“Conclamamos os povos a se juntarem à bandeira da agroecologia e, por meio dela, construir alternativas locais à monocultura que o capital nos impõe”. “Não haverá democracia real no Brasil sem a justiça na distribuição de terras e na demarcação dos territórios, sem o respeito à autonomia das comunidades e sem a construção de uma nova matriz econômica, alicerçada na soberania alimentar e na agroecologia.”
Os trechos são da carta final da V Jornada de Agroecologia da Bahia, encontro que terminou este domingo (23) em Porto Seguro e reuniu mais de duas mil pessoas, entre representantes de comunidades de agricultores assentados e acampados, além de indígenas, quilombolas, pescadores e outros integrantes de comunidades tradicionais, como os moradores de fundo de pasto ou de terreiro. Além de movimentos como o MST, a Teia.
A V Jornada aconteceu no mesmo ambiente onde foram disputados os Jogos Pataxó. A olimpíada indígena local reuniu centenas de representantes das mais de 30 aldeias da região.
Os grupos presentes estão congregados numa iniciativa inovadora que, desde 2012, busca articular diferentes movimentos sociais do Sul da Bahia em torno da difusão de técnicas da agroecologia, dos intercâmbios de sementes, mutirões de trabalho, feiras agroecológicas e encontros políticos. A Teia dos Povos também agrega estudantes e professores de universidades da região, além de trabalhadores da cidade e do campo.
O encontro encerrado neste domingo discutiu temas tão diversos como o bem viver – conceito indígena andino que vem servindo de contraponto à noção de desenvolvimento em debates públicos por toda a América Latina atualmente –, a criação de uma “produção não capitalista” que apoie a autonomia das comunidades, ou a relação dos saberes tradicionais com a escola. Entre as metas da Teia dos Povos está a criação de novos projetos pedagógicos nas escolas das comunidades que participam da iniciativa na região, descolonizando o ensino e preparando os jovens para enfrentar o desafio da autonomia dos territórios.
Foi a primeira Jornada realizada pela Teia fora do Assentamento Terravista, em Arataca (BA), comunidade de referência na região em função de sua experiência com a lavoura agroecológica do cacau. Além disso, o evento recebeu uma comitiva da Teia dos Povos do Maranhão e foi a primeira vez que integrantes das duas Teias puderam trocar ideias sobre como estão operando. Ambas as redes trabalham com perspectiva semelhante. “A Teia representa a esperança de unidade dos povos, em sua diversidade e pluralidade”, diz ainda o documento final da Jornada.
“O momento é muito propício para esse intercâmbio”, avalia Solange Brito, ativista da Teia da Bahia. “Com essa fragmentação das forças de esquerda no país, a situação é muito ruim. O ataque é forte, há lideranças sendo perseguidas, outras são compradas. E o povo vai perdendo o sonho, e nisso o capital vai entrando nas comunidades, as pessoas vão abandonando o sonho. Se não nos juntarmos mais, vários movimentos correm até o risco de acabar.”
A comitiva maranhense realizou diversas visitas de intercâmbio e solidariedade em comunidades da região. No sábado (22), estiveram com os Pataxó que ocupam atualmente a sede do Parque Nacional do Descobrimento, que incide sobre território identificado como terra de ocupação tradicional desse povo.
Entre as metas da Teia dos Povos está a de “recuperar os biomas devastados pelo latifúndio agroexportador”, como aponta a carta. Em fevereiro, junto com o Consórcio Intermunicipal da Mata Atlântica, a coalizão apresentou seu Projeto de Desenvolvimento Econômico e Social da Mata Atlântica, plano que prevê a recuperação ou implantação de 400 mil hectares de cacau no sistema cabruca, típico da região, e de sistemas agroflorestais na região sul da Bahia.
A íntegra da carta final da V Jornada de Agroecologia da Bahia e outros documentos sobre o encontro e a Teia dos Povos podem ser encontrados aqui. A Teia dos Povos também tem de um canal no facebook.
Edição: Vanessa Martina Silva