Cuba segue na lista dos países mais ameaçados pela política externa dos Estados Unidos. Em meio à pandemia causada pela novo coronavírus, a gestão de Donald Trump mantém seu bloqueio econômico contra o país caribenho, dificultando a entrada de insumos básicos para lidar com a crise sanitária mundial que também afeta o país caribenho.
O bloqueio econômico imposto à ilha impediu que um navio com doações enviadas pelo empresário chinês Jack Ma, fundador da empresa de eletrônicos Alibaba, aportasse em Cuba. A empresa contratada para transportar os suprimentos, que incluíam máscaras, kits de diagnóstico mais rápidos e respiradores, desistiu de entregar a encomenda sob o argumento de que as regras do bloqueio imposto pelos EUA impediam a ação.
Em uma nota publicada na última quinta-feira (16),o Ministério das Relações Exteriores em Cuba, analisa os ataques sistemáticos que o país tem sofrido e reforça a importância da campanha #NoMásBloqueio [Não mais bloqueio], realizada por movimentos e organizações populares de todo o mundo.
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No documento intitulado "A pandemia mostra a necessidade de cooperação apesar das diferenças políticas", o governo de Cuba reforça a necessidade de aliança entre os países no combate ao coronavírus.
"A dimensão da atual crise nos obriga a cooperar e a praticar a solidariedade, mesmo reconhecendo diferenças políticas. O vírus não respeita fronteiras, nem ideologias. Ameaça a vida de todos, e é de todos, a responsabilidade de enfrentá-lo. Nenhum país deveria assumir que é suficientemente grande, rico ou poderoso, para defender-se por si só, em isolamento e ignorando os esforços e as necessidades dos demais", expressa o Ministério em nota.
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Na contramão dos EUA, país que atualmente concentra mais casos de covid-19, com mais de 800 mil casos e 42.946 mortes, e que tem vivenciado os impactos de sua precária e privatista política de saúde, Cuba demonstra sua bem-sucedida política sanitária no tratamento oferecido aos residentes da ilha, pese aos ataques sofridos no contexto do bloqueio.
Neste sentido, Cuba também tem colocado em prática, uma vez mais, sua solidariedade internacionalista, enviando equipes de saúde a países como Itália, Nicarágua, Venezuela e Haiti, entre outros, para auxiliar no combate à covid-19 e salvar vidas.
"Nas últimas semanas, respondemos a solicitações de cooperação, sem nos determos a avaliar coincidências políticas ou vantagens econômicas. Até o momento, foram enviadas, para unir-se ao esforço nacional e local de 20 países, 21 brigadas de profissionais da saúde, que se somam ou reforçam a brigadas de colaboração médica em 60 nações, as quais se incorporaram ao esforço de combater essa enfermidade onde já prestavam serviços", ressalta o documento.
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Leia, na íntegra, a declaração do Ministério de Relações Exteriores de Cuba:
A pandemia mostra a necessidade de cooperação apesar das diferenças políticas
Declaração do Ministério das Relações Exteriores
O impacto da covid-19 já pode ser medido, e poderá ser avaliado no futuro, pela impressionante quantidade de pessoas infectadas, pelos números inaceitáveis de mortes, pelo indiscutível prejuízo à economia mundial, à produção, ao comércio, ao emprego e aos ganhos pessoais de milhões de pessoas. É uma crise que ultrapassa em grande medida o âmbito sanitário.
A pandemia chega e se propaga em um cenário previamente caracterizado pela brutal desigualdade econômica e social entre as nações e no seu interior, com fluxos migratórios e de refugiados sem precedentes; em que a xenofobia e a discriminação racial voltam a aflorar; e em que os impressionantes avanços da ciência e da tecnologia, particularmente em matéria de saúde, concentram-se cada vez mais no negócio farmacêutico e na comercialização da medicina, em lugar de estar voltado a garantir o bem-estar e a vida saudável das maiorias.
Ela chega a um mundo lastrado por padrões de produção e consumo, particularmente nos países mais industrializados e entre as elites dos países em desenvolvimento, que são reconhecidamente insustentáveis e incompatíveis com a condição limitada dos recursos naturais dos quais depende a vida no planeta.
Antes de identificar-se o primeiro enfermo, havia 820 milhões de pessoas famintas no mundo, 2,2 bilhões sem serviços de água potável, 4,2 bilhões sem serviços de saneamento geridos de forma segura e 3 bilhões sem instalações básicas para lavar as mãos.
Esse cenário é ainda mais inadmissível quando se sabe que, no nível global, empregam-se por ano cerca de 6,7 bilhões de dólares estadunidenses apenas em publicidade, e 1,82 trilhão de dólares estadunidenses em gasto militar e de armamentos, que são totalmente inúteis para combater a ameaça da covid-19, com suas dezenas de milhares de mortes.
O vírus não discrimina entre uns e outros. Não distingue entre ricos e pobres, mas os seus efeitos devastadores se multiplicam ali, onde estão os mais vulneráveis, com menores rendas, no mundo pobre e subdesenvolvido, nos bolsões de pobreza das grandes urbes industrializadas. São sentidos com especial impacto nos locais onde as políticas neoliberais e de redução dos gastos sociais limitaram a capacidade do Estado na gestão pública.
Faz mais vítimas onde foram cortadas as verbas governamentais dedicadas à saúde pública. Provoca mais prejuízo econômico onde o Estado tem poucas possibilidades ou carece de opções para resgatar os que perdem o emprego, fecham seus negócios e sofrem a redução dramática ou o fim de suas fontes de ganhos pessoais e familiares. Nos países mais desenvolvidos, provoca mais mortes entre os pobres, os imigrantes e, especificamente nos Estados Unidos, entre os afro-americanos e os latinos.
Como agravante, a comunidade internacional afronta essa ameaça global numa ocasião em que a maior potência militar, econômica, tecnológica e de comunicação do planeta pratica uma política externa dirigida a fomentar e promover os conflitos, as divisões, o chauvinismo e posições supremacistas e racistas.
Num momento em que enfrentar globalmente a pandemia exige impulsionar a cooperação e estimular o importante papel das organizações internacionais, particularmente da Organização das Nações Unidas (ONU) e da Organização Mundial da Saúde (OMS), o atual governo dos Estados Unidos ataca o multilateralismo e procura desqualificar a reconhecida liderança da OMS. Continua, ademais, em sua mesquinha intenção de aproveitar o momento para impor o seu domínio e atacar os países de cujos governos discorda.
Disso, são exemplos ilustrativos as recentes e graves ameaças militares contra a República Bolivariana da Venezuela e a proclamação, anteontem, pelo presidente dos Estados Unidos, do Dia e Semana Pan-americanos, de 14 a 18 de Abril, acompanhada de declarações neocoloniais e inspiradas na Doutrina Monroe, contra a Venezuela, Nicarágua e Cuba, em lembrança da Conferência Pan-americana, condenada há 130 anos por José Martí. Nesses mesmos dias, em 1961, ocorreram os combates de Praia Girón.
Outro exemplo é o ataque imoral e persistente contra o esforço cubano de oferecer solidariedade aos países que solicitaram cooperação para enfrentar a covid-19. Em lugar de dedicar-se a promover a cooperação e estimular uma resposta conjunta, altos funcionários do Departamento de Estado daquele país dedicam o seu tempo a emitir declarações de ameaça contra aqueles governos que, ante o drama da pandemia, optam soberanamente por solicitar ajuda a Cuba.
Os Estados Unidos cometem um crime, e os seus funcionários sabem disso, quando, em meio a uma pandemia, ao atacar a cooperação internacional oferecida por Cuba, propõem-se a privar milhões de pessoas do direito humano universal aos serviços de saúde.
A dimensão da atual crise nos obriga a cooperar e a praticar a solidariedade, mesmo reconhecendo diferenças políticas. O vírus não respeita fronteiras, nem ideologias. Ameaça a vida de todos, e é de todos, a responsabilidade de enfrentá-lo. Nenhum país deveria assumir que é suficientemente grande, rico ou poderoso, para defender-se por si só, em isolamento e ignorando os esforços e as necessidades dos demais.
É urgente compartilhar e oferecer informação de valor e confiável.
É preciso dar os passos que permitam coordenar a produção e distribuição dos equipamentos médicos, meios de protecão e medicamentos, com um senso de justiça. Os países com maior disponibilidade de recursos devem compartilhá-los com os mais afetados e com aqueles que chegam à pandemia menos preparados.
Com esse enfoque, trabalha-se em Cuba. A partir dele, tenta-se oferecer a humilde contribuição de uma nação pequena, com escassas riquezas naturais e submetida a um longo e brutal bloqueio econômico. Pudemos, durante décadas, acumular experiência no desenvolvimento da cooperação internacional em matéria de saúde, generosamente reconhecida pela Organização Mundial da Saúde e nossas contrapartes.
Nas últimas semanas, respondemos a solicitações de cooperação, sem nos determos a avaliar coincidências políticas ou vantagens econômicas. Até o momento, foram enviadas, para unir-se ao esforço nacional e local de 20 países, 21 brigadas de profissionais da saúde, que se somam ou reforçam a brigadas de colaboração médica em 60 nações, as quais se incorporaram ao esforço de combater essa enfermidade onde já prestavam serviços.
Também compartilhamos alguns dos medicamentos produzidos pela ilha, os quais, segundo nossa prática, têm eficácia comprovada na prevenção ou tratamento da enfermidade. Adicionalmente, nosso pessoal médico participou, a partir de Cuba e via teleconferência, em consultas e debates sobre tratamentos específicos para pacientes ou grupos particulares destes, em vários países.
Esse esforço é realizado sem descuidar da responsabilidade de proteger a população cubana, o que se cumpre com rigor, apesar das imensas limitações impostas pelo bloqueio econômico, comercial e financeiro dos Estados Unidos. Quem quiser conhecer, encontrará os dados que sustentam esta afirmação, pois são públicos. Quem tiver um mínimo de decência, compreenderá que o bloqueio exerce uma pressão extraordinária sobre Cuba, quando esta busca garantir os insumos materiais e os equipamentos que sustentam o sistema de saúde pública e as condições específicas para enfrentar essa pandemia.
Um exemplo recente foi o de um carregamento de ajuda procedente da China, que não pôde chegar a Cuba, porque a empresa transportadora alegou que o bloqueio econômico dos Estados Unidos o impedia. Diante disso, altos funcionários do Departamento de Estado tiveram o cinismo de declarar que os Estados Unidos, sim, exportam a Cuba, tanto medicamentos como equipamentos médicos. Não são capazes, porém, de respaldar essas falsidades com um único exemplo de alguma transação comercial entre os dois países.
É sabido, e está mais que fundamentado, que o bloqueio econômico é o principal obstáculo ao desenvolvimento de Cuba, para a prosperidade do país e para o bem-estar dos cubanos. Esta dura realidade, que se deve única e exclusivamente à obstinada e agressiva conduta do governo dos Estados Unidos, não nos impede de oferecer nossa ajuda solidária. Não a recusamos a ninguém, nem mesmo recusaríamos a esse país que tanto prejuízo nos provoca, se fosse o caso.
Cuba está convencida de que o momento exige cooperação e solidariedade. Sustenta que um esforço internacional e politicamente livre de preconceitos, para desenvolver e compartilhar a pesquisa científica e para trocar as experiências de diversos países no trabalho preventivo, na proteção dos mais vulneráveis e nas práticas de conduta social, ajudará a encurtar a duração da pandemia e a reduzir o ritmo das perdas de vidas. Acreditamos firmemente que o papel e a liderança das Nações Unidas e da Organização Mundial da Saúde são imprescindíveis.
A expansão viral será detida, provavelmente, com mais rapidez e menos custo, se agirmos em conjunto.
Ficará, então, a crise econômica e social que vem provocando em sua passagem, e cujas dimensões ninguém é capaz de vaticinar com certeza.
Não se pode esperar esse momento para unir vontades, com o fim de superar os grandes problemas e ameaças que encontraremos e responder aos que arrastamos desde antes da pandemia começar a cobrar as primeiras vidas.
Se não garantimos aos países em desenvolvimento o acesso à tecnologia, incluindo especialmente a do âmbito da saúde, que costuma concentrar-se nos países mais industrializados, e se estes não se dispõem a compartir, sem restrições ou egoísmos, os avanços da ciência e seus produtos, a imensa maioria da população do planeta ficará tão ou mais exposta que hoje, em um mundo cada vez mais interconectado.
Se não se eliminam as medidas econômicas coercitivas, motivadas por razões políticas, contra países em desenvolvimento, e se estes não forem exonerados da agoniante e impagável dívida externa e liberados da tutela impiedosa das organizações financeiras internacionais, não se poderá confiar na ilusão de que haverá uma melhor capacidade de resposta às desigualdades econômicas e sociais, que, mesmo sem pandemia, matam milhões a cada ano, sem discriminar crianças, mulheres ou anciãos.
A ameaça à paz e à segurança internacional é real, e as agressões constantes contra determinados países a agravam.
É muito difícil esperar que o eventual fim da pandemia leve a um mundo mais justo, mais seguro e mais decente, se a comunidade internacional, representada pelos governos de cada país, não se apressar, a partir de agora, a conciliar e adotar decisões que, até o momento, são obstinadamente evitadas.
Ficará também a incerteza sobre quão preparada estará a humanidade para a próxima pandemia.
Ainda é tempo de atuar e de mobilizar a vontade dos que hoje têm a responsabilidade de fazê-lo. Deixar para as futuras gerações,poderá ser tarde demais.
Havana, 16 de abril de 2020
Edição: Luiza Mançano