Ola Bini é um desenvolvedor e ativista mundialmente reconhecido como um dos maiores especialistas em segurança digital do mundo. Trabalhou em uma série de projetos envolvendo tecnologias de uso, desenvolvimento livre e aberto, e o direito à privacidade.
Nasceu Suécia mas tem autorização para viver e trabalhar no Equador, onde fundou o “Centro de Autonomia Digital”, organização que desenvolve ferramentas de segurança digital acessíveis a movimentos sociais e ao público em geral.
Nas últimas décadas, o Equador adotou políticas importantes de desenvolvimento de tecnologias informáticas baseadas em princípios do software livre, da inclusão digital e da soberania tecnológica, tendo atraído uma série de pesquisadores e ativistas desse ramo.
Em abril de 2019, Ola Bini foi preso pelas autoridades equatorianas sob a acusação de ter realizado “interferência na integridade de sistemas computacionais”, delito enquadrado como crime no ordenamento jurídico local. A prisão aconteceu no mesmo dia em que o país revogou o asilo concedido a Julian Assange, fundador do WikiLeaks, que vivia na embaixada equatoriana em Londres há sete anos.
Ainda segundo informações apuradas pela Electronic Frontier Foundation e pela Anistia Internacional, a ordem de prisão direcionada a Ola Bini, na verdade, fazia referência a um “hacker russo” e foi emitida poucas horas após uma declaração feita pela Ministra do Interior, María Paula Romo, na qual afirmou que havia outro membro da WikiLeaks no país trabalhando em um plano de desestabilização do governo.
Bini é amigo de Julian Assange, pois ambos fazem parte de uma restrita comunidade de técnicos com muito conhecimento nesse campo. No entanto, ao contrário da declaração feita pela ministra, o sueco não integra o WikiLeaks e, até o presente momento, a acusação não foi capaz de demonstrar provas sólidas de que Bini tenha qualquer envolvimento com interferências realizadas em sistemas computacionais de autoridades equatorianas.
Tendo em vista a ausência de documentos probatórios e de uma denúncia consistente que baseassem a suposta interferência causada pelo desenvolvedor, a promotoria solicitou a alteração do delito que fundamenta a persecução, adicionando duas novas acusações contra o ativista em agosto, afirmando que o mesmo estaria envolvido em irregularidades fiscais e tráfico de influência. Bini atualmente encontra-se em liberdade, mas aguarda apreciação de seu caso pelo judiciário equatoriano.
Porém, diferentemente do apontado pelo governo, o trabalho realizado por Bini como desenvolvedor e defensor de causas como a privacidade e segurança digital é exatamente o oposto das conotações negativas associadas à noção de “hackear” no sentido de interferir na integridade de sistemas computacionais.
Enquanto esse tipo de ação teria como objetivo a exploração maliciosa de falhas de segurança e acesso a informações privadas em busca de vantagens pessoais ou corporativas, as atividades de Bini baseiam-se justamente na busca por soluções para lacunas de segurança e proteção da privacidade nos elos mais frágeis do ecossistema digital.
Ao mesmo tempo em que as tecnologias de informação e comunicação representam uma poderosa ferramenta para a disseminação de conhecimento, elas também possibilitam a criação de inúmeros mecanismos de vigilância e controle de condutas por parte de agentes públicos e privados. O trabalho de Bini, em boa parte, é alertar a sociedade sobre esses mecanismos, entendê-los e desenvolver alternativas que atendam o exercício de direitos fundamentais individuais e coletivos.
Nesse contexto, a luta por privacidade e segurança digital conduzida por Ola Bini em sua organização no Equador representa uma importante ferramenta de empoderamento e proteção dos cidadãos frente ao desenvolvimento de tecnologias que ameaçam os direitos humanos e a liberdade dos usuários na rede. Ou seja, seu trabalho está ligado à proteção dos cidadãos frente aos aparatos de violação de direitos aprimorados pelas novas tecnologias de informação e comunicação.
O caso de Ola Bini, apesar de conter diversas peculiaridades, não é uma ocorrência isolada da criminalização de ativistas do direito à privacidade e segurança da Internet. Assim como o sueco, outros representantes da luta contra a vigilância e defesa do direito à privacidade já foram alvo de perseguição estatal, como Aaron Schwartz, Chelsea Manning, Edward Snowden e até mesmo o próprio Julian Assange.
A criminalização de ativistas dos direitos digitais, portanto, não representa apenas a perseguição a indivíduos com conhecimentos técnicos acima da média sobre computação, mas é um tipo de ação que atenta diretamente contra a defesa do direito à privacidade e segurança na internet.
Edição: Daniela Stefano