No pacote de privatizações anunciado pelo governo Bolsonaro foram relacionadas duas grandes empresas de tecnologia da informação, a Serpro e a Dataprev. O Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro) lida com todas as informações fiscais do Brasil, ou seja, 30 milhões de declarações anuais de imposto de renda de pessoa física, 60 milhões de isentos, toda a movimentação das empresas do país, todos os dados dos condutores de veículos do Brasil, veículos e seus proprietários, toda mercadoria importada ou exportada, as atividades dos navios em todos os portos brasileiros, toda a movimentação das contas públicas do Governo Federal, registro e pagamento de salários de mais de 4 milhões de funcionários federais, todas as compras públicas da união e de vários estados e municípios.
A Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência (Dataprev) é responsável pelas informações e sistemas relacionados ao pagamento de benefícios da Previdência Social, o que representa um universo de aproximadamente 35 milhões de benefícios mensais. Além disso, processa todas as informações relativas ao seguro desemprego, empréstimos consignados dos usuários do INSS, registro de óbitos de todo o país, entre muitos outros dados importantes do mundo do trabalho e previdência.
Ou seja, falamos de empresas que processam informações estratégicas do governo, das empresas e dos cidadãos brasileiros. A pergunta que se impõe: a quem interessa a privatização destas duas empresas públicas federais da área de tecnologia da informação? Certamente, não interessa à soberania nacional, a um projeto de Nação e à privacidade dos brasileiros. Uma eventual privatização do Serpro e da Dataprev daria ao grupo vencedor o poder absoluto de manipular bases de dados relacionadas a todas as atividades do país, com um poder destrutivo inimaginável, que colocaria em risco não apenas as relações econômicas e sociais, mas a própria democracia.
Mais do que prestar serviços de informação, a grande razão para um grupo querer comprar o Serpro e a Dataprev seria a posse de poderosas bases de dados que lhe permitiriam, sem exagero, controlar e ou interferir em questões estratégicas para o país. O Estado brasileiro ficaria à mercê deste novo fornecedor, em uma área muito sensível para se criar dependência tecnológica. Quando nos submetemos a uma tecnologia, não só ficamos dependentes deste fornecedor, mas também transferimos a ele as possibilidades futuras de atender novas necessidades.
Uma empresa que tem como seu único cliente, no caso o seu proprietário, o Estado brasileiro, deve ser vista pelo quanto de retorno oferece a seu povo. Durante os governos Lula e Dilma, a Serpro tornou-se uma referência mundial em desenvolvimento tecnológico ao utilizar padrões abertos e software livre, com mais de 600 serviços operando nesta modalidade. Esta prática tornou possível à Receita Federal do Brasil distribuir os programas para elaboração do imposto de renda de pessoa física para 30 milhões de brasileiros, sem risco de violação autoral ou de propriedade intelectual.
Foi o caso do e-social da empregada doméstica, que apesar de não se sustentar economicamente para o Serpro nos primeiros anos, viabilizou a garantia de direitos e o efetivo pagamento aos trabalhadores e trabalhadoras do setor. Só no primeiro ano foram aproximadamente três milhões de pessoas beneficiadas. Qual empresa privada agiria assim?
O Serpro e a Dataprev representam um patrimônio do qual o povo brasileiro não pode abrir mão. Não se trata apenas de conservar suas estruturas físicas ou patrimoniais, mas principalmente garantir a autonomia tecnológica e a segurança dos dados de todos nós. É uma questão de soberania nacional.
*Henrique Fontana (PT-RS)
Edição: João Paulo Soares