A contaminação das águas da Baía de Todos-os-Santos, no estado da Bahia, tem afetado a vida das comunidades quilombolas que sobrevivem da pesca.
O último episódio ocorreu com o rompimento de um duto da Petrobras no município de Candeias, região metropolitana de Salvador, na última sexta-feira (8) à noite. O vazamento atingiu o rio São Paulo.
O Ministério Público do Estado da Bahia informou que vai instaurar um inquérito para apurar o ocorrido. Mas a liderança quilombola Eliete Paraguassu, moradora da Ilha de Maré, reitera que o caso não é isolado. Para ela, o processo de contaminação é resultado de um "modelo desenfreado de desenvolvimento", que ameaça as comunidades da região.
“No sábado [dia 9 de junho] os pescadores começaram a chegar com pedaços de petróleo nas redes. Mas ninguém sabia a dimensão desse acidente. Esse rio é de uma extensão de manguezal maravilhosa, muito produtiva. É uma das áreas mais importantes porque o mangue é berçário, consegue agregar muitos mariscos, de camarão a caranguejos.”
As comunidades denunciaram o vazamento por meio de um protesto na segunda-feira (11).
O terminal da Petrobras em Candeias é o principal ponto de escoamento da produção da Refinaria de Mataripe (RLAM), que abastece o estado de Sergipe e a região norte da Bahia.
Além da estatal, o local também atrai outras empresas pela proximidade ao Porto de Aratu, responsável por 60% de toda a carga movimentada por via marítima no estado.
Impactos ambientais
Nesta quarta-feira (13), a Petrobras vai se reunir com representantes das comunidades para dar explicações sobre o derramamento no rio São Paulo.
A empresa, por meio de nota, informou que, até a manhã da segunda-feira, cerca de 90% da área atingida por um vazamento de três metros cúbicos de "água oleosa” foi limpa pela equipe de contingência da companhia.
Segundo a petrolífera, "não houve danos às pessoas". O que Elite Paraguassu discorda. A liderança quilombola afirma que as populações do entorno da refinaria ainda sofrem as consequências de outro grande vazamento, ocorrido há nove anos.
“Em 2009, teve um acidente que transbordou os tanques da empresa que armazenava e se estendeu para toda a baía também. Essas comunidades sofreram com esse impacto que foi bem grande e, até hoje, não recebemos indenização; o meio ambiente ainda está danificado.”
Felipe Milanez, professor de Descolonização do Conhecimento, Sociedade e Ambiente na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), também contesta a resposta da empresa e cobra a existência de canais efetivos de comunicação.
"Esses 10% que ainda não foram limpos estão onde? No peixe de quem? É complicado este tipo de afirmação apressada da Petrobras, que mostra que o que está acontecendo ali também é uma disputa de narrativa entre as comunidades que vivem daquele ambiente e todas as empresas que fazem uso do Porto de Aratu", pontuou.
O pesquisador afirma que o processo de contaminação da Baía de Todos-os-Santos tem aumentado nos últimos anos, tanto por petróleo quanto por substâncias pesadas como o chumbo. Segundo ele, o conflito na região é latente.
"Tem um conflito entre o que é o técnico e o que é a experiência das pessoas que estão lá. Tradicionalmente, têm sido desconsideradas todas as contaminações que aconteceram e que estão acontecendo na Baía de Todos-os-Santos. Elas só não são mais invisibilizadas pelas lutas das comunidades quilombolas e pescadoras", explicou.
Eliete Paraguassu pondera que o derramamento de petróleo também é um caso de saúde pública: “A maior preocupação da gente é que a gente tem consumido esse pescado. É um produto que hoje não é mais seguro para gente comer, mas a gente não vai deixar de comer porque não temos opção”.
A prefeitura de Candeias multou a Petrobras em R$ 5 milhões por causa do vazamento de óleo no local.
As comunidades ponderam que o impacto ambiental não se restringe ao município, já que a região de maré possibilita a propagação das substâncias para outras regiões por meio das correntezas.
Edição: Juca Guimarães