MP 905

Centrais sindicais repudiam votação de "Contrato Verde e Amarelo" e pedem negociação

Para especialista do Diap, medida “segue a lógica da bolsa-patrão”; aprovada na Câmara, MP segue agora para o Senado

Brasil de Fato | Brasília (DF) |

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MP 905 cria o chamado “Contrato Verde e Amarelo”, com redução de encargos trabalhistas - Marcello Casal Jr/Agência Brasil

Em uma nota pública coletiva, as centrais sindicais repudiaram, na tarde desta quarta-feira (15), a aprovação da Medida Provisória (MP) 905 pela Câmara dos Deputados. Conhecida como “MP do Contrato Verde e Amarelo”, a proposta amplia a reforma trabalhista e foi votada na noite de terça (14), sob intensos protestos da oposição, ao longo de quase 12 horas de debate e diferentes tentativas de obstrução da votação.

A medida passou a valer provisoriamente em novembro do ano passado, quando foi assinada pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Agora, deputados e senadores alinhados ao governo tentam garantir a aprovação da MP no Congresso Nacional até a próxima segunda-feira (20) para que ela não perca validade. Aprovada nessa terça (14) pela Câmara, a proposta segue, agora, para o Senado.

Desde novembro, a MP vem sendo alvo de uma dura queda de braço no Congresso Nacional. A disputa envolve parlamentares de oposição, centrais sindicais, entidades que reúnem especialistas do campo jurídico, empresários e outros setores aliados do governo.

Na nota direcionada à imprensa, as organizações sindicais destacam o fato de não terem sido ouvidas no processo de tramitação da matéria, que, em meados de março, foi votada na comissão mista a portas fechadas e sem acompanhamento da sociedade civil organizada.

“A aprovação dessas medidas que afetam diretamente a classe trabalhadora sem diálogo ou consulta às centrais e demais entidades sindicais é mais um ataque à democracia. A pretexto de reduzir encargos trabalhistas para empresas e, assim, estimular a geração de empregos, o programa, na verdade, visa eliminar os direitos trabalhistas e benefícios como o FGTS”, diz o texto.

No documento, as entidades pedem que o Congresso Nacional abra uma mesa de negociação com a classe empresarial e os sindicatos para tratar da votação da MP no Senado, onde a medida será analisada a partir de agora. Como o prazo de validade da MP se encerra na próxima segunda (20), a tropa de choque do Planalto no Legislativo corre contra o tempo para tentar orquestrar a última votação às pressas e evitar uma derrota empresarial e governista. 

O documento das entidades sindicais é assinado por lideranças de dez organizações: Central Única dos Trabalhadores (CUT), Força Sindical, União Geral dos Trabalhadores (UGT), Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Nova Central Sindical de Trabalhadores (NCST), Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB), Intersindical, Central Geral dos Trabalhadores do Brasil (CGTB), CSP-CONLUTAS e Intersindical.

Especialistas

Passadas algumas horas da votação da MP na Câmara, especialistas que acompanham o tema ainda tentam processar o conteúdo que resulta da aprovação da proposta, que não foi disponibilizado no site da Casa até o fechamento desta matéria. Como as sessões de votação vêm geralmente acompanhadas de um processo de negociação em constante movimento e a apreciação da matéria se deu de forma atropelada e por meio de um processo de votação remota, mesmo entre deputados e assessores técnicos restaram dúvidas ao final sobre o detalhamento dos pontos aprovados. 

De modo geral, o texto cria o chamado “Contrato Verde e Amarelo”, que é destinado à contratação de jovens com idade entre 18 e 29 anos. Após as articulações na Câmara, o relator incluiu ainda na regra pessoas com mais de 55 anos que estão há mais de 12 meses sem emprego e trabalhadores rurais. Nesse tipo de modalidade, os contratos devem prever um teto de até um salário mínimo e meio, o equivalente a R$ 1.567,50.   

A MP traz diferentes mudanças para a relação entre patrão e empregado e prevê redução de encargos trabalhistas para o empregador. Entre as alterações, está a diminuição da indenização do FGTS para demissões sem justa causa. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), ainda em vigor, prevê multa de 40%, enquanto o texto de Bolsonaro fixava uma alíquota de 20%. A tarifa proposta pelo relator da MP, Christino Áureo (PP-RJ), chegava a 30%, mas, nas negociações, a oposição conseguiu baixar para 20%.  

O parecer aprovado pelo plenário prevê que o valor poderá ser pago de forma parcelada, mensalmente ou em outro intervalo de tempo, após acordo direto entre patrão e empregado. Para entidades de juristas que acompanham o tema, a novidade vem de encontro às necessidades criadas pelo contexto de agravamento na crise no país por conta do coronavírus.

“Chega a ser indigna essa aprovação enquanto a classe trabalhadora está alarmada com essa questão da covid-19, gerando mais insegurança jurídica ainda e, mais uma vez, sem o diálogo social”, disse ao Brasil de Fato a presidenta da Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas (Abrat), Alessandra Camarano.

O texto também autoriza o parcelamento mensal do 13º salário e do pagamento referente às férias, que poderão ser diluídos no salário mensal. Outra mudança diz respeito à taxação do seguro-desemprego, que a MP previa como obrigatória. Pelo texto aprovado, ela será opcional e, caso o trabalhador queira que o período de recebimento do seguro seja incluso nos cálculos para a aposentadoria, deverá pagar 7,5% de alíquota.

As empresas também ficam livres das contribuições destinadas ao Sistema S. Segundo dados publicados pela Agência Câmara, a soma total das reduções de encargos para o patronato sobre a folha de pagamento chega a 70%. Na versão anterior do relatório aprovado em uma comissão mista, o percentual era de 94%.

“É claro que, na negociação do processo legislativo, sempre há algumas melhorias, mas elas são tão diminutas que a medida provisória ainda tem a lógica da bolsa-patrão”, critica o analista político Marcos Verlaine, do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap).   

A MP ainda não tem data para ser votada no Senado.

Edição: Vivian Fernandes