Um imóvel localizado na comunidade Santa Catarina, do bairro Potengi (Zona Norte de Natal), se tornou espaço de brigas judiciais entre moradores da região e um empresário. Isso porque o local, que originalmente fazia parte da empresa estatal Companhia de Processamento de Dados do RN (Datanorte), foi leiloado pelo Ministério Público Federal (MPF), em 2017, apesar de uma associação de moradores ocupar o prédio há mais de 30 anos.
Habitado em 1981, após uma associação de costureiras e artesãos solicitar concessão de uso do espaço à extinta Secretaria de Trabalho e Bem-Estar Social do Estado, o imóvel foi desempenhando todo um papel social na comunidade, sendo frequentado cada vez mais pelos moradores, que, aos poucos, realizaram reformas e fundaram a Associação de Mulheres do Santa Catarina.
Passados os anos, um acúmulo de dívidas trabalhistas da Datanorte fez com que o Tribunal Regional do Trabalho da 21° Região (TRT-RN) determinasse uma multa por não pagamento dos causos. Devido à falta de recursos financeiros, o MPF penhorou, em 2011, o imóvel e, após duas tentativas, leiloou o prédio em 2017.
“O prédio foi a leilão, e uma das coordenadoras da associação entrou com uma liminar para impedir, depois ocorreu novo leilão, entraram com outra liminar e de novo não aconteceu. Quando foi em 2017, colocaram novamente um terceiro leilão sem avisar a ninguém”, explica Antônia da Silva, artesã, uma das fundadoras da Associação e uma das primeiras a ocupar o espaço.
Com o imóvel leiloado, os moradores foram pegos de surpresa com um empresário afirmando ser o novo proprietário, pedindo um aluguel para as pessoas se manterem lá, e ameaçando que caso não fizessem, iria solicitar uma ordem de despejo. A associação entrou na justiça, onde o processo durou mais dois anos, até que, no dia 11 de outubro, o empresário chegou ao local com uma ordem imediata de despejo dos moradores que ali estavam.
“Eles poderiam ter nos avisado desse leilão, mas ninguém sabia. É uma perda grande para muitas pessoas, e não temos onde colocar nossas coisas. Nós temos mesas, cadeiras, todo material de trabalhar. Temos máquinas industriais caras, e a gente vai colocar onde?”, questiona a artesã angustiada.
Moradores da região realizaram protestos contra a decisão de despejo. Foto: Kennet Anderson.
Após a ordem de despejo, a Associação solicitou uma reunião com o juiz do Trabalho da 4º Vara da Comarca de Natal, Manoel Medeiros Soares de Sousa, que suspendeu, temporariamente, a remoção imediata de despejo, para analisar a petição de defesa dos moradores.
“Elas pedem a suspensão da ordem do despejo, em razão de não terem sido notificadas quanto ao leilão, porque deveriam ter prioridade numa possível venda do imóvel. Coloca-se também em discussão a legalidade da realização do processo, pois foram os embargantes que custearam toda a manutenção do prédio ao longo desse tempo”, aponta a advogada do mandato da vereadora Divaneide Basílio (PT), Allyne Macedo, que acompanha o caso.
Além disso, alguns moradores também apontaram a invalidez do leilão devido aos ocupantes do espaço terem uma concessão de uso do local. Contudo, a gerente do Departamento de Patrimônio da Datanorte, Maria de Lurdes de Oliveira, afirma que tal concessão já estava vencida.
“O prédio estava penhorado desde 2011, por isso não foi renovada a concessão. Estava sendo ocupado gratuitamente, mas irregularmente”, explica.
Importância
O prédio foi inicialmente construído pela Datanorte para ser um centro comercial comunitário, por isso ele é composto por 20 boxes que, atualmente, abriga a Associação de Mulheres do Santa Catarina, o Conselho Comunitário, e alguns outros moradores que oferecem pequenos serviços, como corte de cabelo, artesanato e bazar.
Por meio da Associação, serviços gratuitos são oferecidos à população da comunidade. Cerca de oito formações são realizadas por ano, com 40 pessoas em média. Contudo, todas as atividades estão paradas pelo impasse judicial.
“As mulheres vêm aqui para trabalhar, aprender o artesanato, e gerar sua própria renda. A associação oferece cursos e encaminhamos as pessoas para serem instrutoras do Senac, do Sebrae, e do próprio Estado. Nossa cultura é o artesanato, então se a gente sair desse prédio acabou tudo. Não temos para onde ir”, lamenta Antônia da Silva.
Edição: Isadora Morena