Conhecidas como o “Caribe brasileiro”, as praias de Alter do Chão, distrito localizado no município de Santarém, no Pará, podem perder o atual ar bucólico que dá ao local ares de paraíso. Isso porque está em tramitação, na Câmara Municipal da cidade, o Projeto de Lei PL1621/2017, que pretende autorizar a construção de prédios de até 19 metros de altura.
Se aprovado o projeto (clique aqui para acessar), outras comunidades balneárias, como Ponta de Pedras, Tapary, Carapanari e Pajuçara também poderão ter construções verticais de até 19 metros. A orla fluvial do município não foi esquecida pelo projeto e a proposta, em análise pelos vereadores, prevê a construção de prédios de até 26 metros.
Além dessas alterações, segundo Layza Queiroz Santos, advogada popular na ONG Terra de Direitos, o projeto flexibiliza a regulamentação do uso do solo urbano e permite a atividade extrativista e mineral em áreas de Zona de Proteção Ambiental. Ela analisa o que pode estar por trás do projeto:“Ele traz uma série de mudanças muito grandes, que a correria de aprovação do projeto e a proposta do projeto nos dá a entender que ele está sendo construído para alegrar e beneficiar o mercado imobiliário e as grandes empresas de grandes empreendimentos”, diz.
Alter do Chão é considerada uma Zona de Proteção Ambiental. O ecoturismo é a atividade permitida na região e obras ligadas ao esporte e lazer precisam apresentar um projeto junto à Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade para aprovação, seguindo determinações da legislação ambiental estadual, municipal e/ou federal. Várias obras estavam sendo construídas em Alter do Chão e foram embargadas pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará (Semas).
Os Ministérios Públicos Estadual e Federal se posicionaram de forma contrária às alterações sugeridas pelo projeto. O procurador da república em Santarém, Luís de Camões Lima Boaventura, afirma que o PL apresenta diversos “vícios” e destaca dois como os mais graves:
“Os Ministérios Públicos, tanto o Estadual quanto o Federal, eles vislumbram vários vícios nesse projeto, mas eu acho importante destacar dois deles: um é a ausência total de qualquer estudo urbanístico e técnico acerca das consequências desse projeto de lei, só isso já é algo muito grave; o segundo vício relevante que a gente gostaria de destacar é a total ausência de participação da sociedade civil nessas discussões”.
A proposta é de autoria do vereador Antônio Rocha (PMDB). Em entrevista ao Brasil de Fato, o parlamentar afirmou que a proposta visa “corrigir o projeto passado”, referente à Lei Complementar de parcelamento, uso e ocupação do solo e resumiu o que trata o projeto no que se refere à Vila de Alter do Chão.
Comunidades tradicionais
"Nós tentamos apresentar esse projeto para tentar corrigir aquelas falhas do projeto passado, então o que é: construir sua casa, fazer o seu muro, vender bebida nos bares”, ressalta o vereador.
O Ministério Público do Pará em Santarém apresentou um documento contendo uma série de recomendações à Prefeitura e à Câmara de Vereadores e nele informa que o projeto “não acompanha estudos ou laudos técnicos que o embasem”. Ainda de acordo com o documento, caso o PL 1621 seja aprovado, “trará mudanças significativas na gestão do ordenamento territorial e ambiental do Município, com influência direta nos territórios de comunidades quilombolas, indígenas, assentamentos, comunidades rurais e ribeirinhas”.
As alterações, como foi informado pelo vereador Rocha, foi apresentado para corrigir falhas na Lei de Uso, Ocupação e Parcelamento do Solo das Zonas Urbana e Rural, regulamentada pela Lei Complementar 007/2012, previsto no planejamento do Plano Diretor. Ocorre que o plano está sendo revisado. Rui Corrêa, secretário de Planejamento e Desenvolvimento Municipal, afirmou que foi solicitado aos legisladores que aguardassem a conclusão da revisão para depois se discutir o projeto 1621, mas a sugestão não foi aceita e foi proposta a criação de grupos de trabalho formados pela sociedade civil para se discutir o PL nas comissões da Câmara.
As mudanças do projeto ainda atingem comunidades tradicionais e indígenas, como os Borari, que ainda lutam pela titulação do seu território e estão localizados em Alter do Chão. Leila Borari, liderança indígena, afirmou que a Lei Complementar está impedindo a construção de obras de grandes empreendimentos e, segundo ela, “não é muro ou a casa de um ribeirinho”. As comissões, que estão participando das discussões na Câmara, apresentam outras propostas para o distrito.
“A gente quer que sejam preservadas as savanas, as margens de igarapés, onde é mais delicado. Queremos que seja respeitada toda a questão da mata ciliar, só que quando a gente vai discutir, a Prefeitura, por exemplo, através dos vereadores, que é o legislativo, quer discutir a ampliação da área urbana para dentro da terra indígena”, diz Leila.
Ela participou, nesta segunda-feira (6), de mais uma reunião na Câmara e, pela rapidez como o projeto está sendo tratado, os legisladores pretendem aprovar o PL até o final do ano.
Edição: Vanessa Martina Silva