GOLPISMO

Citados em delação, prefeito do Recife e governador de PE querem eleições sem povo

Cúpula do PSB em Pernambuco teria recebido propina da JBS nas eleições de 2014

Brasil de Fato | Recife (PE) |
Michel Temer conversa com Paulo Câmara em almoço com governadores na residência do presidente da Câmara
Michel Temer conversa com Paulo Câmara em almoço com governadores na residência do presidente da Câmara - Beto Barata/PR / Fotos Públicas

Nessa quinta-feira (18), na mesma noite em que 10 mil pessoas tomaram as ruas do Recife pedindo a saída de Temer e a convocação de eleições diretas para presidente, o prefeito do Recife e o governador de Pernambuco se colocaram contrários ao voto popular. Ambos integram a cúpula nacional do Partido Socialista Brasileiro (PSB) e podem influenciar sigla a seguir o caminho iniciado em 2014, com aliança com o PSDB e a direita, apoio ao golpe de 2016 e distanciamento da participação popular e democrática.
Em entrevista à Rádio Jornal, o prefeito do Recife, Geraldo Julio (PSB), opinou que o presidente não eleito Michel Temer deveria ter renunciado ao cargo após a divulgação da comprometedora delação dos irmãos Joesley e Wesley Batista, proprietários da JBS, no âmbito da Operação Greenfield, da Polícia Federal. Os empresários afirmaram ter gravado – e os áudios foram divulgados na internet ainda nesta quinta-feira – Michel Temer (PMDB), em abril deste ano, apoiando e estimulando o pagamento de uma “mesada” de R$ 2 milhões ao ex-presidente da Câmara Federal Eduardo Cunha (PMDB), hoje preso, para que este não faça acordo de delação com a Justiça.
Sobre o caso o prefeito do Recife disse que “Temer deveria optar pela renúncia para o Brasil reencontrar seu caminho”. No entanto, Geraldo Julio não acha que esse caminho passe pelo voto do povo. Para ele, o novo mandatário deve ser eleito exclusivamente com votos dos 81 senadores e 513 deputados federais, numa eleição com menos de 600 eleitores e dentro do Congresso Nacional. “Temos que seguir a Constituição, que fala em eleições indiretas. O caminho para a população é o que estabelece a Constituição”, opina o prefeito.
O apoio à eleição sem voto popular é compartilhada pelo governador Paulo Camara, também do PSB, que informou sua posição através de vídeo divulgado nas redes sociais. Na peça, de apenas um minuto, Camara lamenta a crise, afirmando que “vivemos um desajusta severo que insiste em se prolongar” e cobra explicações do presidente ilegítimo. “As denúncias contra o presidente Michel Temer são graves e precisam ser investigadas a fundo e com responsabilidade. O presidente precisa dar explicações à Nação”.
De maneira menos objetiva que Geraldo Julio, Camara também aponta o caminho da eleição indireta. “Qualquer solução para esse novo impasse político deve passar por necessário e absoluto respeito à Constituição”. O governador pernambucano encerra sua fala defendendo a preservação da democracia. Tanto ele como o prefeito do Recife apoiaram o golpe de 2016 que retirou o mandato da presidenta Dilma Rousseff (PT), eleita pela população em 2014.
Governador e prefeito têm relevante posição dentro da sigla, nacionalmente. Paulo Camara é o primeiro vice-presidente nacional do PSB, enquanto Geraldo Julio ocupa o cargo de primeiro-secretário nacional do partido. A posição de ambos é próxima à do PSDB, que ameaçou desembarcar dos quatro ministérios que ocupa no governo golpista, mas acabou optando por permanecer. Os tucanos também falam em apoiar um processo de eleição indireta para a Presidência.
Ainda sob o comando do ex-governador Eduardo Campos, falecido em acidente aéreo em 2014, o PSB iniciou uma aproximação com PSDB. Ainda como pré-candidatos à Presidência, Eduardo Campos e o já senador Aécio Neves (PSDB) tiveram muitos encontros para alinhar questões nacionais. O PSB acabou ganhando espaço dentro do principal governo tucano, o de Geraldo Alckmin, em São Paulo, que tem como vice-governador Márcio França (PSB). Com a morte de Campos e a derrota de Marina Silva (então no PSB, hoje na Rede) ainda no primeiro turno, o partido historicamente de esquerda decidiu por apoiar a candidatura de Aécio Neves, que na última quinta teve seu mandato cassado pela Justiça como consequência das revelações da mesma delação da JBS. Em 2016 o PSB tomou posição favorável ao golpe que derrubou a presidenta Rousseff.
Delação
O diretor da JBS Ricardo Saud citou Paulo Camara, Geraldo Júlio, o senador Fernando Bezerra Coelho e o ex-governador Eduardo Campos, todos do PSB, em delação no âmbito da operação Lava Jato. O conteúdo foi divulgado na tarde desta sexta-feira (19). Saud diz ter negociado, em 2014, com o prefeito do Recife e com o atual governador do estado o pagamento de propina de R$15 milhões para as eleições de 2014. O dinheiro seria usado em benefício das campanhas de Eduardo Campos à Presidência e de Paulo Câmara ao Governo do Estado. Bezerra Coelho também teria recebido R$ 1 milhão de reais no mesmo período.
Ministério
Ainda nessa quinta (18), o presidente nacional do PSB, Carlos Siqueira, emitiu nota cobrando que o deputado federal pernambucano Fernando Bezerra Coelho Filho (PSB) deixasse o cargo de ministro das Minas e Energia do governo Temer. Fernando Filho é o único ministro de Temer filiado ao PSB, sigla que publicamente se colocou contra a decisão de Fernando Filho. O partido defendia uma posição de “independência” em relação ao governo Temer. Fernando Filho, no entanto, não se pronunciou sobre a nota de Carlos Siqueira, se restringindo a dizer que não ocupa o cargo de ministro por indicação do partido.
Dentro do próprio PSB fala-se que o ministério foi uma conquista do senador pernambucano Fernando Bezerra Coelho (PSB), pai do ministro, por sua articulação em favor da derrubada do governo Dilma no processo de impeachment. A nomeação de Fernando Filho, há um ano, teria irritado Paulo Camara e Geraldo Julio. Desde a morte de Eduardo Campos as lideranças do PSB disputam espaço e buscam se construir como principal "cara" do partido no estado.​

Edição: Monyse Ravena