Direitos

Sem proteção e sob ameaça: funcionários essenciais relatam más condições de trabalho

Atendentes de call center e entregadores afirmam que temem por sua saúde e se sentem desamparados durante a pandemia

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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Entregadores de aplicativos realizaram manifestações em São Paulo para denunciar a falta de apoio e a diminuição nos valores das entregas - TV Brasil

Para que todos possam ficar em casa, alguns trabalhadores continuam na ativa, atuando nos chamados trabalhos essenciais. Importantíssimos para o funcionamento da sociedade nesse período de exceção, alguns desses profissionais, porém, afirmam que estão com medo de contaminação pois não possuem condições necessárias para proteger sua saúde. 

Um deles é Adriano Lemes, que faz entregas de bicicleta em Santos para empresas privadas e serviços de aplicativos. Ele afirma que em sua rotina entra em contato com grande quantidade de pessoas diariamente, e que todo gasto e cuidado com a não contaminação dos produtos fica por sua conta.

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“O aplicativo começou a dar instruções de como se proteger, tem umas mensagens para clicar. Dizem que alguns postos estão disponibilizando produtos, mas até agora não vi ninguém que tenha conseguido acessar. Eu to acompanhando e comprando com meu dinheiro mesmo”.

Rodrigo Santana Cardoso também é entregador, em Santos. Ele afirma que a precariedade do trabalho e os riscos que corre diariamente se agravam ainda mais nesse contexto de pandemia. “A gente está numa condição de vulnerabilidade, e também de precarização do trabalho. Porque, se quebrar minha bicicleta ou for assaltado, o prejuízo é meu, trabalho com minha própria bicicleta. Com o aumento das pessoas indo para hospital, sendo atropelado eu não vou ter esse acesso. Até porque não tenho plano de saúde”, afirma.

Recentemente, entregadores de aplicativos realizaram manifestações em São Paulo para denunciar a falta de apoio e diminuição nos valores das entregas. Além deles, outra categoria que também se mobilizou para demandar melhores condições de trabalho foram os operadores de telemarketing, que realizaram protestos em diferentes cidades no Brasil durante o mês de março e abril.

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Uma funcionária da empresa Atento, que preferiu não se identificar, conta que apenas álcool em gel está sendo disponibilizado para os funcionários e que a limpeza dos equipamentos fica por conta de cada um. Além diz, relata que houve casos de coronavírus na empresa, mas que não houve notificação oficial. “ Tem [caso de funcionário infectado] só que eles abafam bastante. Tem um pessoal tá tarde que tava internado, mas não sei se estão ainda. Na minha opinião pessoal, eu acho que que isso chega a ser desumano até. Além de estar lá trabalhando, estão falando de corte, a gente não sabe se é verdade ou não, tão falando de demissão em massa, tão falando de tirar comissão, um monte de coisa. Tá todo mundo apreensivo, esperando.” relata a funcionária.

Para Thiago Barison, diretor do Sindicato dos Advogados do Estado de São Paulo e membro da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), os trabalhadores precisam se organizar para pressionar empresas e serviços de aplicativo para a garantia de direitos.

“A lei é clara e define que é obrigação do empregador fornecer as condições de saúde e segurança do trabalhador. Nesse caso, esse trabalhador tem que denunciar para o seu sindicato. O sindicato é uma das atividades essenciais nessa pandemia. É responsabilidade dele publicar, divulgar, pressionar para que na lá ponta os trabalhadores tenham os seus direitos garantidos.” afirma o advogado.

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Quando o trabalhador está subordinado a um aplicativo, Barison afirma que é necessário uma mobilização, seja por meio de protestos ou pela criação de novos sindicatos que defendam essas categorias específicas. “Por algum caminho a gente tem que responsabilizar essas empresas, cujo lucro na pandemia tem aumentado. A contradição que já era grande em tempos de normalidade, agora aumenta porque a remuneração, as condições de saúde do trabalhador estão lá embaixo e os lucros das empresas estão lá em cima. A sociedade precisa reagir", complementa. 

Rodrigo concorda com a necessidade de organização. Ele conta que está buscando se associar com outros entregadores de bicicleta para conseguir dar voz às suas demandas específicas. “ A gente pensando em formar um coletivo e partir para uma linha sindical envolvida com as questões dos ciclistas. Buscando construir uma alternativa, porque se a gente pensar na questão do sindicalismo dentro do do trabalho intermitente, a gente não tem muitos exemplos, é algo novo, então que a gente tá buscando alternativas.” conclui Cardoso.

Edição: Douglas Matos