Liberdade de expressão

Relatório do Intervozes denuncia crescimento da violência contra jornalistas

Em publicação que reúne destaques de 2018, o coletivo chama atenção para banalização do ódio e outros temas   

Brasil de Fato | Brasília (DF) |

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Agressões a jornalistas se inserem no contexto avanço conservador do país e têm levado a diferentes protestos por parte da categoria
Agressões a jornalistas se inserem no contexto avanço conservador do país e têm levado a diferentes protestos por parte da categoria - Fernando Frazão/Agência Brasil

Ataques a comunicadores estiveram entre os principais destaques de 2018 no que se refere ao panorama do direito à comunicação no Brasil. Segundo levantamento da Press Emblem Campaign (PEC), entidade com sede na Suíça, o país ficou em oitavo lugar no ranking mundial dos assassinatos de profissionais da área, com quatro mortes registradas. Entre 2014 e 2018, foram 22 casos. O Brasil divide o topo da lista com países como Síria, México, Afeganistão e Iraque.

A informação foi um dos destaques apresentados pelo Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social no relatório “Direito à Comunicação no Brasil – 2018”, lançado nesta sexta-feira (25), em Brasília (DF).

Entre outras coisas, o documento destaca ainda uma pesquisa da ONG Artigo 19 segundo a qual 70% dos crimes contra comunicadores foram praticados ou encomendados por agentes públicos, especialmente políticos e policiais.

“A partir das eleições de 2018, a gente nota um acirramento da polarização, uma maior violência física e verbal contra os comunicadores, principalmente, contra comunicadores de rádios comunitárias, blogueiros, jornalistas de pequenos veículos independentes”, aponta o jornalista Luciano Gallas, membro do Intervozes.  

Ele acrescenta que o problema suscita preocupações no que se refere à garantia das liberdades de imprensa e de expressão, acarretando danos de ordem sistêmica para a democracia brasileira.  

“Não é um ataque só contra a pessoa do comunicador. É um ataque também à própria democracia, à liberdade de manifestação e à própria possibilidade de o país aprender com seus equívocos. A partir do momento em que se trata com violência física, emocional, verbal os comunicadores, se está colocando obstáculos graves à circulação de ideias na sociedade, se está inviabilizando o debate, o surgimento do diferente, do contraditório na produção jornalística na comunicação como um todo. E isso significa enganar a democracia”, analisa.  

Conforme já apontado em levantamentos feitos por outras organizações, as manifestações de ódio na internet e nas ruas do país figuram entre os pontos de realce trazidos pelo estudo do Intervozes. O material ressalta a violência durante o período eleitoral, quando pelo menos 70 ataques foram denunciados, segundo dados levantados pela Agência Pública em parceria com a Open Knowledge Brasil.

Desse total, 50 foram praticados por apoiadores declarados do então candidato a presidente Jair Bolsonaro (PSL), seis foram dirigidos as eleitores do pesselista e outras 15 agressões foram consideradas indefinidas.

De acordo com o Intervozes, quando se olha para a questão da banalização do ódio, é possível afirmar que os atos de hostilidade têm um destino já conhecido: negros, indígenas, quilombolas, entre outros, mas especificamente mulheres negras.

A compilação feita pela entidade cita um levantamento do pesquisador brasileiro Luiz Valério Trindade, que estudou o tema. Ao analisar 109 páginas e 16 mil perfis no Facebook, além de 224 artigos jornalísticos publicados entre os anos de 2012 e 2016, ele constatou que cerca de 80% dos discursos de ódio verificados eram destinados a mulheres negras.

“O caso da vereadora Marielle Franco também mostra muito isso porque, além da questão da atuação dela contra as milícias no Rio de Janeiro, também perpassa a perseguição que ela vinha sofrendo e o crime que ela sofreu o fato de ela ser uma mulher militante, mulher, negra, oriunda das comunidades e que tinha essa postura corajosa de se colocar contra a ordem constituída”, sublinha Gallas.

Telecomunicações

O relatório chama atenção ainda para uma série de outros problemas, como é o caso da falta de universalidade dos serviços de telecomunicação e acesso à internet no país, previsto no Marco Civil da Internet.

Dados consolidados pela consultoria Teleco a partir de informações de outras instituições, como a Agência Nacional de Telecomunicações e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostram que, em janeiro deste ano, havia apenas 31,2 milhões de assinantes de banda larga no país. Cerca de 27% dos brasileiros consideram que o serviço ainda é pouco acessível por ter preço elevado.

Como consequência, os números trazem um recorte de classe social: cerca de 30% dos domicílios de classes D e E têm internet no Brasil, enquanto, nas classes A e B, os percentuais são de 99% e 93%, respectivamente.  

“As políticas públicas elaboradas pelo Brasil ainda não apresentaram remédios eficientes na tentativa de ampliar o acesso a isso, que tem muito a ver com o direito humano à comunicação”, assinala o jornalista Marcos Urupá, do Intervozes.  

Relatório

O documento aborda ainda outros temas, como a proteção de dados, os benefícios eleitorais capitalizados por donos de rádio e TV, a desinformação e a veiculação em massa das chamadas “fake news”, entre outros. O material completo pode ser acessado virtualmente neste link.

Edição: Rodrigo Chagas