O dia 19 de setembro não foi dia de festa para empresa suiça Syngenta. A Agência Brasileira de Vigilância Sanitária (ANVISA), na sequência de uma avaliação completa, decidiu proibir a produção, importação, comercialização e utilização de paraquat.
Golpe duro para Syngenta, o Brasil decidiu proibir o paraquat devido a sua elevada toxicidade. A proibição entrará em vigor em 2020, depois de um período transitório de três anos. Mas essa decisão pode ser questionada se novos estudos conseguirem, entretanto, convencer as autoridades da inocuidade do produto.
O paraquat já foi proibido em mais de 50 países (entre eles a Suíça e a União Europeia) devido à sua extrema toxicidade. Entretanto, o Brasil é atualmente o primeiro consumidor mundial desse herbicida poderoso. As vendas aumentaram estes últimos anos devido ao aparecimento de ervas daninhas resistentes ao glifosato, nomeadamente em culturas de soja.
A Syngenta realiza mais de metade das suas vendas de paraquat no Brasil e gera todos os anos 2 bilhões de vendas de pesticidas – 20% do seu faturamento.
Quatro razões para a proibição
A agência brasileira ANVISA, que depende do ministério da saúde, tinha iniciado uma reavaliação do paraquat em 2008 em razão de vários estudos demonstrando a “toxicidade aguda e crónica” do herbicida.
As suas conclusões são inapeláveis: o paraquat provoca todos os anos vários casos graves de intoxicações no Brasil; pode causar a doença de Parkinson e danos irreversíveis no genoma; e a utilização de equipamentos de proteção individual não garante uma proteção suficiente dos trabalhadores.
Um lobby omnipresente
Sob pressão do poderoso lobby industrial, a ANVISA adiou a entrada em vigor da proibição do paraquat para 2020. E a agência brasileira poderia reconsiderar a sua decisão se até lá novos estudos provando a inocuidade do paraquat, nomeadamente no tocante ao seu carácter mutagénico, forem apresentados.
De acordo com um relatório da ANVISA o ministério de agricultura e a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) se encontraram na linha da frente da luta contra a proibição do paraquat. E as empresas do setor agrícola formaram uma “força tarefa” que “participou ativamente em todas as etapas do processo de regulamentação referente à reavaliação toxicológica do Paraquat, por meio de reuniões (...)” com a Anvisa.
A FPA defende os interesses da agroindústria no parlamento. Esse grupo forneceu mais de metade dos votos necessários à destituição de Dilma Roussef e à tomada de poder de Temer em agosto de 2016. Está igualmente na origem de um projeto de lei destinado a suprimir da regulamentação uma disposição que impede atualmente autorizar pesticidas claramente cancerígenos e mutagénicos, e retirar à agência de vigilância sanitária as suas competências em termos de autorização de colocação no mercado dos pesticidas, atribuindo-as ao Ministério da Agricultura, dirigido pelo muito controverso “rei da soja”, Blairo Maggi.
Syngenta otimista
Na sua reação à decisão da ANVISA, Syngenta mostra-se muito (demasiado?) otimista, afirmando que a ANVISA “decidiu manter o registro de defensivos agrícolas contendo o ingrediente ativo Paraquat por três anos, desde que sejam implementadas medidas adicionais de mitigação de manejo e novos estudos científicos sejam realizados para confirmar a segurança do produto para trabalhadores agrícolas ”.
Podemos apostar que o lobby agroalimentar vai fazer todo o possível durante estes três anos para que as autoridades brasileiras reconsiderem a sua decisão.
Um ano difícil para o paraquat
A luta apenas começou. Mas a decisão das autoridades brasileiras é um golpe duro para Syngenta. Até porque ela vem coroar um ano já bastante difícil para o paraquat visto que a China, o Vietnã e a Tailândia anunciaram também uma proibição do pesticida.
O mercado mundial do paraquat está estimado em 900 milhões em 2016. Syngenta não publica dados sobre as suas vendas por produto. Mas diversas fontes avaliam a sua parte a 35% - ou seja cerca de 300 milhões de vendas. O gigante de Basileia é o líder incontestável nesse mercado.
Mas as suas vendas têm vindo a decair nos últimos anos. Em 2014, as vendas de herbicidas não seletivos do gigante de Basileia – principalmente o paraquat e o glifosato – representavam ainda cerca de 1,5 bilhões. Mas em 2015, colapsaram a 900 milhões. E no ano passado atingiam com dificuldade 770 milhões. Ou seja uma queda de 50% em apenas três anos!
*Public Eye é uma Organização Não Governamental (ONG), com sede na Suíça.
Edição: Simone Freire