Os custos econômicos da criminalidade representam, anualmente, 4,38% do Produto Interno Bruto (PIB), a soma de todas as riquezas produzidas pelo país. Em 2015, o ônus econômico ao país chegou a alcançar a cifra de R$ 285 bilhões.
Os dados são do relatório Custos Econômicos da Criminalidade no Brasil, lançado no início desta semana e produzido pela Secretaria Especial de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da República.
Só com investimentos em segurança, seja pública ou privada, o país gasta 2,29% do PIB. O estudo também considera como gastos econômico da criminalidade os custos com encarceramento; danos materiais e seguros; perda produtiva; processos judiciais e com serviços médicos e terapêuticos.
Para o jornalista Bruno Paes Manso, pesquisador do Núcleo de Estudos sobre a Violência (NEV) da Universidade de São Paulo, os dados revelam que, seja a intervenção federal militar no Rio de Janeiro, seja o aumento dos investimentos na segurança pública, "o remédio usado não está sendo eficaz para o problema".
“Apesar do aumento grande dos gastos em segurança pública e privada e com os custos de presídios e do sistema penitenciário, não resolveu [os problemas] porque os crimes continuam aumentando. Ou seja, de alguma forma, isso mostra que alguma coisa está errada e que esses investimentos devem ser repensados”, analisou.
O estudo mostra que, entre 1996 e 2015, o custo da criminalidade avançou uma média de 4,5% ao ano. Lenin Pires, professor do Departamento de Segurança Pública da Universidade Federal Fluminense (UFF), afirma que este período é marcado pelo avanço de uma política econômica neoliberalismo e, consequentemente, pelo fortalecimento da segurança pública em detrimento de outros setores.
“O crescimento da desigualdade social demanda olhar mais dedicado aos dispositivos de segurança. Nos últimos anos, o que se tem mais aplicado em todas as regiões do país e orientado o governo federal é o aumento de recursos para área de segurança e quanto custos quanto perdas em função deste modelo de estado”, afirmou o professor.
Aumento dos homicídios
Mesmo com o crescimento dos investimento em segurança pública, o índice de homicídios no país subiu. O Brasil está entre os 10% de países com maiores taxas de homicídio do mundo.
Com 3% da população mundial, o país concentra, em contrapartida, 14% dos homicídios do mundo — com taxas de homicídio semelhantes às de Ruanda, República Dominicana, África do Sul e República Democrática do Congo.
Mas o relatório apontou que há disparidade entre as regiões do país.
São Paulo é hoje o estado com uma das menores taxa de homicídios da federação -- o número caiu de 27 para 10 homicídios para cada 100 mil habitantes entre 2005 e 2015. Por outro lado, algumas capitais a região norte e nordeste, como Belém (56), Salvador (51), Fortaleza (62) e São Luís (69), registraram taxas de homicídio superior a 50 mortes violentas por 100 mil habitantes.
Já o Rio de Janeiro, em tendência de queda da taxa de homícidios a partir dos anos 2000, voltou a piorar os indicadores, segundo Paes Manso, por conta da crise política e fiscal do estado.
Ele pondera que a queda das mortes violentas na região sudeste foi pressionada por estado paulista e que, na sua visão, se relaciona com um processo de “profissionalização” do tráfico de drogas na região.
“A diminuição dos homicídios e a organização do mercado de drogas em São Paulo significou, também, o aumento do lucro deste negócio”, explicou o pesquisador.
“São Paulo tem um mercado de droga muito forte, pouco violento e com capacidade e distribuição para o resto do Brasil, principalmente, a partir do momento quando passa a funcionar como uma agência reguladora do mercado de drogas. Nos outros estados, o crime chegou com a formação de grupos que passam a disputar um novo mercado emergente, o que começou a produzir instabilidades e conflitos.”
Sistema único
No dia 11 de junho, o presidente Michel Temer (MDB) sancionou o projeto que cria o Sistema Único de Segurança Pública (Susp) e a Política Nacional de Segurança Pública e Defesa Social.
A medida será coordenada pelo Ministério Extraordinário da Segurança Pública e busca integrar os órgãos de segurança e inteligência e padronizar informações, estatísticas e procedimentos.
Bruno Paes Manso ressaltou que a participação mais ativa da União na segurança pública é uma demanda histórica. “Os estados têm um papel importante, mas eles praticamente não conversavam entre si. Em vez de ficar fazendo incursões diárias nos bairros pobres, com a polícia militar, tem um papel de inteligência muito importante a ser feito para entender o funcionamento desta indústria da droga e fragilizar economicamente esses grupos.”
Entre 1996 e 2015, a participação da União nos gastos em segurança pública variou entre 10% e 19%, chegando ao seu valor máximo em 2010.
O pesquisador enxerga, no entanto, a sanção da proposta como movimento político para alavancar a popularidade do governo, depois da falha e equivocada intervenção federal militar no Rio de Janeiro.
“A velha política aposta na guerra ao crime e no aprisionamento e discute pouco a capacidade de diminuir ou regulamentar este mercado de drogas. É um passo importante que a gente vai ter que discutir em algum momento, e ao mesmo tempo acontece pouco meses antes da eleição. Então, [o Susp] é quase para sair na fotografia”, argumentou.
O professor Lenin Pires também avalia que a medida tem pretensões políticas e afirma que a proposta não rompe com a lógica neoliberal, que organiza o sistema de segurança para reprimir os “inevitáveis conflitos sociais”.
“O Sistema Único de Segurança como proposto pelo governo temer às pressas, é voltado unicamente para atender ao interesse eleitoral. É um golpe de mestre que envolve a intervenção no Rio”, finalizou.
Como conclusão, relatório elaborado pela SAE indicou que uma estratégia nacional para a segurança pública precisa considerar, também, as especificidades regionais em políticas públicas e os índices de violência.
Edição: Guilherme Henrique