Não é de hoje que a grande imprensa brasileira toma partido e interfere em processos eleitorais no Brasil. O caso mais famoso ocorreu em 1989, a dois dias do segundo turno eleitoral, quando a Rede Globo de Televisão editou um debate entre Luiz Inácio Lula da Silva e Fernando Collor de Mello, descontextualizando falas de Lula e exaltando as frases ditas por Collor.
Em 2014, às vésperas do segundo turno, a revista Veja, da editora Abril, lançou uma capa com a foto de Lula e a então candidata à reeleição, Dilma Rousseff, com a manchete: “Eles sabiam de tudo”.
Esta semana, a revista IstoÉ, da editora Três, incluiu na capa a montagem de um “cavalo de Troia”, onde se via o candidato do Partido dos Trabalhadores (PT), Fernando Haddad, e outros dirigentes petistas, com o título: “O cavalo de Troia mais óbvio da história”.
Três semanas antes, a mesma revista havia publicado capa com foto de Haddad e a seguinte manchete: “Haddad, o candidato de 32 processos”.
Diante de posicionamentos partidários tão explícitos, por que o jornal Brasil de Fato, edição especial, que trazia foto dos dois principais candidatos com a manchete “Você decide o futuro do Brasil”, foi o único meio de imprensa censurado durante o processo eleitoral de 2018?
Para Breno Altman, jornalista e fundador do site Opera Mundi, a relação do Judiciário com a campanha de Jair Bolsonaro aponta para um grave atentado à liberdade de informação.
“Há um claro desequilíbrio, o que comprova que a Justiça Eleitoral, em relação à campanha do Bolsonaro tem um tratamento nitidamente a favorecer o candidato do PSL. Essa comparação entre o tratamento dado à IstoÉ e ao Brasil de Fato é um bom exemplo disso, mas em várias outras questões, a Justiça Eleitoral tem protegido os crimes cometidos pelo Bolsonaro e por aqueles que o apoiam”, analisa.
Em nota, o deputado federal Rogério Correia (PT-MG) afirmou que o caso evidencia do fato de “que o Judiciário brasileiro tem partido”. “Tome-se como ‘partido’ tudo o que for contra as expressões populares do país. Se antes o judiciário perfilava-se sempre ao lado do PSDB, era porque os tucanos representavam melhor essa oposição às forças progressistas. Agora, com o PSDB à míngua, policiais, fiscais, juízes e promotores alinham-se ao bolsonarismo”.
No último sábado (20), o Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro (TRE-RJ) determinou a apreensão de 20 mil exemplares do jornal que estavam na sede do Sindicato dos Petroleiros do Norte Fluminense (Sindipetro-NF) na cidade de Macaé.
A ação foi expedida pelo juiz eleitoral do município, Sandro de Araújo Lontra, que qualificou o jornal como portador de “matérias pejorativas contra o candidato Jair Bolsonaro (PSL)”. A edição apresenta textos de conteúdo informativo sobre os programas de governo dos candidatos, assinados por profissionais da área.
Entidades e leitores se solidarizam
Desde o último sábado (20), quando foram apreendidos 20 mil exemplares da edição especial do jornal Brasil de Fato, na cidade de Macaé (RJ), o Brasil de Fato tem recebido mensagens de apoio de leitores e entidades da categoria.
Por e-mail, o leitor Eduardo Maass disse: “Numa época de mentiras universais, dizer a verdade é um ato revolucionário. Meus parabéns pela verdade, doa a quem doer”.
Na página do BdF no Facebook, a usuária Simone Paludo destacou: “Tempos sombrios e de ditadura e coiso ainda nem foi eleito”.
A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) divulgou nota condenando o que chamou de “ato de censura” por parte do TRE. “A Abraji repudia o recolhimento dos exemplares do Brasil de Fato, um ato de censura incompatível com o regime democrático do país. A ordem do juiz Sandro de Araújo Lontra viola a garantia constitucional da liberdade de expressão. Como tal, deve ser revertida e os jornais, devolvidos à circulação”, ressalta o comunicado.
Edição: Daniel Giovanaz