A cultura de Belo Horizonte promete adotar nova política de incentivo, diálogo e gestão. Para o cargo de presidente da Fundação Municipal de Cultura acaba de ser nomeado o ex-ministro Juca Ferreira, que também deve chefiar a Secretaria Municipal de Cultura, em processo de aprovação na Câmara dos Vereadores. A classe artística de BH recebeu Juca com elogios. “É uma excelente escolha, pela trajetória, pelo pensamento”, publicou a vereadora e atriz Cida Falabella (PSOL) em sua página no Facebook. Na entrevista, ele explica porque aceitou o convite do prefeito Alexandre Kalil e dá pistas sobre a linha cultural que pretende seguir em sua gestão.
Quais foram as suas experiências mais importantes na área de gestão pública de cultura?
Juca Ferreira - Desde que voltei ao Brasil em 1980 tenho trabalhado com gestão cultural, projetos ambientais e sociais. Às vezes combinando essas dimensões em um mesmo projeto. Durante muito tempo atuei no terceiro setor junto a grupos culturais. Fui assessor da Fundação Cultural do Estado da Bahia, trabalhei no Projeto Axé voltado para crianças e adolescentes que viviam na rua, trabalhei com Gilberto Gil na Fundação OndAzul, uma ONG voltada para o meio ambiente e que tinha a cultura como instrumento para mudança. Fui Ministro da Cultura do Brasil duas vezes e secretário de Cultura da cidade de São Paulo. Entre 2010 e 2012 fui embaixador especial da Secretaria Geral Ibero Americana.
Como Kalil chegou até você? E por que aceitou o seu convite?
Quem melhor pode responder como o prefeito chegou até mim é o próprio prefeito. Soube de várias movimentações na área cultural e artística da cidade sugerindo meu nome. Aceitei porque acho que posso fazer um bom trabalho e que posso contribuir para o desenvolvimento cultural de BH. Como aceitei ser secretário de SP. Chego com a mesma humildade que tive para fazer meus trabalhos anteriores.
O fato de não ser morador de BH pode tornar mais difícil a gestão à frente da Secretaria Municipal de Cultura?
Nem um pouco. Conheço a vida e a cena cultural de BH. Como ministro estabeleci uma boa relação com artistas, gestores e ativistas culturais e vim muitas vezes debater, conhecer as demandas e necessidades culturais de Minas e de BH.
Hoje, a cultura de BH tem apenas 1% do orçamento municipal. Uma reclamação constante dos artistas e produtores belo horizontinos. É possível fazer uma boa gestão com esta verba?
Já me manifestei sobre essa questão nas conversas que tive com o prefeito e seus assessores. É preciso ter um cuidado e uma atenção especial nesta questão dos recursos. Um mínimo de recursos é necessário para trabalhar. Sem os meios e os recursos fica muito difícil fazer.
Além da quantidade de investimento, há muitos questionamentos sobre a forma de distribuição dos recursos. A classe artística critica uma maior valorização de 'grandes shows´ em detrimento do apoio aos muitos grupos e produções locais. Qual política cultural podemos esperar de Juca?
Sempre que não se tem uma política cultural desenvolvida os "eventos" tomam conta do orçamento.
O que seria “cultura social”, a que o prefeito Kalil se referiu ao anunciar sua nomeação? (“Ele, praticamente, é o inventor da cultura social no Brasil”, Kalil.)
Na conversa que tivemos ele insistiu que a secretaria deve democratizar de fato a relação com a cidade e com as muitas culturas e manifestações de BH e que temos obrigação de dar uma atenção a todos os setores sociais e compreender que cultura é um direito de todos.
Conversamos também do importante papel que a cultura pode ter em uma sociedade desigual como a nossa para incluir a todos. Ele me passou a impressão que é muito comprometido com a população excluída que vive nas favelas, periferias e bairros pobres da cidade. É preciso ressaltar o esforço do prefeito em valorizar a cultura ao recriar a Secretaria Municipal e ele tem dado mostras que está buscando acertar.
Vivemos um período de retrocessos em termos de direitos, como a cultura é impactada nesse cenário?
A primeira medida dos que se instalaram no governo em Brasília depois de afastarem a presidenta democraticamente eleita foi tentar extinguir o Ministério da Cultura. Houve uma reação muito grande dos artistas e dos que fazem cultura em todo o Brasil e essa reação garantiu a continuidade do MinC. Agora estão desmontando por dentro as políticas e as estruturas da instituição. Em vários estados e municípios vemos o mesmo movimento de demolição.
Como você vê a participação de artistas no movimento pelas Diretas Já?
Saudável. Necessário é incontornável. Cultura e arte não combinam com golpe, tirania e autoritarismo.
Edição: Frederico Santana