Março é o mês em que o MST, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra/RS, celebra os resultados da cadeia produtiva de arroz orgânico. Para isso, promove a Festa da Colheita do Arroz Agroeocológico. A 16ª edição acontece no próximo dia 15, a partir das 8h30, no Assentamento Santa Rita de Cássia II, em Nova Santa Rita, região metropolitana de Porto Alegre.
O assentamento que sedia a festa ganhou destaque pela organização coletiva e produção de alimentos livres de agrotóxicos. Porém, foi longo o percurso até que a fazenda então pertencente ao Montepio da Família Militar fosse destinada à reforma agrária. Conforme a assentada Gabriela Souza, a ocupação ocorreu em 22 de abril de 2004, quando cerca de 400 famílias do MST entraram no local abandonado. “Nosso objetivo era combater o latifúndio e mostrar à sociedade a violência produzida pelo agronegócio através da exploração dos seres humanos e da natureza”, explica.
Hortas destruídas
Ao final do mesmo dia, os agricultores foram despejados pela Brigada Militar. Segundo o camponês José de Almeida, sem ter para onde ir e debaixo de chuva, os acampados ficaram desprovidos de abrigo e comida. No dia seguinte, as famílias acamparam em frente à fazenda, nas margens da BR-386. Permaneceram ali por um ano e 8 meses até serem assentadas, enfrentando as mais diversas dificuldades. A começar pelo fato de que policiais e seguranças contratados destruíram todas suas tentativas de semearem uma horta e pequenas lavouras para matar a fome.
O sonho da terra levou as famílias a marchas, ocupações de prédios públicos e negociações com diversos órgãos. Impediram, até mesmo, o leilão da área. Em outubro de 2005, relembra Almeida, o Ministério Público autorizou os Sem Terra a entrarem na fazenda. Mas só seis meses depois o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) permitiu a ocupação definitiva dos lotes.
Criação do assentamento
O Assentamento Santa Rita de Cassia II foi criado em 20 de outubro de 2005, numa área de 1.667,33 hectares. No local vivem 101 famílias. Chegaram ao assentamento sem recursos, e tiveram que aprender novas culturas e a lidar com diferentes condições de solo. Ainda encararam a falta de transporte coletivo, água e infraestrutura, e carência de atendimento em saúde. Hoje todas as casas têm acesso a estradas, água potável, energia elétrica, saúde e transporte.
Os assentados se organizam de forma coletiva e em grupos de produção. O cultivo de arroz 'de base agroecológica iniciou em 2008. Hoje envolve cerca de 500 hectares nos lotes do assentamento. As famílias operam em grupos gestores do arroz agroecológico, das hortas e do leite. Lidam com frutas, peixes e mel, entre outros produtos para autoconsumo. O excedente é comercializado em feiras ecológicas, mercados tradicionais, Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) e Programa de Aquisição de Alimentos (PAA)
Famílias garantiram o direito à saúde e educação
A Estratégia Saúde da Família Marisa Lourenço da Silva foi inaugurada em 29 de setembro de 2014, na antiga sede da fazenda do MFM. A novidade tornou-se possível graças à organização da comunidade, que a construiu com recursos próprios e contrapartida da prefeitura. No local, também há uma horta comunitária com plantas medicinais. A ESF conta com profissionais do programa Mais Médicos, enfermagem, dentista e agentes comunitários, que atendem 2,4 mil pessoas assentadas e agricultores do município.
As famílias também fundaram, há cinco anos, a Associação 29 de Outubro, para discutir questões coletivas e reforçar a defesa do território conquistado e da produção de alimentos saudáveis. O assentamento tem área para atividades regionais e espaço de lazer. No campo da educação, jovens conquistaram diplomas em cursos superiores e técnicos via Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera).
Almeida reforça que tudo o que foi conquistado pelas famílias até o momento é resultado da luta coletiva. “A gente deve muito à capacidade que o MST tem de organizar pobres do campo para lutar por Reforma Agrária”, conclui.
Este conteúdo foi originalmente publicado na versão impressa (Edição 11) do Brasil de Fato RS. Confira a edição completa.
Edição: Marcelo Ferreira