelamos os lançamentos de 80 livros. Conseguimos lançar uns 40 trabalhando remotamente, mas não temos como manter a mesma intensidade, porque a gráfica está fechada. Então estamos aguardando as coisas normalizarem para intensificarmos o trabalho.

Fonte: BdF Pernambuco

Edição: Monyse Ravena