O candidato tucano à Presidência, Geraldo Alckmin, vem adotando um discurso ambíguo em relação à questão das armas durante a campanha.
Em sabatina realizada na Confederação Nacional da Agricultura (CNA), defendeu o “porte de arma facilitado” para produtores rurais, na mesma ocasião em que prometeu à reedição de medida provisória que impede por dois anos a desapropriação de terras ocupadas por sem terras, o que foi considerado com um grande aceno aos ruralistas e ao agronegócio.
Em um vídeo de campanha, por outro lado, diz que “não é na bala que se resolve”. O candidato apresenta uma série de assuntos, como: o desemprego, a saúde e a educação em um movimento que parece ser uma tentativa de atração dos eleitores menos extremistas de Jair Bolsonaro (PSL), defensor da revogação completa do Estatuto do Desarmamento.
Carolina Ribeiro, assessora sênior do Instituto Sou da Paz, aponta que o Estatuto, mais do que o desarmamento em si, instituiu mecanismos de controle das armas no país, permitindo inclusive que pessoas que vivem em lugares afastados tenham acesso à posse de armamento.
“Não é nem questão de falar em desarmamento, estamos falando de uma política de controle de armas. Quando se fala de revogar o Estatuto está se falando de revogar a legislação que estabelece controle sobre as armas. A última estimativa, de 2015, aponta que cerca de 160 mil vidas foram salvas com a aprovação do Estatuto. As pessoas que eventualmente vivam em lugar ermo, que comprovam necessidade e habilidade em portar um arma, até podem ter uma arma para sua defesa”, diz.
A estimativa, que conta no Mapa da Violência, foi realizada a partir da diferença entre a curva de homicídios até a aprovação do Estatuto e os índices verificados a partir dele. Ribeiro aponta ainda que o ano da aprovação da norma foi o primeiro de uma longa série que apresentou queda na taxa de homicídios, o que comprova a eficácia da lei, que precisa ser implementada em sua integralidade.
O Instituto Sou da Paz, em parceria com outras entidades, recentemente lançou a agenda “Segurança Pública é a Solução”, documento que tem apresentado às candidaturas presidenciais. O texto pede controle ainda mais rigoroso, por exemplo, no registro de munições e a integração dos bancos de dados da Polícia Federal e do Exército.
Isolete Wichinieski, da coordenação nacional da Comissão Pastoral da Terra (CPT), afirma que o cenário rural já é marcado por uma forte presença de armas, o que cria um cenário grave nos conflitos fundiários.
Além da tradicional pistolagem, empresas de segurança privada têm atuado, por exemplo, em remoções forçadas de acampamentos e até mesmo em homicídios de lideranças. Para Wichinieski, propostas focadas no armamento da população, mesmo que não se viabilizem, carregam um simbolismo que pode ter consequências concretas.
“A gente tem percebido que a violência tem aumentado. Se a gente pega os dados de conflitos no campo de 2017, por exemplo, 70% desses conflitos foram evidenciados pelo poder privado. Em 2017 foram 61 assassinados no campo. Desta perspectiva, o campo já está em um processo de armamento há muito tempo. Além de legitimar esse processo, [esse discurso] acaba incitando a violência”, afirma.
A escolha da candidata à Vice-Presidência por Alckmin, a então senadora ruralista Ana Amélia Lemos, do PP, foi vista como a primeira sinalização da campanha tucana a setores mais conservadores. Em 2010, quando foi eleita, a parlamentar gaúcha, que também integra a bancada da bala, recebeu de forma direta R$ 50 mil de financiamento da indústria armamentista - Forjas Taurus, Associação Nacional da Indústria de Armas e Munições (Aniam) e Companhia Brasileira de Cartuchos (CBC). Os valores podem ter sido maiores através de doações indiretas a comitês e ao próprio partido.
Edição: Katarine Flor