Se na Grécia Antiga as Olimpíadas eram uma ocasião em que todas as guerras eram suspensas e os inimigos toleravam uns aos outros em nome de uma chamada “trégua olímpica”, no Brasil a desejada paz e tranquilidade do Rio de Janeiro, cidade escolhida para ser o palco das competições, foi feita com assassinatos em massa e violações de direitos contra a população pobre da periferia.
Desde 2009, ano em que a cidade do Rio de Janeiro foi escolhida como sede dos Jogos Olímpicos, aproximadamente 2.600 pessoas foram assassinadas por agentes do estado. A estimativa foi feita pela Anistia Internacional com base em números do Instituto de Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro (ISP).
“Apesar da promessa de legado de uma cidade segura para sediar os Jogos Olímpicos, as mortes decorrentes de operações policiais tem crescido progressivamente nos últimos anos no Rio. E também assistimos, durante a repressão aos protestos, pessoas gravemente feridas por balas de borracha, bombas de efeito moral e até mesmo armas de fogo usadas pelas forças policiais”, afirmou Atila Roque, Diretor Executivo da Anistia Internacional Brasil, em abril deste ano.
Um desses casos é o jovem Johnatha de Oliveira Lima, de 19 anos, que foi assassinado por PMs da UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) com um tiro nas costas em maio de 2014. Sua mãe, a pedagoga Ana Paula Oliveira, alerta para a ocupação da UPP na favela de Manguinhos, na zona oeste da cidade, onde seu filho foi assassinado.
“A UPP chegou aqui em outubro de 2012 e logo em março de 2013 fez a primeira vitima, um menino de 16 anos. Em outubro do mesmo ano ela fez sua segunda vítima, um jovem de 18 anos que foi espancado até a morte por policiais. O Johnatha foi a terceira vítima da UPP”, conta Ana Paula.
O filho dela estava indo levar um pavê na casa de sua avó quando no caminho de volta passou por uma rua onde ocorria um protesto de moradores contra a truculência dos policiais militares da UPP local. Os PMs reagiram a pedras jogadas pelos manifestantes com disparos de armas de fogo e um deles acabou atingindo o jovem que não estava envolvido na manifestação, de acordo com testemunhas que presenciaram o momento.
“Os policiais começaram a fazer disparos para o alto para dispersar a confusão, só que um policial disparou em direção as pessoas que estavam correndo para se proteger e acabou atingindo o Jhonatha. Depois eu vim a saber que esse policial já respondia por triplo homicídio e por duas tentativas de homicídio na baixada fluminense”, conta Ana Paula.
Sobre o fato de Jhonatha ser apenas um em 2.600 pessoas que foram mortas por policiais, Ana Paula lamenta a falta de comoção da sociedade para assassinato de jovens da periferia. “Quando morre esse número alarmante de jovens, de pessoas sendo assassinadas pelo estado, não só nas favelas, mas nas periferias, a gente não vê comoção, a gente não vê as autoridades utilizando os meios de comunicação para mostrar sua indignação. Pelo contrário, a gente só vê dizer que vai ter mais policiamento e que eles vão colocar mais carros blindados dentro das favelas”, lamenta.
Sobre o legado que os Jogos vão trazer para a cidade, Ana Paula disse que o governo tenta vender o Rio de Janeiro como uma cidade linda, mas para que isso aconteça, segundo ela, é preciso que o Estado “extermine e encarcere” os pobres.
“O legado que vai ficar para nós que somos pobres é um legado de dor, de lágrimas e de sangue. Infelizmente porque o aumento de efetivo policial dentro das favelas para mim significa mais encarceramento, mais violação de direitos e mais mortes”, disse.
Ana Paula se juntou a mais duas outras mães da favela de Manguinhos e fundou o movimento “Mães de Manguinhos”, que luta contra a violência policial não só na comunidade, mas em toda baixada fluminense. O grupo organiza protestos e dá apoio a mães que tiveram seus filhos assassinados pela polícia. Ana Paula conta que semana passada estava com uma mãe cujo filho morreu com um tiro na testa disparado por um policial no Morro do Borel, no Rio de Janeiro.
Foto de Capa: Reprodução/Facebook
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