Os metroviários do estado de São Paulo estudam entrar em greve nesta quarta-feira (1°) contra redução de benefícios na folha salarial, em meio à discussão do acordo coletivo da categoria com o governo e a direção do Metrô.
Camila Lisboa, uma das coordenadoras gerais do Sindicato, afirma que os trabalhadores se assustaram ao notar que o salário pago essa semana não estava completo e que havia redução no pagamento de alguns benefícios.
Segundo a sindicalista, o governo e o Metrô alegam que as alterações se deram pela baixa arrecadação da companhia, já que o fluxo de pessoas tem sido mais baixo durante a pandemia do coronavírus.
“Recebemos o salário com vários cortes de direitos que implicam em perda salarial. Trabalhamos o mês inteiro contando que ia receber um valor ao fim do mês, e recebemos um valor muito reduzido. Em alguns casos, a redução passa de R$1 mil. A categoria metroviária está trabalhando na pandemia, se expondo ao risco, somos um setor essencial, e temos esse tipo de tratamento do João Doria”, critica Lisboa.
O adicional de risco de vida dos bilheteiros, o auxílio-transporte e um desconto maior no plano de saúde foram algumas das mudanças, de acordo com o sindicato.
A coordenadora da entidade explica que a negociação do novo acordo coletivo e da campanha salarial foi iniciada no último dia 22, à revelia da categoria, que defende que as negociações aconteçam pós-pandemia.
“Já implementaram a destruição do acordo coletivo sem conversar direito. Queremos adiar o processo de negociação da campanha salarial, para todos se concentrarem na pandemia. Mas a direção do Metrô e o governo do estado fazem questão de começar a negociação agora, com essa atitude intransigente”, reprova.
Não é por salário maior
Sérgio Magalhães, diretor do sindicato, ressalta que a paralisação prevista para amanhã não é por aumento de salário e sim pela manutenção do pagamento e garantias dos benefícios estabelecidos pelo acordo coletivo que perdeu validade recentemente.
“Queremos receber o salário como vinhamos recebendo para continuar negociando. É isso que queremos. Não aceitamos esse ataque. Esperávamos que ontem eles recuassem. ‘Fica tudo do jeito que está e continuamos negociando. Mas eles negaram. Mantiveram os ataques do jeito que está,” diz.
O metroviário conta que o sindicato chegou a ganhar uma liminar para que não houvesse negociação neste momento, com o objetivo para que todos concentrasse esforços no combate à pandemia. No entanto, o Metrô e o governo recorreram e a decisão foi caçada pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST).
De acordo com Magalhães, os cortes já implementados são apenas o início dos ataques ao acordo coletivo, “fruto de 40 anos de luta”.
Ele destaca que diversos pontos do acordo, como por exemplo, hora extra de 100%, adicional noturno de 50%, auxílio-transporte e outros direitos que viabilizam a organização sindical, como o desconto na folha, são os principais alvos do governo e da direção do Metrô.
Uma audiência de conciliação está prevista para as 15h desta terça-feira (30), mas, pelo histórico de posicionamentos recentes, a perspectiva é negativa.
“Vamos para assembleia online até 21h30. E se não tiver proposta, a posição unânime da comissão de negociação do sindicato é fazer a greve", garante Magalhães.
Riscos à saúde
O corte na participação do Metrô no custeio do plano de saúde, aumentando consequentemente a quantia paga pelos trabalhadores, é, para Magalhães, um perversidade em meio à pandemia. Isso porque, conforme ele relata, tendo que pagar mais pelo plano, e de forma tão repentina, muitos trabalhadores não conseguirão arcar com os custos e ficarão sem assistência.
Segundo o Sindicato dos Metroviários, quase 300 trabalhadores foram afastados por serem infectados pela covid-19 ou entrarem em contato com pessoas contaminadas no último período.
"Os metroviários trabalham no segundo maior local de risco. Trabalham para garantir o funcionamento, o trabalho dos essenciais fundamentalmente. Imagina no meio disso ter seu rendimento reduzido. Tem gente sem salário na prática”, diz Sérgio Magalhães.
Armando Ramos Norberto foi o primeiro metroviário da ativa a falecer em decorrência da doença, no dia 17 de junho. Outros quatro óbitos de trabalhadores que já estavam afastados também se tornaram vítimas fatais do coronavírus.
Passe Livre
Em defesa do recebimento do salário integral de forma imediata, outra proposta analisada pelos metroviários além da paralisação é que os usuários do metrô não paguem passagem.
“Sempre que fizemos greve, eles falam que vai prejudicar a população. Então, para pressionar a direção do Metrô e o governo na negociação, porque temos esse direito, queiram eles ou não esses direitos ainda existem, lançamos um desafio: abrimos as catracas ao invés de não trabalhar. Trabalhamos com as catracas abertas”, afirma Camila Lisboa, reforçando que os metroviários não querem aumento salarial e sim manter os direitos estabelecidos até então.
Para ela, o argumento de que o metrô arrecadou menos nos últimos meses não pode servir como brecha para penalizar o trabalhador.
“O governo do estado trabalha com uma ideia do metrô ser autossuficiente financeiramente. Fazendo o povo pagar o metrô com uma passagem caríssima de R$4,40. O metrô não pode funcionar assim. A passagem tem que ser mais barata e o Poder Público, o Estado, tem que colocar dinheiro público no metrô público. Coloca no privado e não no público”, defende.
Procurados pela reportagem, o governo de São Paulo e o Metrô não se manifestaram até a publicação desta reportagem.
Edição: Rodrigo Durão Coelho