Deputados do PSOL (Partido Socialismo e Liberdade) e alguns parlamentares do PT (Partido dos Trabalhadores) e do PCdoB (Partido Comunista do Brasil) não participaram do segundo turno da eleição para a presidência da Câmara dos Deputados, entre Rogério Rosso (PSD) e Rodrigo Maia (DEM-RJ), que elegeu o democrata como novo presidente da Casa, para um mandato-tampão, que se encerra em fevereiro de 2017. Eles se retiraram do plenário na madrugada desta quinta-feira (14), em forma de protesto, por considerarem que as duas candidaturas representam a continuidade da hegemonia de forças conservadoras na Casa.
Rodrigo Maia foi eleito com 285 votos contra 170 de Rogério Rosso. Marcelo Castro (PMDB-PI), que havia angariado votos de parte do PT, terminou a disputa em terceiro lugar, com 70 votos.
“Não me sinto confortável de dar meu voto nem para Rosso nem para Rodrigo Maia, que são duas faces do mesmo projeto, apesar de terem diferenças na relação com Cunha e o Planalto”, disse a atual líder da minoria, Jandira Feghali (PCdoB-RJ). Ela e a deputada Alice Portugal (PCdoB-BA) pediram liberação à bancada do partido, que havia lançado Orlando Silva (PcdoB-SP) no primeiro turno, mas apoiou o democrata na corrida final.
“Maia é um dos cérebros do impeachment, então estamos tratando de aliados diretos de Cunha e do golpe, por isso também não me senti à vontade pra aderir a essa escolha amarga do partido, até porque quem ama a Bahia não vota no DEM”, afirmou Alice Portugal. Pré-candidata à prefeitura de Salvador, a deputada faz oposição ao chamado “carlismo” na Bahia, tendência que aglutina herdeiros políticos do ex-governador Antônio Carlos Magalhães, que morreu em 2007.
Além do PCdoB, o PDT e o PR haviam declarado apoio a Maia, depois que Castro saiu da disputa. Tendo a segunda maior bancada da Casa, com 58 componentes, o PT liberou os parlamentares para votarem como quisessem.
“Pra nós, não existe opção. Se um é Cunha e o outro é Temer, estamos falando de conservadorismo, golpe e antidemocracia. Ambos representam as perdas que os trabalhadores e a sociedade vêm sofrendo”, disse Luiza Erundina (PSOL-SP).
Lançada como candidata da sigla, ela conquistou 22 votos no primeiro turno, contando com apoio de parlamentares de outras legendas mais alinhados à esquerda. Foi o caso do deputado Valmir Assunção (PT-BA), um dos que se retiraram do plenário no intervalo.
“O MST, os movimentos sociais, o PT, o movimento LGBT, os movimentos negro, de mulheres, da juventude, do campo, os indígenas e tantos outros, quando me deram a procuração para representá-los na Câmara, não o fizeram para que eu participasse de um processo triste como este”, disse o parlamentar em nota divulgada minutos antes da segunda votação.
Perfil
A eleição de Rodrigo Maia resulta de uma coalizão formada inicialmente por DEM, PSDB, PPS e PSB, após alguns dias de costuras políticas e muita incerteza no cenário. Os últimos arranjos atraíram também votos de setores do PT interessados em superar a força de Cunha, representada na candidatura de Rosso (PSD-DF).
“Tenho consciência de que sem a esquerda não venceria estas eleições”, disse o democrata, segundo o qual a nova gestão deverá valorizar o diálogo com a minoria. “Temos uma maioria do governo que é importante para o Brasil, mas temos uma pauta da sociedade que vem através de cada um de nós que precisa ser debatida, discutida e votada”, completou.
Atualmente exercendo o quinto mandato como deputado federal, Rodrigo Maia é filho do ex-prefeito do Rio de Janeiro César Maia. Líder da bancada do DEM na Câmara por duas vezes, Maia aparece na Lista de Furnas, ao lado dos tucanos Geraldo Alckmim e Aécio Neves. O deputado teria recebido R$ 100 mil para sua campanha à Camara, em 2002.
O democrata também foi citado pelo delator do “Mensalão do DEM”, Durval Barbosa, como um dos beneficiários do esquema de propinas montado pelo governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda.
Relação com Cunha
A candidatura de Rogério Rosso (PSD-DF) foi escolhida pelo chamado “centrão”, bloco que reúne deputados de centro-direita e que hoje tem maioria na Casa. Ao discursar no plenário pouco antes da votação final, o parlamentar tentou suavizar as fissuras surgidas na base de Temer na Câmara e se disse interessado em costurar arranjos com Maia independentemente do resultado. “Esta é uma disputa difícil, mas o parlamento já venceu. Venceu a democracia, venceu a renovação”, exclamou.
Logo após a divulgação do resultado da votação, alguns apoiadores de Maia entoaram gritos de “Fora, Cunha” no plenário. Questionado sobre o significado da manifestação, o novo presidente evitou fazer críticas contundentes e até elogiou o peemedebista, apesar de o placar final sinalizar que a Câmara tenta se descolar da figura de Cunha.
“Eduardo Cunha, no plenário, foi talvez o melhor presidente que nós tivemos, mas acho que talvez tenha sido poder demais. Não sou daqueles que só pisam. Acho que ele teve méritos na presidência. (...) Agora ele responde a um processo disciplinar na Casa e vai fazer a sua defesa em plenário”, declarou.
Sobre a cassação do peemedebista, Maia não sinalizou possíveis datas e disse se preocupar com o quórum em plenário. “Se nós fizermos uma votação dessa com 300 parlamentares, por exemplo, a imprensa vai dizer que o presidente ajudou ou prejudicou o deputado, então, essa votação ocorrerá no momento certo e com o quórum adequado, porque não estou aqui pra prejudicar nem pra beneficiar o Eduardo. (...) O processo vai caminhar dentro do regimento da Casa, sem nenhum tipo de manobra”, afirmou.
Pautas prioritárias
Pouco depois de assumir o cargo, Rodrigo Maia (DEM-RJ) chegou a mencionar a necessidade de a Câmara rediscutir a reforma política no país. “O sistema eleitoral brasileiro ruiu. É fundamental que tenhamos a coragem de discutir esse tema”, afirmou o deputado.
Ele declarou que irá tentar “unir a Câmara em torno de projetos considerados prioritários e urgentes”. Entre outras propostas que vêm sendo debatidas na Casa, o deputado enumerou o teto de gastos do governo federal; a renegociação da dívida dos estados; a reforma da previdência; e o projeto de lei que retira a exclusividade da Petrobras sobre a exploração do pré-sal, abrindo espaço para as multinacionais.
Esta última tem sido alvo de fortes críticas do movimento dos petroleiros e dos parlamentares de oposição, para os quais a medida consiste numa política entreguista que visa à privatização da estatal e compromete a soberania nacional.
Edição: José Eduardo Bernardes
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