A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou, na tarde desta terça-feira (1º), por 17 votos a nove, o relatório do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) sobre a reforma da Previdência, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 6/2019.
A comissão havia dado aval ao texto-base da proposta no mês passado e a fase de tramitação encerrada nesta terça diz respeito à avaliação de emendas (sugestões de alteração) ao parecer. O colegiado rejeitou as mudanças propostas por opositores e a PEC deve ser votada no plenário do Senado ainda nesta terça.
A sessão, no entanto, não se deu sem críticas à medida, que se baseia em um discurso de caráter fiscalista. Governo e aliados argumentam que a proposta deve trazer uma economia de R$ 876 bilhões em dez anos. A tropa governista também afirma que a medida irá ajudar a movimentar a economia.
“Ela não vai resolver todos os problemas, mas é o início de uma caminhada que precisa ser feita para retomar o crescimento”, disse Jereissati (PSDB-CE).
O argumento foi, mais uma vez, questionado por opositores. O senador Fábio Contarato (Rede-ES) classificou a PEC como “perversa”. Tecendo uma comparação com outras medidas aprovadas pelo Legislativo nos últimos anos, ele disse que a proposta aprofunda os prejuízos para as classes mais populares.
“Nada é tão ruim que não possa piorar, e piorou. Essa reforma surge tendo como pano de fundo o discurso de combater privilégios, mas não combate nada disso. Eu ainda não era político quando presenciei, em 2017, o mesmo canto da sereia de ‘vamos gerar emprego e renda’ quando aprovaram a reforma trabalhista, o trabalho intermitente. Tudo com o discurso de combater privilégio. Privilégio de quem?”, criticou, acrescentando que cerca de 50 empresas do agronegócio devem, juntas, R$ 200 bilhões em tributos ao país.
“Não é possível que, num país com tanta pobreza e tanta desigualdade, esta Casa vai penalizar justamente aqueles que ganham menos. Não há privilégio pra quem ganha dois, três ou quatro salários mínimos, por exemplo”, protestou Rogério Carvalho (PT-SE), vice-líder do PT.
Voto em separado
Logo do início da sessão, o oposicionista Paulo Paim (PT-RS) apresentou um voto em separado – parecer alternativo apresentado para demarcar oposição ao voto do relator de uma determinada proposta. Ele sugeriu diversas alterações no texto de Jereissatti, com destaque para a redução da renda estipulada para o acesso ao abono salarial.
Um trecho da PEC altera o artigo 239 da Constituição Federal e diminui de R$ 1.996 para R$ 1.364,43 o teto salarial de referência para a concessão do benefício. No voto em separado, Paim apontou que a mudança deve deixar 12,7 milhões de trabalhadores de fora da cobertura do abono.
O petista destacou que países que tomaram decisões fiscais semelhantes à PEC 6 passaram a viver situações econômicas e sociais complexas, como é o caso do Chile.
“Essa reforma prejudica o passado, o presente e o futuro. O pessoal da Argentina não está conseguindo explicar a reforma que foi feita lá e por isso está perdendo as eleições. Tudo indica agora que o Macri vai perder”, disse, em referência ao governo neoliberal de Mauricio Macri, que aprovou uma reforma de perfil similar no final de 2017.
O governo argentino gestão está imerso em críticas por conta do aumento da taxa de pobreza, que chegou a 35,4% da população no primeiro trimestre deste ano, segundo medição do Instituto Nacional de Estatística e Censo (Idec) do país. É o maior índice desde quando Macri chegou ao poder, em 2015.
Emendas
O abono salarial também foi tema de uma das principais emendas de bancada. Proposta pelo PDT, a Emenda 555 pediu a rejeição da mudança.
Citando cálculos do economista Daniel Ferrer, do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o senador Weverton (PDT-MA) disse que o impacto causado por esse ponto será maior em estados com salários mínimos regionais, podendo atingir 72% dos atuais beneficiários de Santa Catarina, por exemplo. Em São Paulo, a projeção indica um alcance de 70,1% dos trabalhadores que recebem o abono, o que significa um montante de 4 milhões de pessoas.
“Essa proposta é desumana”, criticou Weverton. A emenda acabou sendo rejeitada por 15 votos a dez. O líder do governo, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), argumentou que a eventual aprovação reduziria “a potência fiscal” da PEC.
Emendas que tratavam da aposentadoria integral para casos de invalidez e aposentadorias especiais, como é o caso dos trabalhadores que lidam com agentes considerados nocivos, também foram rejeitadas pela CCJ. “Precisamos proteger a sustentabilidade da Previdência brasileira”, repetiu Coelho, sob protestos de opositores.
“Quem descobriu a insalubridade no trabalho foi a ciência. É provado que trabalhadores de minas, trabalhadores da saúde que se expõem a bactérias e vírus, entre outros, precisam se aposentar com menor tempo de trabalho”, argumentou a senadora Zenaide (Pros-RN), ao defender a aprovação da emenda, que acabou rejeitada por 15 votos a 11.
Entre os partidos que votaram com o governo e contra a emenda, estiveram PSDB, Progressistas e PSC. Já PSB, PDT, PT e outros votaram a favor.
Plenário
Em aceno ao mercado financeiro, principal ator interessado na reforma, senadores do governo e aliados articulam para esta terça-feira a votação de primeiro turno da PEC no plenário da Casa. A velocidade no trâmite também foi um dos pontos altos dos debates na sessão.
“Eu quero refletir mais sobre esse tema, por isso acho que não podemos ter pressa. Não são só detalhes. Estamos falando da vida de milhões de pessoas”, protestou Paim.
O senador Weverton comparou a conduta da tropa de choque do governo com a atuação parlamentar do presidente Jair Bolsonaro (PSL) quando este era deputado federal. Na época, o pesselista fazia oposição à proposta.
“Quero lembrar que o presidente da República passou 28 anos aqui dentro e nunca deu prioridade a esta reforma. Por que a gente, com oito meses de mandato, acha que está maduro o suficiente pra mudar a vida das pessoas desse jeito?”, criticou.
Edição: João Paulo Soares